Título: Dólar mais fraco preocupa o agronegócio
Autor: Neila Baldi, Alexandre Inacio e Lucia Kassai
Fonte: Gazeta Mercantil, 01/12/2004, Agribusiness, p. B-12

Exportações e renda do agricultor devem cair. A previsão é de que em 2005 o superávit da balança cresça apenas 1%. O produtor de algodão Sérgio Pitt, de Barreiras, no oeste da Bahia, acompanha com preocupação a desvalorização do dólar frente ao real. Somente neste mês, o dólar caiu 4,4% e acumula queda de 5,5% nos últimos 12 meses. "Comprei fertilizantes no início do ano, quando o dólar estava mais alto, e provavelmente vou vender a safra num quadro de preços menores e dólar mais fraco. Na prática, minha margem de lucro será substancialmente menor", diz.

A valorização do real frente à moeda americana e a perspectiva de preços mais baixos para as commodities agrícolas são uma ameaça para a renda no campo. Com o real mais forte, o Brasil se torna menos competitivo no mercado internacional, o que deverá impactar na balança comercial do agronegócio em 2005.

Segundo estimativas da MB Associados, em 2005, o superávit da balança agrícola será de US$ 33,4 bilhões, muito próxima aos US$ 33,1 bilhões projetados para este ano. "O ritmo de crescimento vai diminuir", diz o economista Glauco Carvalho, da MB Associados.

Segundo ele, os produtos mais prejudicados serão aqueles em que o Brasil não tem tradição de exportação, como o milho e o trigo - nesse caso, o câmbio pode favorecer a importação desses produtos. Para as demais commodities, ele acredita que o Brasil vai aumentar os volumes embarcados, porém a receita gerada será menor. "Na prática, vamos vender mais por menos", afirma Dernizo Caron, consultor da GRC Visão.

Lucro menor

A lucratividade no campo deve cair, de acordo com Carvalho. Segundo ele, a rentabilidade do produtor de algodão cai de 27% para zero. No caso do milho, passa de 29% para 11% e para a soja, de 81% e 20% ante à safra anterior."Apesar de se estar desenhando um cenário pouco otimista, a situação não é tão preocupante quanto parece", diz Geraldo Sant¿Ana de Camargo Barros, coordenador do Centro de Estudos Avançados Economia Aplicada (Cepea), da USP. Segundo o economista, a queda do dólar frente ao real prejudicaria muito as exportações se fosse um fenômeno isolado. "É essencial notar que o dólar está caindo em relação a todas as moedas do mundo. O dólar está muito valorizado e o mercado está forçando uma correção de patamares", explica.

Ele diz que o dólar fraco aumenta o poder de compra dos demais países, o que pode levar ao aumento do consumo e, conseqüentemente, dos preços.

Margens reduzidas

Não só o produtor, mas também a indústria exportadora está preocupada com a situação da moeda americana.

O setor de suco de laranja, que exporta cerca de 90% do que é produzido, já prevê retração das margens de lucro. "Não temos como redirecionar a produção para o mercado interno. Continuaremos exportando com o dólar alto ou baixo", diz Ademerval Garcia, presidente da Associação Brasileiras dos Exportadores de Cítricos (Abecitrus).

Outra preocupação diz respeito ao médio e longo prazo. Garcia diz que a baixa do dólar pode desestimular os produtores a ampliar a oferta de laranja nos próximos anos. "O dólar em baixa e a alta dos insumos deixam o produtor desanimado e isso pode comprometer o abastecimento das indústrias no longo prazo", afirma.

Desestímulo ao plantio

Marco Antônio Aluísio, diretor da Associação Nacional dos Exportadores de Algodão (Anea), acredita que poderá haver um desestímulo ao plantio da safra 2005/06. Os preços internacionais estão em baixa e com a atual cotação do dólar há desestímulo para a exportação. Desse modo, sobra mais produto no mercado interno e o valor pago no Brasil cai ainda mais.

"O preço está muito baixo e, com o câmbio, está pior ainda", afirma Antônio Carlos Rego Freitas, da Horus Consultoria. . Segundo ele, na próxima safra o País vai ter um excedente de até 400 mil toneladas de pluma, que deverão ser exportadas ou vão ficar de estoque de passagem para 2006.

Outro setor que deverá sofre com a queda do dólar é o de máquinas agrícolas. Isso porque as exportações foram a salvação do segmento no ano passado e vinham sendo ainda mais importante neste ano, já que as vendas de máquinas no mercado interno não estavam mais crescendo. Dados Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) indicam que de janeiro a outubro as vendas de máquinas para o mercado interno somaram 33,7 mil unidades, com tímido crescimento de 0,7% em comparação ao mesmo período do ano passado.

Repasse de preços

Se no caso do suco as indústrias estão reféns do câmbio, no caso da carne a forte demanda internacional pode ser uma aliada para forçar um repasse de custos, diz André Skirmunt, diretor-comercial do frigorífico Independência.

Segundo analistas, a valorização do real frente ao dólar exige que os frigoríficos aumentem os preços das mercadorias na moeda americana. "Isso pode levar a uma queda do consumo", diz Paulo Molinari, consultor da Safras & Mercado.

No mercado de açúcar, também deve haver repasse de custos. "A queda da arrecadação em reais pode ser compensada com o aumento dos preços das commodities", afirma Fernando Moreira Ribeiro, secretário-executivo da União da Agroindústria Canavieira de São Paulo (Unica). Desde janeiro, as cotações do açúcar aumentaram 48% nas bolsas internacionais.

O mesmo acontece com o café, que já subiu 27% no último mês na bolsa de Nova York. Guilherme Braga, presidente da Conselho dos Exportadores de Café do Brasil, diz que a receita com as exportações para esse ano não serão comprometidas por causa do aumento dos preços do café. "Em 2004 deveremos nos aproximar dos US$ 2 bilhões em exportações de café verde".