Título: Cacau renasce e puxa preço de terras
Autor: Lucia Kassai
Fonte: Gazeta Mercantil, 09/09/2004, Agribusiness, p. B-12

Produtores da Bahia renovam 30% das áreas atacadas pela doença da vassoura-de-bruxa. O avanço do processo de combate à doença da "vassoura-de-bruxa" no sul da Bahia está reaquecendo o mercado de terras na região. O hectare, que no período mais agudo da crise chegou a custar R$ 300, hoje não sai por menos de R$ 2 mil e a expectativa é de que em cinco anos chegue a triplicar de valor, atingindo os R$ 6 mil do período pré-crise. A crise, que transformou o Brasil de exportador em importador mundial, foi tão violenta que áreas valorizadíssimas nos anos 70 e 80 foram abandonadas e invadidas por sem-terras.

As terras estão se valorizando à medida que avança o processo de substituição das árvores doentes por espécies resistentes ao fungo da vassoura-de-bruxa. Estima-se que 30% da área cultivada de cacau tenha sido renovada nos últimos quatro anos. A meta é chegar a 50% até 2007, informa a Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac). "O objetivo é chegar a 50% porque estamos incentivando sobretudo a renovação de áreas com condições agronômicas perfeitas para a cultura", diz Everaldo Anunciação, diretor-adjunto da Ceplac. "Nos demais 50%, vamos incentivar o plantio de outras culturas como fonte de renda", afirma.

A renovação da lavoura de cacau deveria ter sido concluída em 2000, mas por restrições orçamentárias teve início somente naquele ano. O maior empecilho é o custo elevado, de R$ 3,5 mil por hectare. Outra dificuldade é a lentidão na recuperação do investimento: uma vez renovada, a árvore leva dois anos para começar a produzir e outros seis anos para que amadureça e a produção de amêndoas estabilize.

A tecnologia que tem permitido aos produtores de cacau voltar a sonhar com os anos de riqueza e glória é um método conhecido como enxertia. Nele, o material genético resistente à vassoura é enxertado em uma árvore doente, sem a necessidade de que ela seja arrancada do solo. A árvore doente absorve a nova genética e ao longo dos anos se torna sadia.

Isidoro Lavigne Gesteira, grande produtor em Itajuípe e Ilhéus, onde planta 380 hectares de cacau, já renovou 50% da área cultivada e espera concluir o processo nos próximos quatro anos. "Tudo depende da liberação de novos recursos. Se tiver que usar recursos próprios, não termino antes de oito anos", diz o produtor, cuja família planta cacau há cerca de 60 anos.

Gesteira, assim como a grande maioria dos agricultores da região, pleiteia o perdão de uma dívida de R$ 160 milhões contraída logo após o surgimento da vassoura-de-bruxa na região. De acordo com ele, os métodos recomendados pela Ceplac na época não surtiram efeito. "Seguimos a orientação do governo e, apesar disso, a doença só avançou. Por isso, não achamos justo pagar a dívida", diz.

De acordo com Anunciação, da Ceplac, os métodos de combate estavam corretos, porém o crédito só foi suficiente para atender 30% dos produtores da região. "Todos os agricultores tinham que combater o fungo ao mesmo tempo, para que não restasse nenhum foco de resistência da doença. Como a grande maioria não teve acesso à linha de financiamento, a doença persistiu", afirma. Recentemente, o governo renegociou a dívida dos cacauicultores, que ganharam 20 anos para pagar e desconto de 25% para as parcelas pagas em dia. Além disso, no último Plano de Safra o governo anunciou uma linha para renovação das árvores, na qual o produtor tem oito anos para pagar, com carência de quatro anos e juros de 8,75% ao ano.

Além da renovação das árvores, os produtores estão investindo no adensamento das plantações. Gesteira, que antes plantava 550 árvores por hectare, está adensando e quer chegar a 1 mil plantas por hectare. "Vamos aumentar a produção e a produtividade", acredita. O Brasil, que chegou a produzir 406 mil toneladas de cacau, não deve colher 200 mil toneladas neste ano.

O ataque do fungo, que dizimou as lavouras de cacau da Bahia no final dos anos 80, provocou uma onda de empobrecimento que levou à proliferação de assentamentos de sem-terra. Na região que abrigou oligarquias há 104 assentamentos, com 5,3 mil famílias ocupando uma área de 30 mil hectares. "Áreas produtivas foram abandonadas e ocupadas por sem-terras que hoje produzem cacau", diz Anunciação, da Ceplac. "Com o renascimento da cultura e dos preços, agricultores estão tentando reaver suas propriedades na justiça".

Para o analista Thomas Hartmann, de Salvador, a recuperação da produção vai resultar em preços menores para o agricultor. "O mercado local é balizado pelos preços da mercadoria importada, FOB Holanda", diz. O cacauicultor brasileiro recebe US$ 1,7 mil a tonelada, enquanto o da Costa do Marfim ganha US$ 400 por tonelada. "Quando o País for auto-suficiente, os agricultores vão receber preços de Brasil. E a renda será equilibrada pelo aumento da produção".