Título: Nova crise da US Airways não é caso isolado
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Fonte: Gazeta Mercantil, 14/09/2004, Transporte & Logística, p. A-14

A concordata da US Airways, a segunda pedida pela companhia em apenas dois anos, deixa à mostra os sérios problemas que atravessa não só essa companhia, mas também várias outras das grandes empresas aéreas norte-americanas. A US Airways solicitou a proteção das leis de falência (que permitem a uma empresa seguir operando e reestruturar-se sem ter de cumprir no prazo os compromissos com seus credores) ante a possibilidade de não ficar com suficiente capital depois de pagar uma série desses compromissos financeiros.

Os problemas pontuais que deixaram a US Airways nesta situação foram a alta do combustível, que segundo se calcula lhe custará no ano 2004 cerca de US$ 300 milhões adicionais ao previsto inicialmente; a redução na demanda de passageiros e a impossibilidade de chegar a um acordo com seus trabalhadores. A isto se somaram a crise decorrente dos atentados do 11 de setembro de 2001 e outra queda na demanda, esta fruto da desaceleração da economia. Mas os problemas de mais longo prazo que a companhia aérea enfrenta são os mesmos de outras grandes empresas: seus altos custos, sistemas de conexão que não atendem as necessidades de muitos passageiros e a concorrência das companhias aéreas regionais.

A US Airways tem um custo por passageiro calculado em 11,18 dólares, o mais alto da indústria. A Delta Airlines, outra companhia que está lutando para evitar a concordata, tem o segundo custo mais alto por passageiro da indústria aérea, de 10,32 dólares; e a United, que já está em concordata, lhes segue com um custo por passageiro de 9,83 dólares. No lado oposto está a JetBlue, a "estrela" das novas companhias aéreas, com um custo por passageiro de apenas 5,90 dólares. Grande parte da diferença entre os custos de uma e outra companhia aérea tem a ver com os salários e benefícios de seus empregados. As companhias aéreas mais antigas foram criadas na época em que os sindicatos tinham grande poder nos EUA, e por isso seus empregados gozam de altos salários e benefícios. Daí que toda a discussão de companhias aéreas como Delta e US Airways se concentre na necessidade de seus empregados "sacrificarem-se" pelo bem da companhia, e aceitar assim a redução de salários e benefícios.

A US Airways já reduziu seus custos de pessoal em 2 bilhões de dólares em 2003 para sair de sua primeira concordata, e agora pede a redução de outros 800 milhões de dólares, algo que não foi aceito pelos empregados. A companhia aérea tem agora a vantagem de, sob a proteção das leis, poder pedir ao tribunal que interceda e obrigue a implementar os cortes de despesas com pessoal. É por isso que os analistas não acreditam que a US Airways tenha que perder ou liquidar ativos, e espera-se que depois de alguns meses protegida pelas leis de quebra a empresa volte a operar de maneira normal. Além dos custos trabalhistas, outro problema das companhias como a US Airways é seu modelo de operação, baseado na utilização intensiva de alguns aeroportos, que são verdadeiros "nós" nas conexões dos vôos com escalas.

Os analistas explicam que em vôos internacionais ou de longo percurso isto não apresenta maior problema, já que os clientes assumem as escalas como parte normal da viagem. Onde começam os problemas é quando se fazem viagens domésticas que, pela forma como a companhia aérea opera, causam, freqüentemente, longas horas de espera por conexões muito pouco práticas para o passageiro. Este problema das empresas convencionais beneficiou muito as companhias aéreas de baixo custo, como a JetBlue, que operam de cidade a cidade sem escalas. Os baixos custos trabalhistas dessas novas empresas, além do fato de costumarem operar com aviões mais novos (mais eficientes em consumo de combustível e manutenção), lhes permitem oferecer preços mais baixos, que têm como resultado um grande negócio para elas e sérios problemas para seus concorrentes mais antigos.