Título: Por que não ficamos com a Telebrás?
Autor: Nicoletta, Costabile
Fonte: Gazeta Mercantil, 14/04/2008, Editoriais, p. A2

Na manhã de 29 de julho de 1998, Virgílio Freire, então presidente da subsidiária brasileira da fabricante norte-americana de equipamentos para telecomunicações Lucent, tinha perto de si um rádio a pilha que quase colava no ouvido, tal qual fazem os fanáticos torcedores de futebol. Não era seu time do coração que jogava, a internet engatinhava no País, assim como a televisão por assinatura. Em vez de gols, ele queria saber para quem se batia o martelo na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro (BVRJ). Tratava-se da privatização do Sistema Telebrás. Por meio de 12 leilões consecutivos, vendeu-se o controle de três holdings de telefonia fixa, uma de longa distância e oito de telefonia celular, naquela que foi considerada a maior operação de privatização de um bloco de controle já realizada no mundo. Com a desestatização, o governo federal arrecadou R$ 22 bilhões, um ágio de 63% sobre o preço mínimo estipulado, de acordo com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), gestor do processo. Em grande parte de sua vida profissional, Freire trabalhou no Sistema Telebrás, no qual teve importante participação nos projetos de ampliação da oferta de linhas telefônicas à população. Mesmo assim, era um entusiasta da privatização. Tanto que, em maio de 1999, foi designado presidente da Vésper, empresa-espelho criada para concorrer com a Telefônica e a Telemar - duas companhias que, no leilão realizado em 1998, ficaram com a concessão do serviço de telefonia fixa em São Paulo e nos demais estados do Sudeste, Norte e Nordeste, respectivamente. A Vésper não foi bem-sucedida e acabou sendo incorporada pela Embratel, operadora que oferece ligações de longa distância pertencente ao grupo mexicano Telmex. "Hoje, olhando em retrospecto, estou convencido de que, se a Telebrás tivesse naquela época a mesma liberdade orçamentária que têm a Petrobras e o Banco do Brasil, não seríamos forçados a privatizá-la", diz Freire, hoje um requisitado consultor no ramo. "Se a Telebrás, que era altamente lucrativa, pretendesse melhorar o serviço e atender a um número maior de clientes, investindo na expansão da rede, por exemplo, US$ 7 bilhões, o Congresso reduzia esse valor para, por exemplo, US$ 2 bilhões." Em razão disso, segundo Freire, a Telebrás ficou com fama de ineficiente, burocrática, lenta, incompetente. "Nenhum desses qualificativos é verdadeiro", protesta o consultor. "Os funcionários da Telebrás eram tão competentes ou mais do que os das operadoras estrangeiras que compraram parte da Telebrás. Até hoje, amigos que trabalham nas operadoras européias e americanas que vieram para cá me dizem de seu assombro com a incompetência dos estrangeiros, seu desconhecimento do mercado brasileiro e do setor de telecomunicações." No ponto de vista de Freire, se a Telebrás tivesse tido liberdade de investimento, seria hoje o que é a Petrobras, com atendimento pleno da demanda e presença no exterior. Curiosamente, os argumentos em favor da arrastada fusão das telefônicas Oi (ex-Telemar) com a Brasil Telecom (BrT) enaltecem futuros atributos que a nova empresa teria, como porte para concorrer com os colossais grupos estrangeiros. Como ambas as companhias são de capital nacional, muitas vezes recorre-se a um tipo de capitalismo patriótico para saudar a união, que para ocorrer de fato carece de uma decisão de direito: a alteração da regulamentação que impede a fusão de concessionárias de telefonia fixa. É difícil crer que o objetivo dos acionistas da BrT e da Oi seja tão cívico a ponto de colocarem o interesse do País acima dos seus, montando uma empresa forte o suficiente para estabelecer uma competição com suas concorrentes que baixe os preços e melhore a qualidade dos serviços de telecomunicações que todas oferecem no Brasil. kicker: É difícil crer que o objetivo dos acionistas da Brasil Telecom e da Oi seja tão cívico (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 2) COSTÁBILE NICOLETTA* - Secretário de RedaçãoE-mail: costabile@gazetamercantil.com.br)