Título: Uma saída para o Pacífico
Autor: Marconi Perillo
Fonte: Gazeta Mercantil, 10/09/2004, Opinião, p. A-3

Analistas têm alertado para o colapso infra-estrutural do Brasil, que em setores como o da logística de escoamento da produção, garantidor de maior competitividade, já começa a dar sérios sinais de estrangulamento. O crescimento da economia brasileira neste ano contribui para a necessidade de canalizar investimentos que desencadeiem o desenvolvimento da infra-estrutura de transporte, energia, comunicação e saneamento.

O custo do transporte é hoje peça fundamental da nova logística de produção que o País precisa implantar para se integrar ao comércio mundial, garantindo sustentabilidade ao desenvolvimento que experimenta em tecnologia, produtividade e produção.

Sou defensor e entusiasta das ferrovias. Vejo nelas a alternativa capaz de suprir as deficiências brasileiras em logística. As rodovias federais são um gargalo com o sinal de alerta ligado. Todos os estados sofrem com isso.

O Ceará tomou, recentemente, a medida drástica de impedir caminhões pesados de trafegar nas rodovias estaduais, que são bem conservadas. O mesmo problema atinge Goiás e, acredito, outros estados.

Projetos como a Ferrovia Norte-Sul, a conclusão da Ferronorte, a melhoria da Centro-Atlântica e a modernização dos portos são decisivos para atrair investimentos e criar novos corredores de escoamento. São obras importantes para todo o País e, em particular, para o Centro-Oeste, que tem um dos maiores índices nacionais de crescimento econômico, balizado na descentralização da economia, com incentivos à verticalização da produção e à geração de emprego e renda. A região produz cerca de 30% da safra do País e aloja 41% do rebanho bovino, o que demonstra sua pujança e posição de vanguarda na agroeconomia.

Goiás tem crescido três vezes acima do PIB nacional graças a um bem-sucedido esforço para a eliminação dos gargalos (como a crônica falta de incentivos), à produção de mais energia, à melhoria das estradas e à ampliação da capacidade de armazenamento, além da agregação tecnológica. Goiás faz sua parte, melhorando as estradas; e pede a Brasília mais eficiência no setor, porque a má conservação das rodovias federais reduz nossa capacidade de competição.

Precisamos criar novas rotas de acesso aos mercados internacionais. Um caminho da maior importância será aberto com a implantação da Ferrovia Norte-Sul, pelo Porto de Itaqui, no Maranhão. Outro virá com a abertura de uma saída para o Pacífico.

Esta é uma solução não só para Goiás ou o Centro-Oeste, mas para todo o País. A rota das exportações para os mercados asiáticos, principalmente China e Japão, será reduzida em mais de 7 mil quilômetros; encurta-se a ligação com a Costa Oeste dos Estados Unidos. É frete menor e rapidez na entrega, dinamizando as vendas para os maiores mercados do mundo. Os produtos brasileiros, hoje, chegam à Ásia saindo por Santos, passando pelo Canal do Panamá e por San Francisco, nos EUA, para só então cruzar o Pacífico.

Há inúmeras alternativas para criar uma saída para o Pacífico. A que melhor atende os interesses do Centro-Oeste é, coincidentemente, a mais viável do ponto de vista técnico e de infra-estrutura: uma via multimodal, combinando rodovia, ferrovia e hidrovia até o Porto de Arica, no Chile. Seu efeito suplementar é induzir o crescimento de toda a região.

Já existem estudos mostrando que a safra nacional de grãos, com uma saída para o Pacífico, poderia ser elevada para 160 milhões de toneladas, 50% superior à atual. Geram-se aí 200 mil empregos diretos na agricultura e mais 500 mil na indústria e serviços, levando até mesmo à ocupação demográfica dos espaços vazios ao longo do percurso.

O empreendedorismo privado já exercita, em caráter experimental, uma rota de acesso aos portos do Chile e do Peru. A Bolsa de Mercadorias & Futuros, em São Paulo, debate a ligação do Brasil com o Pacífico pelo Porto de Antofagasta, no norte do Chile.

É importante conquistar a adesão do governo federal, mesmo porque serão necessários acordos internacionais e investimentos externos. A implantação da saída multimodal custará em torno de US$ 9 bilhões, captados preferencialmente pela iniciativa privada. Já há contatos com grupos chineses interessados em investir nesse novo corredor, de olho na redução dos custos de produtos brasileiros - como a soja - que abastecem a China.

A estruturação de uma saída para o Pacífico combina possibilidades reais com expectativas de transformação não apenas de uma região, mas de todo o País. A logística existente está saturada. É urgente criar alternativas para que o desenvolvimento regional e a integração nacional possam continuar oferecendo bons frutos. A Ferrovia Norte-Sul e a Ferronorte também colaboram com esse objetivo, representando, em inter-relação com a saída para o Pacífico, o quadro de uma nova logística de transporte para dar sustentabilidade à produção do Centro-Oeste e do Brasil. É esse o trabalho que nos cabe a todos, neste instante crucial em que o futuro está ao alcance das nossas mãos.

kicker: A rota para os mercados asiáticos será reduzida em mais de 7 mil quilômetros