Título: Mercado evangélico move R$ 500 milhões
Autor: Regina Neves
Fonte: Gazeta Mercantil, 03/09/2004, Mídia & Marketing, p. A-16

Segmento de 30 milhões de brasileiros consome fielmente personagens infantis, livros, música e até cartões de crédito. Fiéis também na hora de comprar, os evangélicos brasileiros, que somam cerca de 30 milhões de pessoas, segundo o IBGE, estão movimentando um crescente mercado que tem atraído empresas dos mais diversos segmentos, de cartão de crédito a editoras e, principalmente, criado e sustentado muitas outras, incluindo do licenciamento de marcas ao mercado fonográfico.

Essas empresas, segundo cálculos do setor, movimentam por ano cerca de R$ 500 milhões. O censo do IBGE revela ainda que o segmento é responsável pela geração de mais de um milhão de empregos diretos e indiretos. Além de grande e rico, o mercado evangélico se mantém em forte crescimento. Segundo o Serviço de Evangelização para América Latina (Sepal), organismo estabelecido no Brasil há mais de 30 anos, a projeção é que, em 2022, metade da população brasileira seja evangélica, considerando-se que as taxas do segmento cresceram 1,5 vez mais rapidamente do que a população em geral na década de 80 e mais que quatro vezes nos 90.

Mais de 200 empresas destas empresas que têm como público alvo os evangélicos estarão reunidas em São Paulo na terceira edição da Feira e Exposição Internacional do Consumidor Cristão (Ficoc) , que será realizada de 21 a 26 deste mês no Expo Center Norte. A feira deve gerar negócios em torno de R$ 10 milhões durante os seis dias de realização e de mais R$ 50 milhões no decorrer do ano como resultado de negócios fechados nestes dias.

A expectativa é da EBF Eventos que organiza a feira - que tem o patrocinada das empresas Line Records e editora Atos. "Estamos nos baseando nos resultados do ano passado quando tivemos 150 expositores e a feira rendeu cerca de R$ 3 milhões, representando o fechamento de negócios durante o ano de R$ 30 milhões", diz Eduardo Berzin, presidente do grupo EBF que é formado por quatro empresas: editora, empresa de eventos, call center e distribuidora de filmes bíblicos.

"Já somos uma das maiores feiras do segmento no mundo", afirma "No ano passado recebemos 30 mil visitantes e este ano estamos trabalhando para dobrar este número e para isto estamos desenvolvendo atividades paralelas como o Congresso Anual das Livrarias Evangélicas e atraindo formadores de opinião. Só de pastores estão confirmados 10 mil," garante. Dos expositores 50% são do ramo fonográfico, 30% de livros e bíblias e 20% de produtos de culto e produtos para o dia-a-dia.

Para Berzin o mercado evangélico é crescente e vai na contramão do mercado em geral pois está longe das crises. "Estamos também crescendo em número de pontos-de-venda, Só de livrarias são mais de quatro mil", conta. Em todo o País também existem 150 mil templos, a maioria deles com uma lojinha de produtos religiosos anexa. Além disto os produtos evangélicos têm ganho status e começam a ser encontrados no varejo em geral. "A expectativa é que em dez anos existam 250 mil tempos e os evangélicos somem 60 milhões", afirma.

O licenciamento de marcas é um dos mercados crescentes no mundo evangélico, apesar de ainda novo. A QI Brasil, empresa criada há um ano por profissionais de mídia, marketing e licenciamento, resolveu apostar neste mercado e está licenciando a cantora e apresentadora Mara Maravilha. A estimativa da empresa é de um retorno financeiro em torno de R$ 100 milhões anuais com vendas de produtos no varejo, principalmente, para público evangélico.

A empresa desenvolveu o projeto "Turma da Marinha", onde Mara é uma menina meiga que adora cantar e mostrar prováveis soluções para os problemas de uma turma de amigos. Hoje Mara apresenta o programa Gospel Line, na Rede Record e segundo Fábio Ricca, um dos sócios da QI Brasil, apesar de não estar mais fazendo programas infantis, tem uma grande audiência entre o público infanto-juvenil.

O primeiro produto que será lançado ainda este mês é o álbum de figurinhas "Histórias da Bíblia", com ilustrações e cromos auto-adesivos que terão como personagens a "Turma da Marinha". Segundo Carlos Eduardo Cruz, da Kromo Editora, as perspectivas são tão positivas que a primeira tiragem será de 800 mil envelopes e 25 mil álbuns, esperando-se que nos primeiros três meses alcance-se a marca de dois milhões de envelopes vendidos.

A marca está sendo licenciada também para uma empresa que produz balas e chicletes. Além da Mara, a QI Brasil está licenciando produtos da cantora Sula Miranda, que segundo Ricca também tem grande penetração entre evangélicos, com linhas de perfumes e jóias. "O segmento evangélico é a bola da vez. É o mesmo fenômeno que aconteceu há uns dez anos com o mercado de produtos para negros", afirma Ricca.

Outro caso é o do personagem Smilingüido, da Editora Luz e Vida, empresa que produz material impresso e eletrônico, áudio visuais, cds e vídeos destinados a todas as religiões, de católicos a evangélicos e com foco principalmente no público infantil. "Parte do resultado financeiro de nosso trabalho é empregado na ajuda a entidades sociais e missionárias. Outra parte dos recursos é investida para o cumprimento da missão de produzir cada vez mais materiais de qualidade que veiculem uma mensagem cristã", explica Eduardo Serafim Souza, coordenador de marketing da editora.

O personagem Smilingüido surgiu na década de 80 através de um grupo de jovens em que havia uma desenhista Márcia D¿Haese que ilustrava seus trabalhos com uma formiguinha e um jovem com talento para escrever: Carlos Tadeu. "A primeira idéia de nome para a formiguinha foi Zecão, mas logo o grupo achou o nome muito pesado para um ser tão pequeno e frágil. Sugeriram então Smilingüido, para dar relevância ao fato de que apesar de pequeno e frágil, ou seja "desmilingüido", o Senhor Deus poderia manifestar Seu poder e Sua grandeza", conta Serafim.

O personagem deu origem também à Turminha Querubim que em 1989 foi incorporada pela Editora Luz e Vida. Os personagens são utilizados em diversos tipos de materiais impressos, como agendas, cartões, calendários, livros, gibis, etc, além de materiais áudio visuais como os desenhos animados "Moda Amarela" e "A Invasão" (que será finalizado até o final do ano) e ainda games, CD-Roms e musicais.

Hoje a Luz e Vida tem 11 empresas licenciadas. "Temos planos para outros licenciados que são muito importantes para nosso negócio", diz Serafim. "Por mais que tenha a experiência de 50 anos e que esteja em franco crescimento, a Editora Luz e Vida, muitas vezes, encontra dificuldades em colocar seu produtos no chamado "mercado secular". O licenciado fortalece a imagem de nossos personagens em mercados onde temos dificuldades de penetrar", explica.

"São feitos estudos cuidadosos para a escolha dos licenciados para que nossa missão seja sempre o foco. Todo o tipo de material é exaustivamente analisado. Tudo para ter certeza de que a mensagem que queremos passar será levada junto ao produto, da melhor maneira possível", afirma. A Luz e Vida, que tem sede em Curitiba, também exporta publicações em inglês e espanhol para Estados Unidos, Japão, Chile, México e Canadá, entre outros. A empresa está sempre presente em feiras. No momento, tem estande na Feira Escolar que se realiza em São Paulo. Estará na, Ficoc e também na feira católica, que se realiza na semana que vem.

O mercado dos evangélicos interessou também ao Bradesco que, entre seus cartões de afinidades com a bandeira Visa (que incluem clubes de futebol, entidades filantrópicas, associações de classe, partidos políticos e sindicatos), mantém cartões para o mundo evangélico. Parte da anuidade do cartão de crédito é repassada a entidade. Os cartões Visa Bradesco são da Convenção Batista Brasileira, Assembléia de Deus e Fundação Renascer.

Mas, sem dúvida, é o mercado fonográfico o grande beneficiado com o crescimento do consumo evangélico enquanto grupo. Existem, hoje, no País, 120 gravadoras e distribuidoras de musica gospel, que faturaram cerca de R$ 120 milhões em 2003. Os evangélicos contam ainda com 470 emissoras de rádio e várias TVs. "A Associação Brasileira dos Produtores de Discos o estilo gospel está em terceiro lugar na preferência do público", diz Maurício Soares, diretor comercial da Line Records, gravadora ligada à Rede Record e que ao lado da MK Publicitá é uma das duas maiores gravadoras evangélicas do Brasil.

Segundo Soares, o mercado gospel deve crescer ainda mais nos próximos anos com a abertura de novos pontos-de-venda. "Hoje nossos produtos estão na Wall Mart, Carrefour, Lojas Americanas ou podem ser adquiridos via internet pelo site Submarino, que vão se somar aos mais de 3 mil pontos-de-venda evangélicos com que trabalhamos", conta .

"Também temos um número crescente de cantores brasileiros que representam 98% do nosso catálogo". Ele conta que a música gospel é altamente vendável. "Só este ano já somamos seis discos de ouro, com mais de 100 mil cópias vendidas, quer dizer o dobro do exigido pela Associação brasileira de Produtores de Disco", conta. Além disso, gravadora também exporta aos evangélicos brasileiros que vivem nos Estados Unidos e Europa para o mercado de evangélicos brasileiros que vivem no exterior.