Título: Os fatores de risco do Copom perdem força
Autor:
Fonte: Gazeta Mercantil, 14/09/2004, Opinião / Editorial, p. A-3

É compreensível o estado de apreensão e de desconforto em que se encontra grande parte dos empresários e trabalhadores às vésperas da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central na quarta-feira. O Copom poderá elevar a taxa básica de juros (Selic) para o próximo período, como já havia admitido de modo inequívoco na sua última ata, divulgada no dia 26 de agosto, atirando um balde de água fria nas expectativas recentíssimas de crescimento econômico continuado.

Os membros do comitê têm advertido sobre o risco de trajetória ascendente da inflação, associada à recuperação da atividade econômica nos últimos doze meses, indicando que a autoridade monetária poderá adotar uma medida de impacto, revertendo a tendência à redução gradual da taxa Selic, que se vinha mantendo estável em 16% desde abril.

Os dois fatores de risco que segundo a ata estariam pressionando as projeções de inflação - a alta dos preços do petróleo e a leve deterioração das expectativas de inflação para 2005 - parecem ter perdido o aparente ímpeto inicial e atualidade. O diagnóstico incandescente de agosto alterava a avaliação da ata anterior, de que a manutenção dos juros nos níveis atuais por um período prolongado garantiria a evolução da inflação em direção à trajetória de metas.

Com efeito, o resultado da inflação de agosto, divulgado pelo IBGE, parece à primeira vista convalidar a postura de "cautela redobrada na condução da política monetária", a que se refere o Copom, "para manter o equilíbrio entre a oferta e a demanda agregada." O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrou alta de 0,69% após ter atingido em julho a sua maior taxa no ano 0,91%, um resultado que se situou acima da média das projeções do mercado, definidas em 0,65%. Vale lembrar que o IPCA é o indicador utilizado para balizar as decisões de política monetária dentro do sistema de metas de inflação. No acumulado do ano, os 5,14% registrados representam 94,2% da meta central determinada para 2004 (5,5%), o que bastou para a autoridade monetária "redobrar" a sua "cautela".

Mas o fato é que não há indícios concretos sobre o comportamento da atividade econômica que forneçam condições para se afirmar com segurança que estaria ocorrendo desequilíbrio entre a oferta e a demanda. De um lado e de outro não se enxergam sinais perturbadores que provoquem pressões inflacionárias. Elementos consistentes sobre o grau de aquecimento da atividade, referentes aos meses de agosto e setembro, somente poderão ser colhidos ao final de setembro. É a partir desses meses que a base de comparação de dados se torna mais elevada, pois foi em agosto e setembro de 2003 que se manifestaram os primeiros indícios da retomada. São várias as evidências que recomendam prudência à autoridade monetária quanto a elevar a taxa de juros, para evitar que por excesso de zelo possa comprometer-se a recuperação, tão esperada e necessária.

A primeira é que a taxa de inflação, medida pelo IPCA, demonstrou que a elevação recente foi motivada por pressões sazonais e reajustes de tarifas públicas, fato que descaracteriza a alta de inflação como provocada pelo aquecimento da demanda. Da mesma forma, a primeira prévia de setembro do Índice Geral de Preços - Mercado (IGP-M) apresentou elevação de 0,19% em agosto para 0,35% em setembro, mas o aumento concentrou-se no atacado. Os dados não revelam, pois, um repique inflacionário generalizado, e apontam itens com desaceleração de preços. É o caso dos legumes e do aço, produto que há meses era apontado como vilão da inflação no atacado.

A segunda é que a questão do preço do petróleo perdeu boa parte da importância com que foi abordada na reunião do Copom de agosto. A possibilidade de reajuste dos combustíveis parece descartada no curto prazo, ante o recuo das cotações internacionais do produto, que de US$ 50 por barril registrados por ocasião da última avaliação mensal do Copom haviam retrocedido ontem para US$ 41 caracterizando uma firme trajetória descendente.

A terceira é o recuo da taxa de câmbio, variável importante no modelo de projeção de inflação, e também a redução do risco país. Assim, o aumento das receitas em moeda estrangeira, mediante a expansão das exportações, a mudança da nota de avaliação do País e a intensificação no fluxo de recursos indicam uma forte redução na vulnerabilidade das contas externas.

Há pois uma safra de fatos positivos a estimular a confiança dos empresários - em especial os que se dispõem a retomar os investimentos -, na recuperação em base sustentável. Não convém frustrá-los.

kicker: São várias as evidências que recomendam prudência à autoridade monetária quanto