Título: Queda do dólar pode afetar países...
Autor: Nivaldo Manzano
Fonte: Gazeta Mercantil, 02/12/2004, NAcional, p. A-6
Na década de 90, bancos centrais de países emergentes passaram a acumular grande volume de reservas internacionais. Isso ocorreu em grande medida como resposta à instabilidade financeira mundial que se seguiu à crise financeira de países asiáticos em 1997. Um segundo motivo para acumular reservas é a determinação de preservar a competitividade da moeda nacional frente ao dólar, como forma de estimular as exportações. Alguns países, como a China, passaram a comprar dólares em grande quantidade com o objetivo de manter baixa a paridade de sua taxa de câmbio.
Tornou-se recomendável desde então aos países emergentes deter o máximo possível de reservas internacionais como parte de sua estratégia de defesa e proteção contra a instabilidade de suas moedas e de sua economia. Como resultado, atualmente os países emergentes detêm um volume de reservas que corresponde em média a mais de 10% de seu Produto Interno Bruto (PIB); em alguns casos, excede a 20%.
A lógica que prevalece na posse de reservas é a de que de sua aplicação se espera um mínimo retorno financeiro, presumindo-se que seu valor será mantido ao longo do tempo. Infelizmente, prevêem analistas, este não será o caso para os detentores de reservas em dólar. Ninguém duvida de que o valor da moeda norte-americana esteja fortemente inflado, frente à dimensão do déficit em conta corrente dos Estados Unidos, que atingiu US$ 660 bilhões no meio do ano, ou 5,7% do PIB. Analistas concordam em que um déficit dessa magnitude é insustentável.
A única maneira conhecida de manter sob controle a expansão do déficit é mediante uma forte depreciação do dólar. Estima-se que, para corrigir o desequilíbrio na conta corrente dos EUA, o dólar deveria perder pelo menos de 25% a 30% de seu valor, no cotejo com outras moedas. Embora não se saiba com precisão a data em que isso vai ocorrer, é certo que ocorrerá em algum momento no futuro próximo, prevêem analistas. Prevê-se também que quanto mais demorada a correção, mais traumática poderá ser a depreciação.
Uma queda acentuada no valor do dólar deverá significar um sério golpe nas reservas em moeda norte-americana. Países nessa condição deverão sofrer uma perda substancial nos estoques de riqueza acumulada na forma de moeda, como resultado do fato de que as suas reservas em dólar passarão a valer muito menos do que pagaram por elas.
A tabela mostra a quantidade de moeda em reserva que alguns países em desenvolvimento poderia perder. As perdas estão expressas tanto em dólar corrente como em proporção ao PIB, sob diferentes cenários de depreciação do dólar. Os cenários de baixa, média e alta perda assumem um declínio no valor do dólar, respectivamente, de 13.8% , 22.8% e 42.0%
As perdas seriam substanciais em todos os casos. Nos casos de perdas mais severas, como o da China e Malásia, poderiam corresponder a 10% de seu PIB na hipótese de uma forte queda na cotação do dólar. Em casos menos severos, como o do México, poderiam corresponder a 0,9% do PIB, ou US$ 5,8 bilhões.
A título de comparação, o estudo do Banco Mundial estima que os ganhos para os países emergentes resultantes da liberalização do comércio mundial corresponderiam a 0,6% de seu PIB. Mas, enquanto os ganhos da liberalização se dariam ao longo de um período de tempo (dez a quinze anos), as perdas da desvalorização ocorreriam de uma só vez.
Os analistas, em resumo, estimam que, mesmo na hipótese mais otimista, países em desenvolvimento detentores de reservas em dólar perderiam com a desvalorização mais da metade do que poderiam ganhar com a eliminação de subsídios e remoção de barreiras comerciais no comércio internacional. Na hipótese mais pessimista, a perda corresponderia a 70% do que ganhariam com a liberalização do comércio.