Título: O desafio de elevar a qualificação profissional
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Fonte: Gazeta Mercantil, 01/09/2004, Opinião, p. A-3

As atenções estão voltadas para os gargalos na infra-estrutura, mas outro grave obstáculo ao ingresso do País num ciclo de desenvolvimento sustentado já preocupa o setor empresarial ¿ a carência de mão-de-obra qualificada para ocupar as vagas que começam a surgir em diferentes segmentos da atividade econômica.

Um desses setores é a indústria naval, que renasce depois de viver duas longas décadas à míngua de encomendas de grandes embarcações. Reativam-se os estaleiros fluminenses e de outros estados; empresas de engenharia, entre as quais a Camargo Corrêa, anunciam investimentos para ingressar no setor naval; e grupos estrangeiros reforçam sua presença no País. Toda essa movimentação tem como mola propulsora a atividade de pesquisa, exploração e produção de petróleo no litoral brasileiro.

A construção e montagem de novas plataformas de petróleo, à medida que se amplia a produção offshore, e a futura licitação da Transpetro para construção de 22 navios petroleiros de grande porte garantem à indústria naval um potencial de crescimento inimaginável até recentemente. Além disso, deve-se levar em conta que a construção de outros tipos de equipamento ¿ como embarcações de apoio, de menor porte ¿ também contribuem para robustecer as receitas do setor.

É bom lembrar que embora a indústria naval tenha vivido uma crise prolongada, o Brasil não deixou de formar pessoal de nível superior especializado em engenharia naval. A Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), por exemplo, desde a década de 1950 mantém curso de Engenharia Naval e Oceânica.

Diante da demanda crescente por especialistas com formação superior, outra instituição, a Universidade Federal Fluminense (UFF), instalada em Niterói, também estrutura cursos de graduação e pós-graduação em Engenharia Naval e Offshore, que começarão a ser ministrados a partir do próximo ano. Para melhor atender às necessidades da indústria, a UFF ela-bora os currículos a partir de sugestões do setor empresarial, sobretudo dos estaleiros fluminenses, para que seu conteúdo responda aos requisitos do mercado.

Mas para a indústria naval, assim como para outros segmentos, como o de geração de energia termoelétrica, a carência de mão-de-obra qualificada diz respeito principalmente a profissionais de chão de fábrica e de nível médio ou técnico. De maneira geral, os estaleiros e a indústria do petróleo encontram dificuldade principalmente em contratar trabalhadores formados e treinados para utilizar as modernas tecnologias e métodos de produção ¿ da soldagem das chapas à pintura do casco do navio, por exemplo.

Esta circunstância impõe a tomada de iniciativas para formação de mão-de-obra por meio de cursos técnicos de média duração, como os oferecidos pela CoopFurnas e pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) no Estado do Rio de Janeiro. O Senai/RJ, gerido pela Federação das Indústrias local (Firjan), já estruturou variados cursos técnicos específicos para qualificar trabalhadores do setor.

Nesta seara, o Senai promoveu cerca de 3,7 mil atendimentos entre 2002 e 2004. Essa estatística não inclui cursos profissionalizantes, em que apenas para soldadores foram ministrados cerca de 2,3 mil treinamentos no Centro de Tecnologia de Soldagem (Cetec/Solda) do Rio de Janeiro. Além disso, conforme este jornal informou, a primeira turma de pós-graduação em automação dos sistemas de produção, refino e transporte de petróleo do País, aprovada pelo Ministério da Educação, foi iniciada em março passado no Instituto Senai de Educação Superior, no Rio.

Por sua vez, a CoopFurnas, fundada por ex-profissionais de Furnas, oferece às indústrias naval e do petróleo cursos técnicos com duração média de cinco meses, voltados para a especialização de trabalhadores em produção de petróleo e na operação de usinas termoelétricas.

A falta de trabalhadores qualificados não se restringe às indústrias naval e do petróleo, embora nestas o problema tenha se tornado mais visível. Nas últimas semanas, empresas do setor metalmecânico localizadas na Grande São Paulo também relataram dificuldades na contratação de torneiros mecânicos e ferramenteiros, entre outros profissionais.

É um paradoxo, na atual quadra de elevados índices de desemprego nas regiões metropolitanas. Afinal, muitos profissionais dessas categorias foram demitidos há não muito tempo. A indústria teria incorporado, rapidamente, tecnologias muito avançadas ou será que, como dizem trabalhadores hoje informais, os atuais salários não são compensadores? kicker: Os estaleiros se ressentem da falta de pessoal formado e treinado para usar as novas tecnologias de construção de navios