Título: O microcrédito produtivo
Autor: Marco Gorini
Fonte: Gazeta Mercantil, 09/09/2004, Opinião, p. A-3

Só 5% das pequenas empresas têm acesso ao crédito. A demanda reprimida por microcrédito produtivo no Brasil está estimada hoje em aproximadamente R$ 12 bilhões. Embora 99% das empresas do País sejam micro ou pequenas, gerando 56% dos empregos e 20% do PIB, 95% delas não possuem acesso adequado ao crédito. Em parte por causa disso, 50% fecham as portas em até dois anos. Em 1999 o Banco Central (BC) criou a figura da Sociedade de Crédito ao Microempreendedor (SCM), instituição financeira focada em conceder crédito para esse segmento, com o objetivo de exercer função estratégica na indução ao desenvolvimento local, atuando na universalização do acesso ao crédito, fomentando o empreendedorismo, gerando trabalho, renda e promovendo a inclusão social. Para que essa nascente indústria de microcrédito produtivo avance de forma plena e sustentável nos seus objetivos, alguns desafios terão de ser enfrentados. O principal é a auto-sustentabilidade. Existem gargalos no acesso ao funding e no alcance da escala operacional necessária. O governo, com recursos financeiros e políticas claras, pode cumprir um papel essencial nessa fase, mas para o setor atingir a auto-sustentabilidade é imperativo atrair o capital privado. Capital privado move-se à luz das percepções do investidor do contexto econômico e sociopolítico em geral e do equilíbrio dinâmico formado entre o risco, o retorno e a liquidez vis-à-vis o seu custo de oportunidade em especial. Diante disso, é preciso examinar as estruturas de incentivos existentes no setor - nas esferas institucional, legal e operacional - para atrair funding privado com o perfil adequado. Nos âmbitos institucional e legal, as SCMs devem atuar de forma solidária e focada, imbuídas do desejo de fortalecer o setor. A competição, para ser sadia, deve ocorrer no nível operacional. Na esfera legal é fundamental reduzir a carga tributária das SCMs para no máximo metade da atual. A perda de receita do governo seria irrisória, tendo em vista o tamanho atual do setor. No que tange à disponibilidade de funding, seria extremamente produtiva a transferência da operacionalidade dos recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), hoje no BNDES, para o BB e a CEF, com a adoção de controles orientados para resultado e performance, bem como a criação, por parte do BB, da CEF e dos bancos de varejo, de fundos de recebíveis de microcrédito, com incentivos tributários tanto para os gestores quanto para os investidores. Outras medidas de estímulos seriam a criação de fundos de responsabilidade social focados em microcrédito e a autorização para as SCMs captarem recursos de investidores institucionais, com piso e teto predefinidos. O microcrédito produtivo pode ser uma poderosa ferramenta na busca da redução da desigualdade e do subdesenvolvimento e da democratização das oportunidades. Convergindo ideais e canalizando esforços, é possível darmos um salto de desenvolvimento com sustentabilidade para o setor. Todos - governo, empreendedores, investidores e sociedade civil organizada - têm a sua parcela de responsabilidade. kicker: É imperativo atrair o capital privado para o setor atingir a auto-sustentabilidade