Título: Mercado já prevê inflação de 6,26%
Autor: Caprioli, Gabriel ; Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 12/04/2011, Economia, p. 14

CUSTO DE VIDA

Em franca disparada, a inflação assusta o mercado e o próprio Banco Central. Há cinco semanas seguidas, os cerca de 100 analistas ouvidos pelo BC aumentam suas projeções para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medida oficial do regime de metas. Ontem, elas deram um salto maior do que em levantamentos anteriores, passando de 6,02% para 6,26% ao fim de 2011. A credibilidade dos cenários montados pela equipe chefiada por Alexandre Tombini foi, mais uma vez, questionada. Enquanto a autoridade monetária espera um arrefecimento em agosto, o mercado calcula que o mês marcará o pico da carestia, com o indicador alcançando 7,27% em 12 meses. Na opinião dos consultores, isso será reflexo do alcance limitado das medidas para conter a demanda, usadas como alternativa ao aperto na taxa básica de juros (Selic).

Um importante membro da equipe econômica, porém, aposta que o mercado está enganado. Ele afirma que o governo vai continuar a agir e, pelo menos até setembro, a política monetária vai trabalhar fortemente para interromper a escalada da inflação. Ele deu a entender que o ciclo de aperto deve se prolongar além de julho. O objetivo principal é evitar que o IPCA se afaste demais do centro da meta de 4,5% neste ano. Em 2012, enfim, a inflação convergiria para algo mais próximo desse valor. ¿A presidente Dilma deu carta branca para o Alexandre Tombini realizar essa convergência até o ano que vem. Ela não vai tolerar uma escalada da inflação¿, disse.

Brasília Apesar dos esforços para frear o ímpeto de consumo dos brasileiros e diminuir a pressão sobre os preços, a inflação medida nas principais capitais brasileiras continuou a escalada na primeira semana de abril. O Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S) avançou 0,89%, registrando acréscimo em seis dos sete centros urbanos pesquisados. O indicador foi puxado principalmente pelo setor de serviços. Brasília foi a cidade onde os reajustes foram mais salgados, com uma alta global que ultrapassou 1,1%. Para os economistas, o cenário atual aponta para uma espécie de ¿mudança de nível¿ na cesta de despesas dos brasileiros. Na prática, advertem, o padrão atual de inflação de serviços ¿ 8% nos últimos 12 meses encerrados em março ¿ veio para ficar.

Segundo André Braz, analista da Fundação Getulio Vargas (FGV), gastos maiores com os serviços são considerados naturais em economias aquecidas. Para ele, o perigo dessa inflação é que ela permeia toda a estrutura de preços da economia. ¿Essas despesas estão em todas as categorias. Em alimentação, há os restaurantes; em habitação, os gastos com empregada. Também estão nos custos com saúde, com o atendimento de clínicas e médicos, por exemplo¿, afirmou.

Além de atingir quase todas as relações comerciais, o segmento subiu, nos últimos 12 meses, mais do que os 5,9% aferidos pelo indicador cheio. ¿Fica claro que os preços do setor estão tendo aumentos reais¿, completou. A despeito de estar mais perceptível nos últimos meses, a inflação dos serviços não é um fenômeno recente, segundo Thiago Curado, da consultoria Tendências. O economista lembrou que, desde 2005, os indicadores de preços ao consumidor ¿ tanto o IPC-S quanto o IPCA ¿ têm apresentado o mesmo comportamento. ¿As taxas que medem os serviços nos últimos anos têm superado sempre a inflação cheia¿, comentou.

Curado explicou que a resistência dos reajustes desses preços ocorre porque não há a possibilidade de substituir a contratação de serviços por importações mais baratas, como acontece no mercado de bens de consumo. Para ele, essa persistência é parte de um processo de amadurecimento da economia. ¿Ocorre em todos os mercados que se consolidam. Em determinado momento, os preços de serviços começam a pesar mais do que os de bens. É um efeito negativo, porque destrói o poder de compra da população, apesar de refletir uma mudança positiva¿, ponderou.

O consumidor, porém, não parece disposto a absorver essa inflação, seja ela concentrada em serviços ou disseminada pela economia. Em Brasília, o aumento de 2,7% da gasolina foi a contribuição mais forte para o avanço de mais de 1,1% do IPC-S na capital, apertando mais o orçamento de quem depende do carro. O economista José Álvaro Pereira, 45 anos, queixou-se dos avanços indiscriminados. ¿Em algumas semanas, chego a gastar até R$ 250. Tem alguma coisa errada. Só o Brasil cobra esse absurdo pela gasolina. E isso porque vivemos em um país autossuficiente em petróleo¿, ironizou.

Para André Braz, ainda que seja em decorrência do desenvolvimento econômico, a carestia é perigosa para a economia. ¿Todo país que cresce é obrigado a conviver com algum nível de inflação. Mas temos que tomar cuidado para que ela não vire inercial, ou seja, que os preços sejam reajustados automaticamente pela expectativa de que devem ser elevados¿, advertiu.

Orçamento apertado Na avaliação de André Braz, economista da Fundação Getulio Vargas (FGV), o aperto no orçamento é reflexo da economia em desenvolvimento. De acordo com sua avaliação, além dos prestadores de serviço incorporarem nos preços a percepção de que a economia vai bem, ainda há o fato de que, ganhando mais, os consumidores fazem desembolsos maiores. ¿As pessoas ficam mais tempo fora de casa, almoçam na rua, contratam empregadas e outros profissionais para resolverem o que elas não têm tempo para solucionar¿, destacou.

IGP-M fica em 0,63% Se depender do ritmo do primeiro trimestre, o Índice Geral de Preços ¿ Mercado (IGP-M), principal indexador dos contratos de aluguel no país deve ultrapassar 12% neste ano. O indicador acumulou 3% de alta até a primeira medição de abril (período que compreende o intervalo entre 21 e 31 de março) e gira acima dos 10,7% nos últimos 12 meses, segundo a Fundação Getulio Vargas. Em relação ao mesmo período de março, o IGP-M acelerou 55%, puxado especialmente pelos preços aos produtores, que avançaram 0,63% no período. No atacado, o principal vilão foi o álcool etílico anidro, com alta de 31,12%. A pressão, por sua vez, foi transmitida à gasolina e ao álcool combustível ao consumidor. Esses itens, de acordo com a metodologia do IGP-M, subiram 2,20% e 12,75%, respectivamente.