Título: Força nacional e ineficiente
Autor: Calcagno, Luiz
Fonte: Correio Braziliense, 15/04/2011, Cidades, p. 27

Especialistas em segurança pública argumentam que o batalhão especial, presente nos municípios do Entorno a partir de segunda-feira, não resolve o problema da violência. Governos goiano e do DF defendem que a unidade ajuda na diminuição dos índices de criminalidade

Pronta para atuar no Entorno a partir da próxima segunda-feira, a Força Nacional de Segurança (FNS) pode trazer mais dor de cabeça do que soluções para o combate à criminalidade na região. Por mais que os governos do DF e de Goiás estejam otimistas, especialistas em segurança pública colocam em dúvida a eficiência da tropa de elite nos municípios goianos vizinhos ao DF. Eles são da opinião que o batalhão tem treinamento para atuar em questões pontuais e não contra a violência praticada em cidades como Novo Gama, Águas Lindas, Luziânia e Valparaíso, classificada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como epidêmica.

A FNS é composta por policiais militares, bombeiros e policiais civis de diversos estados brasileiros. O governador de Goiás, Marconi Perillo, pediu, em reunião no último dia 12 com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e a secretária Nacional de Segurança Pública, Regina Miki, a presença da unidade no Entorno na tentativa de reduzir os índices crescentes de criminalidade. A tropa vai atuar inicialmente em Águas Lindas, que apresentou um aumento no registro de homicídios de 43% de janeiro a março de 2011. A previsão, no entanto, é que a atuação alcance 20 cidades.

Para o consultor de segurança e ex-secretário Nacional de Segurança do Ministério da Justiça, coronel José Vicente da Silva, no entanto, a presença da FNS será apenas paliativa. Segundo ele, ¿os índices de violência são altíssimos¿ e, para combatê-los, é preciso conhecer a região e os costumes da população. ¿A Força pode auxiliar, mas não será nada continuado. É como um problema de saúde. Se você não previne, toda hora tem que internar o paciente no hospital. E a Força é um hospital.¿

Na visão do coronel, para combater com eficiência a violência no Entorno, é preciso ações determinadas e integradas por parte do governo do Goiás e do Distrito Federal. Ele explicou ¿pensar em fronteiras não ajuda a resolver nada¿. ¿Os três entes têm que se entender: o DF, o Goiás e a União, por meio do Ministério da Justiça, que pode coordenar o diálogo. A Força Nacional é sintomática. É um remédio para tirar a dor, mas não cura. O que resolve é um tratamento continuado. Precisamos de uma resposta eficiente¿, avaliou.

Terra de ninguém A vice-coordenadora do Núcleo de Estudos de Violência e Segurança da Universidade de Brasília (UnB), Maria Stela Grossi Porto, endossa a opinião do coronel José Vicente. Também especialista em segurança pública, ela lembrou que o Entorno se tornou uma ¿terra de ninguém¿. Para a também professora do departamento de Sociologia, isso ocorre porque os municípios são renegados pelo governos goiano e do DF. ¿Eu acho que não faz sentido mandar a Força Nacional para o Entorno. Há um risco, com a vinda frequente da Força, que isso se transforme numa modalidade regular para resolver as questões de segurança. A parceria entre Goiás e DF pode dar mais certo¿, defendeu.

Na visão da especialista, a criminalidade nos municípios goianos que cercam o DF é grave, mas não uma questão de segurança nacional. Para ela, a tropa de elite não deveria ser usada para resolver conflitos internos. ¿Me parece que é uma modalidade de atuação que não faz sentido para o tipo de problema que a região tem. Ao não estarem preparados para esse tipo de problema, tendem a atuar com excesso de força e a realizar abordagens inadequadas. Eles são uma modalidade de enfrentamento da violência preparada para a guerra. O desafio é manter a ordem sem abrir mão dos direitos humanos¿, afirmou. Em outubro de 2009, três homens da FNS foram denunciados por tortura (leia Memória).

De acordo com Stela, a presença ou a ausência da tropa no Entorno não é um fator marcante o suficiente para medir os índices de violência na região. ¿É muito complicado dizer que a redução ou o crescimento ocorreram pela presença da Força. Se for o caso de haver uma diminuição quando ela está presente, a presença dela, por outro lado, pode trazer intimidação e medo¿, explicou.