Título: Equilíbrio do balanço ambiental
Autor: Sergio de Albuquerque e Mello
Fonte: Gazeta Mercantil, 27/08/2004, Opinião, p. A-3

A diminuição da degradação do meio ambiente é tarefa viável. Em nossa sociedade, particularmente no meio empresarial, a expressão "passivo ambiental" é usada de forma indiscriminada, sem que seu significado seja claramente explicitado. Há que se fazer uma distinção entre dois tipos de "passivo". Existe um passivo de ordem legal, que não é propriamente ambiental, pois se trata de uma obrigação de remediar ou compensar um prejuízo causado ao meio ambiente. Portanto, esse é um passivo econômico, uma dívida que se materializa em forma de dispêndio financeiro, oriunda da infração de uma lei ou disposição regulatória competente. O outro passivo ambiental, usado como expressão equivalente à própria degradação do ambiente, nada tem de passivo. Para seguir no mundo da contabilidade, podemos postular a seguinte expressão para o que poderia ser chamado de "balanço ambiental": bem ambiental (ativo) com valor diminuído pela degradação ambiental (passivo) é igual ao ambiente em que vivemos, que, por analogia, podemos chamar de "patrimônio líquido ambiental" (sabemos o que significa patrimônio líquido negativo: falência). Pelo forte componente religioso, a reação a evento indesejado é encadeada em três fases: definição do pecado, procura do culpado e expiação da culpa. Todos se sentem aliviados e o ciclo recomeça. O pecado é inerente à vida e ao ser humano, o perdão divino foi criado para dar conta desse atavismo. A mesma atitude foi tomada com relação ao meio ambiente. A diferença é que não haverá perdão divino para a degradação ambiental. A contrapartida positiva é que tampouco o "pecado" é inevitável. A mudança no padrão de ocupação do planeta não é impossível e a diminuição da degradação do meio ambiente é tarefa viável, embora não se possa afirmar que as escalas de tempo do que resta de utilizável e do que se precisa para reverter a situação sejam as mesmas. Como evitar um nível falimentar de degradação ambiental? Jamais haverá resposta adequada a esta pergunta enquanto a visão do passivo ambiental não evoluir para o conceito de balanço ambiental. Toda ênfase tem de se voltar para a mudança do padrão de ocupação e uso dos recursos naturais e para a reversão dos impactos já causados ao meio ambiente. A atuação firme da sociedade sobre as causas de degradação contínua e a recuperação do que já está comprometido, além da promoção de mudança de hábitos das populações e da evolução das tecnologias, têm de se transformar em prioridades máximas. Há necessidade, para isso, de um grande esforço de articulação social em que governos, legisladores, empresas, comunidade científica e organismos representativos de diversos interesses se coordenem para produzir políticas públicas e posturas sociais adequadas aos parâmetros do desenvolvimento sustentável. A sociedade tem de aprender a reconhecer as variáveis do balanço ambiental e a tomar decisões sobre que ativos deseja preservar e a que custo. O fracasso retumbante da cúpula de Johannesburgo e as dificuldades para a entrada em eficácia do Protocolo de Kyoto refletem bem as dificuldades desse enorme desafio. O esforço talvez só venha a ser recompensado daqui a muitos anos, mas teremos deixado como legado a mudança do rumo da degradação e a preservação do "patrimônio ambiental", capital fundamental necessário às gerações futuras para viver e progredir. Toda ênfasetem de ser dada à mudançado padrãode uso dos recursos naturais