Título: O crescimento do PIB estimula o investimento
Autor:
Fonte: Gazeta Mercantil, 02/09/2004, Opinião, p. A-3

Da profusão de boas notícias sobre o desempenho da economia associadas à divulgação pelo IBGE da taxa de crescimento do Produto Interno Bruto no segundo trimestre, destaca-se o conjunto das que permitem assumir que já não são as exportações que puxam a retomada do crescimento e sim a expansão da demanda doméstica. Ou seja, o crescimento do PIB ganha uma nova dinâmica: em vez de se apoiar apenas nos setores exportadores e no setor industrial, passa a ser sustentado também pelo setor de serviços, associado basicamente às atividades internas, como é o caso dos subsetores comércio, transporte e instituições financeiras. Esse deslocamento do ímpeto, de um pólo irradiador para outro, suscita expectativas de confiança na evolução positiva dos negócios, ao mesmo tempo que levanta indagações sobre se estão dadas as condições necessárias e suficientes para a sustentação da retomada.

Para verificar se, com base nos resultados do primeiro semestre em especial, existem razões para se acreditar que ocorreu uma redução no grau de incerteza sobre o futuro, convém analisar os aspectos qualitativos da evolução do PIB. A esse respeito, distinguem-se dois conjuntos de fatos. No primeiro, observa-se que do primeiro para o segundo trimestre do ano caiu acentuadamente a contribuição do setor agropecuário na formação da taxa de crescimento do PIB, Cresce-ram, em compensação, as contribuições da indústria e, sobretudo, dos serviços. No segundo, observa-se que no primeiro trimestre de 2004 cerca de 55% do crescimento de 2,7% do PIB (em relação ao primeiro trimestre de 2003) deveram-se ao desempenho das exportações líquidas (exportações menos importações de bens e serviços); os restantes 45% correspondem à demanda doméstica. No segundo trimestre, o setor externo foi responsável por 15,4% somente do crescimento de 5,7% do PIB; e os restantes 84,6% correspondem à demanda doméstica ( 47% referentes ao consumo das famílias, em relação aos 23,4% registrados no primeiro trimestre).

Estão aí as evidências de que o crescimento na primeira metade de 2004 deixou de apoiar-se na agropecuária - que até então liderava os indicadores da retomada - para ser conduzido pela indústria e pelos serviços. Deixou também de depender majoritariamente do desempenho do setor externo para se apoiar na expansão da demanda doméstica, especialmente o consumo das famílias. A depender do consumo das famílias, o crescimento do PIB acima de 4% em 2004 estaria assegurado.

Essas transformações são obviamente positivas porque ampliam o leque de setores e diversificam as fontes de dinamismo da economia. Tem-se aí um tento em favor da redução do grau de incerteza, condição necessária para a decisão de investimento. Mas isso não é tudo. Sabe-se que, para além do desempenho do consumo das famílias, do salário e do emprego, é o investimento que deve prevalecer como fonte principal desse dinamismo.

A esse respeito, o que se tem observado no desempenho de vários indicadores é a retomada dos investimentos na produção, à medida que o crescimento da demanda se consolida, tanto na frente interna quanto na externa. Segundo o IBGE, os investimentos cresceram 11,7% no segundo trimestre, depois de quedas sucessivas nos quatro trimestres anteriores.

São inúmeros os sinais de que a indústria tem apresentando uma maior propensão a investir - em especial o setor de bens de capital, o mais sensível à variação no investimento. Mas há também indícios de investimento no setor de bens de consumo.

De Janeiro a julho, a indústria de máquinas e equipamentos cresceu 25,2% em relação ao mesmo período do ano anterior, enquanto a indústria em geral cresceu 7,7%. A produção de bens de capital vinha sendo sustentada pelas exportações, mas à produção interna tem-se juntado o crescimento das importações de máquinas em resposta à aceleração da retomada. E, felizmente, há folga suficiente nas contas correntes do balanço de pagamentos, para se intensificar as importações.

A Confederação Nacional da Indústria chama à atenção o risco de descompasso entre o crescimento da demanda e a ampliação da oferta. O risco limita-se, no entanto, a um ou outro setor, como o de madeira, já que os setores de bens intermediários - cujo nível de utilização da capacidade instalada encontra-se no limite -, têm cumprido seu cronograma de expansão.

Não se exclui a possibilidade de algum estrangulamento na oferta, que poderia ser superado via importação. Mas eis o que seria um problema bem-vindo, se não se estivesse sujeito ao peso de outra alternativa, preferida do Banco Central - estrangular a demanda mediante o aumento dos juros. kicker: Cresce a disposição para investir à medida que se difunde a confiança na redução do grau de incerteza sobre o futuro