Título: Acesita imprime ritmo empreendedor no comando da fundação
Autor: Durval Guimarães
Fonte: Gazeta Mercantil, 14/09/2004, Carreiras, p. A-14

Na condição de presidente da Fundação Acesita Para o Desenvolvimento Social, o engenheiro mecânico Anfilófio Salles Martins, tem, entre seus numerosos deveres, a meritória tarefa de socorrer 42 entidades filantrópicas sediadas em Timóteo e vizinhança, município onde está localizada a siderúrgica Acesita, a maior fabricante de aço inoxidável da América latina, com produção anual de quase 500 mil toneladas. Cabe-lhe, também, o papel de atender aos desesperados pedidos de emprego que atracam diariamente no departamento de recursos humanos da usina.

Aparentemente, Salles seria a pessoa menos indicada para o cargo, pois demonstra verdadeiro pavor por doações ou qualquer tipo de gesto que possa parecer caridade. Também não manifesta simpatia pela burocrática colocação de pessoas que eventualmente ficaram desocupadas. No entanto, o executivo é muito estimado por praticamente todas as entidades locais de benemerência, hoje caminhando com as próprias pernas, como é o seu desejo. Também é, provavelmente, uma das pessoas que mais ofereceram ocupação para seus conterrâneos, auxiliando-os a constituir suas próprias empresas ou através da criação de cooperativas de trabalho.

Nos últimos cinco anos, foram abertas 32 novas indústrias na cidade, apoiadas por uma agência de desenvolvimento subordinada à sua entidade e que até empresta máquinas pesadas, por tempo indeterminado, para quem quer montar o próprio negócio, mas não dispõe de dinheiro para as primeiras despesas. Para estes, porém, não basta o sonho de se estabelecer por conta própria: os interessados devem, antes, freqüentar cursos de capacitação no manuseio do aço e de formação gerencial. Somente, então, são liberados para se constituírem como empresários, se associar a cooperativas ou trabalhar como autônomos, com o apoio e assistência do órgão. Algumas das empresas já estão exportando e oferecem, no total, 350 empregos com carteira assinada.

Plano de negócios

Quem bate na porta da Fundação sabe que não terá apoio para projetos que não sejam lucrativos ou, no mínimo, possam se sustentar. Como exigir, porém, esse tipo de proposta de entidades como a Associação de Pais e Amigos de Excepcionais, que vivem a agonia diária da sobrevivência e da necessidade de amparar quase três centenas de crianças com variados tipos de deficiência mental? Pois nem mesmo a APAE e a sua diretora Vânia Lamas escaparam dessa exigência, aparentemente absurda para quem não sabe, sequer, se estará funcionando no dia seguinte.

Aos olhos da professora, tudo aquilo parecia um monumental delírio. Mas, depois de demoradas reuniões e de sucessivas pesquisas de mercado, técnicos e professores decidiram que a entidade filantrópica iria montar um projeto para a constituição de uma fábrica de vassouras a partir de garrafas vazias de embalagem PET, dando utilidade a esse plástico que emporcalha o ambiente brasileiro. O projeto estava amparado por um documento de mais de 10 páginas, com completas avaliações técnicas e mercadológicas do negócio. Confirmada sua viabilidade econômica, voluntários surgiram de toda parte para construir as máquinas para a fábrica que, rapidamente, tornou-se um sucesso comercial, produzindo 900 vassouras por mês, vendidas cada uma a R$5,00 reais pelas crianças que possuem deficiências leves, como surdez.

A receita bruta mensal é de R$ 4,5 mil, mas os custos dos insumos não passam de R$500,00 admite, aparentemente constrangida, a diretora por estar comercializando um produto com margem tão elevada. O dinheiro, naturalmente, não é suficiente para bancar todas as despesas da entidade com seus 52 professores e funcionários. Mas sustenta os novos projetos, como as salas de pinturas e trabalhos manuais recém-inauguradas e, definitivamente, acabou com as solicitações de caridade, que constrangem tanto quem dá quanto quem pede.

Nesta semana, a diretora Vânia voltará à Fundação para apresentar um detalhado plano de expansão da fábrica que funciona há mais de um ano e que, agora, pretende alcançar consumidores de outros municípios da região. Para alcançar esse objetivo a professora pretende, mais uma vez, contar com recursos especiais do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Da mesma forma que o documento anterior, o plano de negócio da APAE é minucioso, incluindo a descrição das necessidades dos clientes (produto de qualidade e de baixo custo), as formas de atendimento (direto ou através de distribuidores) e locais de venda (vendas diretas, em supermercados ou pelos alunos e pais). Também são detalhados os aspectos do mercado, o perfil da clientela e dos fornecedores, análise da concorrência, planos de marketing, estratégia de preço e o cronograma de obras. "Estamos felizes, pois estamos aprendendo a realizar nossos sonhos e identificar aqueles que são viáveis", diz a diretora.

Situação semelhante viveu o Grêmio Recreativo de Aposentados e Pensionistas, clube de lazer de ex-funcionários Acesita. Há alguns anos, seus diretores bateram à porta da fundação exigindo, em nome de solidariedade entre velhos companheiros, que a entidade reconstruísse a piscina do clube. A alegação era a de que a associação não dispunha de recursos, já que nada cobrava de seus poucos associados. Salles, é claro, refugou a proposta. Considerou inconcebível o clube abrigar poucas dezenas de associados, sabendo-se da existência de quase nove mil aposentados da usina.

Hoje, quase três anos depois, o clube exibe mais de seis mil associados, todos pagando mensalidade de R$17,00. A piscina foi reconstruída, a sede social recebeu cobertura nova e, dentro de duas semanas, novos vestiários e saunas serão entregues aos usuários. "Caso ainda haja dinheiro disponível, iremos construir outra piscina e um campo de futebol com iluminação", afirma Adelson Signorelli, o diretor de eventos da agremiação.

Salles não se surpreende com os bons resultados apresentados tanto pelas entidades filantrópicas quanto pelas novas indústrias do município. Para ele, tudo decorre de um planejamento bem feito e da exata avaliação das possibilidades do mercado. "Caso elas cumprissem todos esses estudos, as novas empresas não sucumbiriam facilmente às asperezas do mercado." No momento, o engenheiro, que passou 27 anos na empresa como gerente de desenvolvimento de pessoal, está com sua atenção voltada para o fortalecimento de um consórcio de exportação, criado para ampliar os horizontes comerciais das novas indústrias instaladas no município, todas operando com aço inoxidável e que comercializam mais de 90% da produção além dos limites do município.