Título: Agricultores não têm acesso ao crédito rural
Autor: Neila Baldi
Fonte: Gazeta Mercantil, 01/09/2004, Agribusiness, p. B-12

Os produtores rurais estão receosos com os entraves na concessão de crédito para custeio da safra 2004/05 e ainda para investimento na produção. Agricultores e pecuaristas dizem que não conseguem empréstimos a juros fixos de 8,75% ao ano. Representantes de indústrias de maquinário também reclamam que os bancos ainda não liberaram recursos para o financiamento das vendas do setor.

"O crédito está moroso, restrito e com acompanhamento de juros complementares", diz Carlos Sperotto, presidente da Comissão de Crédito da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Segundo ele, menos de 40% da safra de verão obteve recursos para custeio a juros de 8,75% ao ano. As dificuldades serão discutidas na reunião da Câmara Temática de Financiamento e Seguro do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento com a CNA, que ocorre amanhã na Exposição Internacional de Animais (Expointer), em Esteio (RS).

"Estamos a 30 dias da safra de soja e as lavouras ainda não foram contratadas", afirma Sperotto. Segundo ele, primeiro houve indefinição nas normas de operação do crédito e agora, outro problema, é a questão dos transgênicos. De acordo com Sperotto, muitos bancos estavam exigindo dos produtores declaração de que não plantariam organismos geneticamente modificados. "Enquanto não for oficializada a questão dos transgênicos para a próxima safra, o produtor não vai poder tomar crédito", afirma Sperotto.

Queda expressiva

A escassez de crédito poderá ser parcialmente atenuada com a antecipação da liberação de recursos anunciada ontem pelo secretário de Política Agrícola do ministério, Ivan Wedekin (veja reportagem abaixo). Segundo Wedekin, levantamento realizado pelo Ministério da Agricultura mostra que e durante o mês de julho, o primeiro do ano-safra 2004/05, houve uma redução de 42% nos empréstimos de custeio liberados aos agricultores pelo Banco do Brasil (BB) se comparado ao mesmo período do ano passado. O número de operações totalizou R$ 885 milhões.

Outra reclamação dos produtores se refere à oferta de crédito para investimento, que também está com o ritmo lento na sua liberação. Nesse caso, houve atraso também na divulgação das normas, que somente ocorreu em 11 de agosto, quase dois meses após o anúncio do Plano Safra 2004/05. Segundo levantamento feito pelo setor, em média, o tempo gasto entre o recebimento do pedido de crédito até a liberação do financiamento tem sido de 140 dias. No ano passado, girava em torno de 120 dias. O presidente da Kepler Weber, Othon d¿Eça Cals de Abreu, está preocupado com a demora. Segundo ele, em 2003, 70% das vendas foram com recursos próprios, no entanto, este ano, o produtor está menos capitalizado e dependeria do sistema financeiro para a efetivação dos pedidos. "O agricultor vai ter que optar na hora de tomar o crédito entre financiar a lavoura ou investir", afirma. Ele explica que, como em média gasta-se até 180 dias desde a efetivação do pedido até a montagem do armazém, poderá haver um estrangulamento no momento em que os bancos passarem a liberar os recursos. "Estamos com muitas propostas represadas", afirma Abreu.

Sperotto também reclama do fato de o crédito para investimento, com recursos do Banco do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ter um custo adicional de 4% (flat), o que encareceria as máquinas agrícolas. De acordo com Sperotto, o setor já reajustou este ano em 60% os preços cobrados e a cobrança do flat poderia justificar outro aumento. "Crédito a juros altos está sobrando. Tememos que, com isso, se repita o endividamento que onerou o setor agrícola há 11 anos", afirmou.