Título: Competição reduz ganho em contrato para automóveis
Autor: Denise Bueno
Fonte: Gazeta Mercantil, 31/08/2004, Relatório - Seguros Patrimoniais, p. 3

Vender seguro automóvel pode ser considerada uma tarefa fácil. É o mais vendido do Brasil, tanto porque a população tem consciência de que é um produto necessário, como por ser priorizado por cerca de 75% dos corretores, que dependem dessa venda para manter suas empresas abertas. No primeiro semestre deste ano, as seguradoras movimentaram R$ 4,8 bilhões em prêmios, um crescimento real de 6,5%, de acordo com dados da Superintendência de Seguros Privados (Susep), órgão que fiscaliza o setor. Desse valor, 74,4% retornaram aos segurados em pagamento de indenizações.

Agora, ter resultado com a venda de seguro automóvel é outra história. "A concorrência predatória, a dificuldade de reduzir as fraudes, a queda das taxas de juros e a perda do poder de compra da população foram responsáveis por uma deterioração no resultado das seguradoras com a venda de seguro automóvel", avalia Luiz Roberto Castiglione, consultor e membro da Associação Nacional de Seguros Privados (ANSP).

Segundo Emerson Bernardes da Silva, executivo da Unibanco-AIG Seguros, tendo em vista a maturidade do produto, sua característica de ser demandado pelos clientes - o que em tese, facilita o processo de vendas e se torna uma grande fonte de geração de caixa para as empresas -, e o grande número de competidores no mercado, o resultado operacional vem sendo comprometido ao longo dos últimos anos. Segundo ele, o índice combinado (prêmios menos indenizações e custos de venda) médio dos últimos dez anos é de 109%.

Competição intensa

Assim como Idacelmo Mendes Vieira, diretor de produtos da Itaú Seguros, Marcus Vinicius, vice-presidente da SulAmérica Seguros, Luiz Pomarole, diretor de auto da Porto Seguros, Luiz Carlos Nabuco, diretor da Bradesco Seguros, vários outros executivos que atuam no setor são unânimes em dizer: é um mercado muito competitivo. Há anos.

"Há um movimento cíclico na carteira de automóvel das seguradoras. Num semestre algumas ganham mercado porque reduziram preço. No semestre seguinte, se observa a alta do índice de sinistralidade. No semestre subseqüente o resultado mostra perda de mercado por possível reajuste de preço para controlar a sinistralidade", comenta José Rubens Alonso, sócio da KPMG especializado em seguros.

Ganhos da especialização

Em levantamento feito com as dez maiores seguradoras do Brasil, apenas uma manteve os dois índices estáveis no comparativo do primeiro semestre de 2003 e de 2004: a Porto Seguro, a maior do País em vendas no primeiro semestre e considerada a mais especializada do setor pelos seus próprios concorrentes. "Esse resultado é fruto de especialização que temos, que nos permite fazer uma revisão periódica do mercado mensalmente. Isso nos possibilita perceber tendências e com isso temos mais possibilidade de corrigir distorções que antes eram percebidas no prazo total do contrato", diz Pomarole.

Para as seguradoras, ter o seguro de auto em carteira é certeza de captação rápida de recursos, o que engorda o resultado financeiro da companhia com o investimento dos recursos. O ganho financeiro é um forte ingrediente da formação do preço do seguro. Quanto maior, mais as seguradoras podem baixar o preço para o consumidor. Quanto menor, mais eficientes elas têm de ser para que a venda seja rentável. "Mas vender barato para fazer caixa pode custar caro no decorrer de um ano, prazo do contrato. É dentro desse período que a seguradora consolidará os reflexos da venda", diz Castiglione.

No primeiro semestre, a fraca venda de carros novos e a queda do poder de compra do consumidor, intensificou a concorrência e o "jogo de rouba monte". A disputa é mais acirrada pelos compradores de carros zero quilômetro, principais consumidores de seguro. A frota de veículos em circulação no país é estimada em 25 milhões de unidades. Destes, cerca de 14 milhões são os automóveis zero quilômetro ou que têm mais de quatro anos e menos de dez anos de uso. No entanto, hoje só 9 milhões de carros têm seguro.

A maioria dos executivos afirma que é um processo que desgasta a todos. "É preciso monitorar tudo o tempo todo: preços praticados, índices de roubo de cada marca, em cada região. "Se a polícia age em um bairro, os ladrões correm para outro", acrescenta Vieira. "E os modelos mais preferidos também mudam sem aviso prévio. Hoje, a Parati aparece com um índice de freqüência de sinistros muito maior do que os campeões Audi A3 e Golf", complementa Luiz Pomarole, da Porto Seguro.

Margem de 5%

Segundo Vieira, do Itaú, a margem de ganho de uma seguradora com a venda de seguro automóvel está muito estreita, chegando ao limite de ganho médio de 5%. "E só chega a essa margem quem realmente investe muito na carteira, como tecnologia, prevenção e mantém uma política de subscrição adequada. Um passo errado pode tirar a companhia do mercado", alerta. "Não é um ramo para aventureiro. Tem de ser profissional para ganhar dinheiro", diz.

Para conseguir manter o crescimento dentro desse cenário e fugir do "jogo de rouba monte", o melhor trunfo é criar produtos e serviços que fortaleçam a fidelização, para poder manter a clientela e não sofrer a pressão da concorrência. "Apesar da deterioração dos resultados, observa-se o amadurecimento das companhias ao vermos que as diferenças entre os preços praticados apresentam intensidade menor que as constatadas anteriormente, reduzindo a pressão de mercado por queda nos preços", comenta o Emerson Bernardes da Silva, da Unibanco.

Pomarole concorda: "Todas as companhias estão adotando estratégias de fidelização e isso deverá reduzir a mudança de companhia basicamente por preço", diz. O índice de renovação da Porto é de 80%. "É preciso achar o ponto de equilíbrio. Por mais que o cliente esteja satisfeito com serviços e atendimento, se o preço estiver proibitivo, não fica. E vice-versa", comenta Marcos Vinicius, vice-presidente de automóveis da SulAmérica, que tem investido forte em serviços para acabar com o estigma de que seguro é tudo igual.

Destaques em vendas

De acordo com um estudo da Castiglione Business, o maior índice de alta das vendas entre as dezoito principais do ramo auto foi registrado pela Liberty Paulista, com crescimento real de 48,9%, seguida pela Tokio Marine, com 25,3%; Brasilveículos, seguradora do Banco do Brasil em parceria com a SulAmérica, com 24,4%, e Mapfre Seguros, com 19,5%. As principais quedas de faturamento foram da Yasuda, com 23%, AGF Brasil, com 12,8%, Unibanco-AIG, com 8,5%, e Itaú, com queda real de 4,6%.

As menores sinistralidades no primeiro semestre são da Porto, com 60,1%, Marítima, com 57,8%, Liberty, com 68,5%, e Alfa, com 68,9%. As maiores sinistralidades estão na Bradesco, com 92%, Tokio Marine, com 81,5%, Yasuda, com 87,9%, Unibanco-AIG, com 81,3%, e Generali, com 88,7%. Segundo executivos da Bradesco, isso ocorreu em função da contratação de serviços terceirizados para regulação de sinistros, fazendo com que as despesas saíssem de despesas administrativas para despesas com sinistros. Outro ponto relevante, destacado pelos executivos da Bradesco para justificar a alta da sinistralidade, que no primeiro semestre de 2003 era de 76,9%, foi o aumento das provisões técnicas.

Semestre promissor

Para o segundo semestre, a expectativa dos executivos é de que a carteira de auto apresente um resultado melhor tanto em termos de faturamento como em rentabilidade, uma vez que a venda de carros zero quilômetro tem registrados sinais de melhora desde julho passado.

O grupo Bradesco promete novidades para o segundo semestre deste ano. "O nosso objetivo é criar produtos e serviços para encantar o consumidor e mantê-lo fiel. Essa é a melhor maneira de enfrentar a concorrência", diz Nabuco. A Porto também: o certificado de procedência, um aval de que o carro está com documentação e mecânica em dia, passará a ser gratuito para os clientes da Porto e também aumentará o serviço de avaliação de mais de 100 itens do carro.