Título: Intervenção nos combustíveis
Autor: Freitas, Jorge
Fonte: Correio Braziliense, 09/04/2011, Economia, p. 24

Uma nova intervenção do governo federal sobre a atividade econômica está sendo preparada para tentar pôr fim à crise de abastecimento e à consequente disparada dos preços dos combustíveis. Além do aumento do etanol e da falta de gasolina em postos de São Paulo, o cenário é agravado pelo prejuízo de R$ 1 bilhão nas contas da Petrobras ¿ que não reajusta o preço da gasolina há 23 meses, apesar de o barril de petróleo tipo Brent negociado em Londres ter atingido os US$ 124 ontem. A intenção do governo é evitar que haja reajustes da gasolina neste momento.

¿Está havendo certo abuso da cadeia de distribuição de combustíveis. Já pedi à Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Combustível (ANP) que faça a fiscalização mais rigorosa. O problema deve estar acontecendo nas bombas de abastecimento¿, disse, ontem, o titular do Ministério de Minas e Energia, Edison Lobão. No programa de rádio Bom Dia Ministro, ele afirmou que a presidente Dilma Rousseff não quer aumento dos preços da gasolina e, por isso, a Petrobras precisa produzir mais etanol, aumentando a oferta do produto e aliviando a pressão inflacionária.

¿Eu pedi à Petrobras que entre mais agressivamente na produção de etanol¿, disse Lobão. Para o ministro, a estatal tem interesse em fazer um reajuste da gasolina, que não sobe há nove anos. ¿Mas tanto o ministro Mantega (da Fazenda) quanto eu temos dito à Petrobras que não concordamos com esse aumento,¿ declarou o ministro. Mas Lobão admitiu que, se o preço internacional do petróleo ficar acima do patamar atual, o aumento da gasolina será inevitável.

Restrições Em nota à imprensa, a Petrobras informou que não tem qualquer influência em relação à volatilidade do preço do etanol. Já a última alteração no valor da gasolina nas refinarias da Petrobras ocorreu em junho de 2009, quando houve uma redução de 4,5%. Desde então, a empresa não aplicou qualquer reajuste no preço da gasolina ¿A¿ que vende para as distribuidoras sem adição de etanol. ¿Se fosse pela Petrobras, já teria havido aumento. Mas a presidente Dilma e eu também não autorizamos, apesar de os preços do petróleo terem subido¿, disse o ministro.

Uma medida provisória articulada pelos Ministérios de Minas e Energia e da Agricultura deverá criar restrições ao financiamento das usinas de cana-de-açúcar que não produzam etanol, bem como incentivos via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para as destilarias que privilegiarem a produção destinada a abastecer a frota de carros flex. As usinas de cana estão preferindo produzir açúcar em lugar de etanol, para aproveitar os preços mais favoráveis da commodity no mercado internacional.

Lobão determinou também ao presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, que a empresa aumente a produção de etanol em sua controlada de biocombustíveis, para tornar-se reguladora da oferta do combustível no país, num prazo de dois anos. Outra medida que deverá ser adotada será a transferência compulsória do álcool para a regulação da ANP, que hoje cuida apenas da fiscalização do produto. Assim, o etanol passará a ser tratado definitivamente como combustível.

Bode expiatório Para o diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (Cbie), Adriano Pires, o governo procura um bode expiatório para justificar a falta de uma política de combustíveis no país que contemple o etanol, a gasolina e o gás natural veicular. ¿Mandar a Petrobras produzir mais álcool não procede, porque ela é do ramo do petróleo. Não é uma empresa do governo e tem acionistas que talvez não concordem que ela tenha que resolver todo o tipo de problema¿, disse.

Pires estima que a defasagem dos preços do etanol para os preços da gasolina são artificiais, porque a Petrobras pratica valores 23% a menor do que o mercado internacional. ¿Por isso, o aumento nos preços do etanol se justifica¿, ponderou. Luiz Guilherme de Oliveira, professor da Gestão do Agronegócio da Universidade de Brasília (UnB), concorda que a falta de planejamento do governo provoca desequilíbrio no abastecimento de combustíveis. ¿O governo não deu a atenção necessária à cadeia produtiva e não considerou o consumidor do carro flex¿, afirmou economista.

Por causa do impacto ambiental positivo do etanol, um combustível limpo e renovável, Oliveira disse que o governo deve continuar estimulando investimentos no setor sucroalcooleiro. ¿Como efeito da crise do subprime em 2008, plantas de usinas brasileiras no Centro-Oeste e no Sudeste foram vendidas a fundos de investimentos e a empresas internacionais, que não realizaram investimentos em tecnologia e aumento da capacidade instalada. Isso precisa ser feito agora, para que não se repita o problema¿, observou.