Título: "Umbigo da Europa pode ser deslocado"
Autor: Gisele Teixeira
Fonte: Gazeta Mercantil, 29/11/2004, Internacional, p. A-10

No livro "Le Grand Turc et la Republique de Venise", lançado em outubro, a escritora e professora da Fundação Nacional de Ciências Políticas (Sciences-Po), Sylvie Goulard, elenca uma série de argumentos contra a entrada da Turquia na União Européia (UE). O primeiro deles é o fato de os turcos não respeitarem os chamados "Critérios de Copenhagen", exigências que um país deve atender para ter sua candidatura analisada. Entre eles estão a existência de instituições políticas estáveis que garantam a democracia, o governo pela lei e respeito aos direitos humanos e às minorias. "Os relatórios da Anistia Internacional falam por si", diz. Além disso, os países precisam ter uma economia de mercado funcional e a capacidade de cumprir com as obrigações de membro do bloco.

Mas há outras justificativas. Sylvie afirma que a entrada da Turquia deslocará o "umbigo" da Europa para o Oriente, pois tem uma população em franco crescimento, o que a deixará com tanto poder quanto a Alemanha. Pelas novas regras estabelecidas na Constituição européia, em uma década, ao ingressar na UE, a Turquia teria 14,5% dos votos do Conselho Europeu (tanto quanto a Alemanha) e 82 cadeiras no Parlamento. Em 2025 seria o país mais populoso da Europa, tornando-se a nação com maior representação política. "A pauta seria de prioridades turcas, que não são as nossas.". Além disso, o país é considerado pobre para os padrões europeus (seu padrão de consumo médio é cerca de um quarto do da UE), o que faz muitos países temerem uma onda maciça de migração de trabalhadores turcos em busca de melhores salários.

A escritora descarta a versão de que a adesão favoreceria a democratização e estabilização do país. E defende que nem geograficamente o país poderia ser considerado europeu. "A parte da Turquia que está na Europa representa menos de 5% do território e abriga apenas 8% da população." Sylvie evita incluir o aspecto religioso na discussão, ressaltando que a questão fundamental está em a UE não poder se alargar indefinidamente sem bases sólidas. Sylvia afirma que a UE não é um "clube cristão", até porque a comunidade islâmica está em toda a parte. "A dúvida é se o islamismo pode se modernizar e se integrar a conceitos novos, que se adaptem à realidade vivida pela Europa. " (G.T.)