Título: O Ceará investe no potencial do mercado chinês
Autor: Adriana Thomasi
Fonte: Gazeta Mercantil, 02/09/2004, Gazeta do Brasil, p. B-13

A participação das exportações brasileiras no total das importações chinesas correspondeu a apenas 1,1% em 2003. A Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China do Ceará, instalada esta semana, se propõe a alavancar negócios com base no conhecimento e informação. "Conhecemos apenas 5% a 6% desse mercado", afirma o presidente da entidade cearense e coordenador nacional da área têxtil, Lúcio Antônio de Campos Pinheiro. Segundo ele, o foco da entidade é a aproximação e o fomento de negócios entre os dois países.

Mas um longo caminho separa os e empresários brasileiros do mercado da China ¿ o maior país do mundo em população, com 1,28 bilhão de habitantes, e quarto em extensão territorial, com 9,6 milhões de quilômetros quadrados, atrás de Rússia, Canadá e Estados Unidos. "O gargalo ainda é a logística, mas a China precisa investir para assegurar o fluxo contínuo, regular e confiável de produtos estratégicos para o seu crescimento econômico e para alimentar sua população", afirma o presidente binacional da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China, sediada no Rio de Janeiro, Charles Tang, que esteve em Fortaleza na última segunda-feira para participar de seminário sobre comércio bilateral.

Os avanços recentes, após a inclusão do país na Organização Mundial do Comércio (OMC), ainda não livraram os chineses de embaraços que dificultam as operações de comércio exterior. "A diferença de legislação funciona como elemento complicador do processo", observa o assessor especial para assuntos internacionais do governo do Ceará, José Nelson Bessa Maia. O rápido crescimento do comércio Brasil-China esbarra também no desconhecimento e falta de informação entre os países, avalia Bessa. "O adensamento das relações comerciais vem só de dois anos para cá, apesar das três décadas de convivência", afirma. A distância geográfica ¿ mais de 20 mil milhas marítimas ¿, a diferença cultural e lingüística e a pequena presença institucional do Brasil na China funcionam como inibidores da expansão, segundo Bessa. "O Brasil tem uma pequena embaixada em Pequim, com apenas seis pes-soas, número que deve dobrar para 12, e só dois consulados gerais ¿ em Xangai e Hong Kong, para cobrir todo o território. China e Brasil não têm acordo de visto para turistas, o que dificulta o maior fluxo", observa o executivo.

Charles Tang, da Câmara do Rio de Janeiro, acredita que o Ceará pode aumentar sua participação com exportações de castanha de caju para a China. O executivo diz que o foco não deve ser apenas em commodities, mas também em produtos de maior valor agregado. "O problema é que a China está mais interessada em minérios, alimentos, com alta demanda, e matérias-primas, de maneira geral", acrescenta Bessa.

O especialista lista como segmentos promissores para o comércio do Ceará o têxtil, de confecções, móveis em madeira, laticínios, frutas, minérios, granito em bruto e processado, pescados, incluindo criatórios de mariscos, além do turismo. No ano passado, 12 milhões de chineses viajaram ao exterior. "Os investimentos em logística, com foco no porto do Pecém, ampliando a capacidade de infra-estrutura de transporte, também estão nos planos estaduais. O especialista diz que os chineses têm interesse em investir em logística portuária e de transporte no Brasil, a fim de garantir maior confiabilidade no escoamento da produção agrícola e de minerais e aguardam a regulamentação das Parcerias Público-Privadas.

O executivo Tang vê possibilidades nas parcerias. "A Câmara já articulou investimentos para madeireiras e existe chance de aporte de capital chinês para o cultivo de soja, produção de fertilizantes, instalação de matadouros e serrarias, além do sisal. O Ceará poderá ser fornecedor até de camarões, pois é um grande criador em cativeiro", assinala. Tang diz ter disponibilizado ao diretor de promoção de investimentos do Banco do Nordeste do Brasil (BNB), Victor Samuel da Ponte, a estrutura dos 7 escritórios da entidade, instalados na China para divulgar as oportunidades de investimentos da região. "O banco participou da feira em Xangai, em 2002, e acredito que vamos estabelecer uma rotina de trabalho interessante para mostrar as potencialidades do Nordeste", afirma.

"Potencial magnífico"

O advogado Cid Marconi Gurgel de Souza, diretor-executivo da Câmara do Ceará, diz que o trabalho com o mercado chinês vem sendo desenvolvido há 13 anos e a intenção é facilitar a relação entre os dois países, em especial no Ceará. Marconi observa que o país asiático tem população consumidora da ordem de 534 milhões de pessoas, oito vezes maior do que a brasileira e três vezes a norte-americana. "Um potencial magnífico."

De 1991 a 1998 ¿ com exceção de 1993, quando os embarques para o país somaram US$ 593 mil em valores FOB ¿, o Ceará exportou quase nada. Já em 2003, os negócios somaram US$ 3 milhões, no global. Nos primeiros seis meses deste ano, os embarques atingiram US$ 5 milhões, ainda pouco, mas quase o dobro de todo o ano passado, comenta Marconi. As importações cearenses da China, por sua vez, atingiram em 2003 cerca de US$ 27,3 milhões no período.

"Em 2003, as exportações brasileiras para a China registraram valor recorde de US$ 4,53 bilhões, com incremento de 79,8% em relação ao ano anterior", acrescenta Bessa. No período, o país ocupou a terceira posição de destino das exportações brasileiras, após os Estados Unidos e a Argentina. As importações brasileiras provenientes da China cresceram 38,2%, fechando o ano em US$ 2,15 bilhões. "O comércio bilateral atingiu US$ 6,68 bilhões, com superávit favorável ao Brasil em US$ 2,38 bilhões e crescimento de 64% em comparação com 2002", afirma o assessor especial para assuntos internacionais do governo do Ceará. A soma de todas as importações e exportações chinesas foi de US$ 851 bilhões, representado aumento de 37%, com superávit comercial de US$ 25 bilhões. As projeções para 2004 indicam que o intercâmbio global da China deverá alcançar perto de US$ 1 trilhão, de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI).

Novas oportunidades

Pelas previsões de Tang, os negócios entre o Brasil e a China devem fechar o ano com valor em torno de US$ 10 bilhões. "Creio que o superávit brasileiro será, no mínimo, de US$ 2,5 bilhões", estima. O comércio bilateral, no ano passado, ficou em US$ 6,7 bilhões. Bessa prefere não fazer projeções para o exercício, em função não apenas dos problemas da soja, que deverão provocar efeitos sobre o total das exportações brasileiras, mas também pela desaceleração da economia chinesa, estratégia do governo daquele país para conter a avalanche de importações e pressões inflacionárias.

A participação das exportações brasileiras no total das importações chinesas correspondeu a 1,1% em 2003, apesar dos avanços. "É muito pouco em relação ao global de US$ 413 bilhões", diz Tang. De acordo com o especialista Bessa, as reformas implementadas após o ingresso do país na OMC sinalizam para um leque de novas oportunidades. "O Brasil vem pressionando o governo chinês para concluir o mais rapidamente possível o processo de habilitação das exportações brasileiras de carne bovina `in natura¿ e de produtos cítricos.

kicker: A diferença de legislação funciona como um elemento complicador

kicker2: Os chineses têm interesse em investir na infra-estrutura portuária