Título: O que é que a economia peruana tem?
Autor: Klaus, Kleber
Fonte: Gazeta Mercantil, 11/04/2008, Editoriais, p. A2

Muita gente estranhou que o Peru tenha recebido, no dia 3 deste mês, a classificação de grau de investimento da Fitch Ratings , passando à frente do Brasil na corrida. É possível que outras agências de avaliação de risco façam o mesmo. O que se noticiou foi que a economia peruana cresceu 9% no ano passado, mas tudo indica que não se trata de vôo de galinha ou, na inevitável comparação, de peru. Parece coisa de condor, pois a economia do país vizinho vem crescendo consistentemente há nove anos e não se prevê uma freada brusca. Com base nos dados de janeiro, a expansão anualizada do PIB é de 10%. Forte exportador de commodities, com grandes riquezas minerais, o Peru tem recebido um volume recorde de investimentos em mineração, petróleo, gás, indústria e infra-estrutura. Lá estão, por sinal, as brasileiras Petrobras, Votorantim Metais, Cia. Vale do Rio Doce e Camargo Corrêa. Sob o aspecto externo, guardadas as diferenças entre o tamanho das duas economias, a situação do Peru e do Brasil é muito semelhante. O Peru também pagou o que devia ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e ao Clube de Paris e resgatou os bônus Brady, tornando-se credor líquido internacional. Suas reservas líquidas chegaram a US$ 33,628 bilhões em abril deste ano, segundo o Banco Central de Reserva del Perú (BCRP), quase o dobro do saldo de sua dívida externa, estimada em US$ 17,4 bilhões em 2008. O Brasil tem reservas de US$ 195,26 bilhões, total suficiente para cobrir 16 meses de importações, e esta é, aproximadamente, a proporção das reservas do Peru. O dólar também se desvalorizou bastante diante da moeda peruana, o sol (15,27% nos 12 meses até abril) , embora em proporção um pouco menor que em relação ao real (16,78% no mesmo período). E, como o Banco Central (BC) do Brasil, o BCRP também intervém no mercado para sustentar a cotação da moeda. De acordo com informe do BCRP de 10 de abril, a instituição comprou US$ 34 milhões no dia anterior no mercado de câmbio. Também com relação às contas públicas, o quadro não é muito divergente. No trabalho "A economia peruana e o desafio do crescimento com inclusão social" (revista DEP, n 7), o autor, Enrique Cornejo Ramírez, afirma que o déficit que ele chama de estrutural do setor público não-financeiro era calculado em 1,8% em 2007. No Brasil, o déficit, que chamamos de nominal do setor público, foi de 2,07% nos 12 meses terminados em fevereiro. Onde a condução da política econômica dos dois países mostra menos convergência é no combate à inflação. Como aconteceu aqui, o Peru também teve seus anos de inflação destrambelhada de quatro dígitos. Mas conseguiu dominá-la com imensos sacrifícios e, no período 2000/2007, registrou a inflação média mais baixa da América Latina (2,1%). Nos últimos 12 meses, a inflação peruana bateu em 5,55%, em razão direta da alta dos alimentos, cuja taxa acumulada no período chegou a 9,02%. Também no Brasil, o aumento dos preços dos alimentos teve grande peso: (11,2%) no período anual até março. A inflação, medida pelo IPCA, ficou em 4,73%, abaixo da peruana, mas acima do centro da meta do governo (4,5%). No Peru, com o aumento do emprego e de renda, a demanda também estourou, concentrada, principalmente, nas vendas de produtos eletroeletrônicos e materiais de construção. Mas há confiança na estabilidade. As autoridades monetárias peruanas consideram que a pressão sobre a inflação é devida a fatores sazonais. O BCRP trabalha com o conceito de inflação subjacente, ou seja, com a tendência da inflação, desconsiderando fatores sazonais ou passageiros. Assim, a inflação projetada é de 3,59% este ano. A taxa básica de juros foi elevada três vezes desde julho do ano passado .Passou de 4,5% para 5,25% ao ano, ou seja, é levemente negativa com relação à taxa de inflação corrente. kicker: Já com grau de investimento, o Peru confia na estabilidade, apesar da alta da inflação (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 2) KLAUS KLEBER* - Coordenador de Opinião.E-mail: kkleber@gazetamercantil.com.br)

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