Título: Na iminência do caos logístico
Autor: Paulo Tarso Resende
Fonte: Gazeta Mercantil, 14/12/2004, Opinião, p. A-3

O Brasil pode vir a perder vantagens competitivas internacionais. A partir de 2005 o Brasil poderá passar por uma crise sem paralelos em sua história, que os especialistas estão chamando de "apagão logístico" - uma redução violenta nos tempos de movimentação e estrutura de armazenagem, podendo resultar em congestionamentos e perdas incalculáveis. Se isso acontecer, o País pode mergulhar num período de difícil recuperação de sua vantagem competitiva internacional. Precisamos avaliar os possíveis reflexos desse apagão logístico, que, ao contrário do simples congestionamento portuário ou da falta de estruturas de armazenagem, poderá tomar rumos perigosos, dentre eles os efeitos negativos de um possível superabastecimento interno, com todos os problemas que acarretaria. Quando as empresas exportadoras começarem a perceber longo tempo de transporte, ausência de oferta de veículos, operações portuárias lentas e falta de equipamentos logísticos, a primeira reação pode ser saturar os canais de distribuição internos, provocando um excesso de oferta. Esse cenário se torna cada vez mais factível, já que pesquisas recentes revelam alguns sinais de alerta. Por exemplo, a possibilidade de aumento de 40% no pagamento de demurge (um tipo de penalidade portuária devido à espera do navio), acumulando prejuízos da ordem de US$ 200 milhões. Mais do que esse prejuízo, espera-se fuga de navios, reduzindo em cerca de 25% a oferta atual, que já é baixa. A escassez de navios poderá acarretar um aumento de cerca de 30% nos fretes marítimos, que já se encontram em seus limites máximos. Pode levar ainda a um aumento da oferta de veículos para o mercado interno, fazendo o valor do frete cair a níveis tão baixos que a logística interna ruim ainda compense a distribuição por caminhões na longa distância, com efeitos altamente negativos para a competitividade de outros modais de transporte. Outros dados logísticos indicam claramente que opção pela distribuição interna poderá ser uma realidade. Nesse caso, entrada de capitais externos seria prejudicada, forçando o Brasil a atrair capital especulativo com taxas de juros mais atraentes. Crédito interno ficaria mais caro e demanda se reduziria, resultando em sobras de ofertas. É quadro paradoxal, com efeitos de arrasto sentidos por muito tempo em vários setores econômicos. Alguns caminhos poderão reduzir os prejuízos, apesar de os investimentos em infra-estrutura não serem revertidos em benefícios a curto prazo. É preciso que o planejamento nas empresas leve em conta alternativas de distribuição e de mercados em que os prejuízos logísticos tenham menor impacto nas margens finais dos produtos. Pelo lado público, reduzir os impactos é ação de curtíssimo prazo, mas exige que o governo faça seu dever de casa, como, por exemplo, concluir o debate político das PPPs, mesmo que seja por medidas, e levar a discussão para cenário estratégico de sobrevivência no mercado global. Investimento em infra-estrutura logística no Brasil é questão de Estado e passível de ações nem sempre vistas como viáveis para debate democrático de longo prazo. kicker: O planejamento das empresas deve levar em conta opções de distribuição e de mercados.