Título: Impasse paralisa a reforma política
Autor: Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Gazeta Mercantil, 03/12/2004, Política, p. A-6

Datas, novos pontos incluídos e formato da votação são as causas da divergência. A Babel bíblica, na qual todos os homens falavam e ninguém se entendia, transferiu-se ontem para a sala da liderança do governo na Câmara. Reunidos por quase três horas, líderes da bancada governista tentaram encontrar um caminho para votar a reforma política, uma das cinco reformas-chaves prometidas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Todos defendem que a matéria precisa ser votada. Mas discordaram entre si das datas, dos pontos incluídos e dos procedimentos de votação. PP, PTB e PL são contra a lista partidária e o financiamento público de campanha. PCdoB, PPS e PV sentem-se incomodados com a cláusula de barreira de 5%. Resumo da ópera: uma nova reunião foi marcada para a próxima terça. "A reunião foi boa. Teve água, café, biscoito. Só faltou o consenso", ironizou o líder do PTB na Câmara, José Múcio Monteiro (PE).

Impasse A reforma política, que foi encaminhada para a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara em dezembro do ano passado e que passou um ano parada na CCJ, deve virar mais um reveillon sem ser apreciada. O encontro de ontem foi marcado pelo líder do governo, Professor Luizinho (PT-SP). Dois dias depois da matéria ser incluída na pauta de votações da CCJ, e retirada para garantir o apoio à aprovação da MP do Banco Central em plenário, os líderes tentaram encontrar uma saída para o impasse. O presidente da CCJ, deputado Maurício Rands (PT-PE), sugeriu que o texto fosse aprovado da forma como está na Comissão e eventuais mudanças ocorressem apenas em plenário.

"Existem pontos nevrálgicos que não concordamos, como a lista partidária. Temos que maturar mais o debate. Não vou aceitar fechar um acordo para ser atropelado depois em plenário", criticou o líder do Partido Progressista na Câmara, Pedro Henry (MT).

O líder do PL na Câmara, Sandro Mabel (GO), afirmou que não houve outra alternativa senão "colocar o pé na porta". O parlamentar goiano garante que a população não aceita financiamento público de campanha. Lembra que os eleitores cobram, por exemplo, a fidelidade partidária, assunto que está subliminarmente incluído no texto. "Se quisermos, de fato, discutir a reforma, temos que fatiá-la", sugeriu Sandro Mabel.

Insatisfação

O líder do PSB na Câmara, Renato Casagrande, não demonstrou muito otimismo à saída da reunião. Admite que o máximo que se consegue é um cronograma para votações. Acha que o impasse pode ser superado com um "fatiamento" da matéria: a aprovação de pontos de consenso, como o fim das verticalização e a unificação das datas das eleições. Os pontos polêmicos ficariam para mais tarde. "O problema é que o texto em debate na CCJ tem uma lógica perfeita. Se quebrarmos, poderemos até estar aperfeiçoando as regras. Mas não estaremos fazendo uma reforma de fato", lamentou Casagrande.

O presidente nacional do PPS, Roberto Freire (PE), defendeu uma quinzena de debates, no início do próximo ano, após a aprovação na CCJ, para aparar as arestas ao texto. Ele concorda que os destaques sejam feitos apenas em plenário, mas sugeriu que os acordos sejam fechados antes. Freire é enfático, contudo, ao proclamar que a reforma política é um assunto que diz respeito ao Congresso e aos partidos, e não, ao Executivo. Mabel discorda. "Quando eles precisam de nós para descascar abacaxi, nos procuram. Quando não precisam, vão dormir com a oposição. O Planalto não pode querer ter a liberdade de solteiro e a tranqüilidade de casado ao mesmo tempo", comparou.