Título: A Argentina nunca comprou tanto do...
Autor: Ismael Pfeifer e Cristina Borges Guimarães
Fonte: Gazeta Mercantil, 02/12/2004, nacional, p. A-6

Para se ter idéia do volume de entrada de bens brasileiros na Argentina, em julho, segundo estatísticas locais, 72% das geladeiras vendidas no mercado argentino foram feitas aqui - o que gerou, então, um limite de 50% sobre novas importações. Para televisores, definiu-se taxa de 21,5% a aparelhos feitos na Zona Franca de Manaus - considerados subsidiados. E nos carros, a liberação do fluxo bilateral, previsto para 2006, balança porque o governo argentino teme tornar-se apenas importador do bem. "Não deixaremos de adotar medidas para os automóveis, como fizemos em outros setores, para defender nossa indústria, caso seja necessário. Eles (o governo brasileiro) têm de entender que a integração regional não pode impedir que tenhamos uma indústria automotiva própria", reclamou recentemente o subsecretário de indústria da Argentina, Raúl Dejean

No setor de calçados, o choro é porque este ano devem entrar 12 milhões de pares, entre sapatos masculinos e femininos, tênis e chinelos (os de dedo da marca Havaianas são o must das garotas de classe média de Buenos Aires durante o verão).

Na opinião do especialista em economia internacional da Fundação Getulio Vargas (FGV), Evaldo Alves, a balança comercial reflete o maior dinamismo do produto brasileiro. "Houve aumento dos negócios com o Brasil porque a economia argentina está crescendo a taxas mais altas que a do Brasil. Eles poderiam até ser mais generosos com o País, mas a estratégia argentina de comércio exterior é muito mais agressiva que a nossa", disse Alves.

Para ele, a série de restrições à entrada de produtos geram ineficiência no parque industrial argentino. "Essas iniciativas não se sustentam no longo prazo", disse o professor. A tendência é de que o fluxo comercial entre os dois países continue crescendo, com aumento progressivo também das compras brasileiras, avalia Alves.

O resultado de novembro reforça a tese. As compras de R$ 570 milhões são recorde desde julho de 2001 o que faz o especialista argentino, presidente do Centro de Estúdios Bonairenses (CEB), Dante Cica, prever tempos melhores. "As vendas argentinas para o Brasil dão sinais de recuperação, o que tende a reduzir o déficit e a tensão", avalia, comemorando o crescimento de vendas de bens manufaturados, como produtos químicos, plásticos, mecânicos e autopeças.

O diretor da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), Mauro Laviola, é menos otimista e diz que o Mercosul está sendo desrespeitado pelo governo argentino. "Para proteger setores considerados sensíveis, a Argentina adotou medidas que ferem o acordo regional". Ainda este mês, na Reunião de Cúpula do Mercosul em Ouro Preto (MG), ele prevê que a Argentina tentará oficializar essas restrições comerciais.

Para Laviola, apesar de continuar competitiva no setor primário, outros segmentos industriais ¿ como bateria de automóveis, carne suína e veludo cotelê ¿ também podem engrossar a lista de produtos sensíveis.