Título: Lugo diz ter esperança em renegociar contrato de Itaipu
Autor:
Fonte: Gazeta Mercantil, 22/04/2008, Internacional, p. A12

Assunção e Acra, 22 de Abril de 2008 - O presidente eleito do Paraguai, Fernando Lugo, se disse ontem "esperançoso" de conseguir a renegociação de um tratado energético com o Brasil, que permitiria ao país vizinho obter mais receita para combater a pobreza. Além disso, o ex-bispo católico, que deixou a batina no ano passado para se dedicar à política, prometeu em uma entrevista à Reuters que não lançará uma "caça às bruxas" contra o Partido Colorado (centro-direita), a quem derrotou nas eleições de domingo passado para tirá-lo do poder após 61 anos de governo. Com 92% das urnas apuradas, Lugo, 56 anos, venceu a candidata governista Blanca Ovelar com 10 pontos percentuais de vantagem, segundo o Tribunal Superior de Justiça Eleitoral. Blanca reconheceu a derrota. (Ver tabela ao lado) O ex-bispo disse esperar chegar a um acordo com o vizinho e sócio na hidroelétrica Itaipu para obter melhores preços pela energia que o Paraguai vende, o que deixa o governo brasileiro preocupado. "É uma porta que se abriu de diálogo, de conversação depois de tantos anos e isso nos alegra e nos enche de esperança", disse Lugo. Resposta de Lula O presidente Luiz Inácio Lula da Silva garantiu que Brasil não vai rever o tratado de Itaipu ¿ uma das principais bandeiras de campanha do ex-bispo católico. "Não muda o tratado", afirmou Lula ontem, pouco antes de embarcar para o Brasil. Lula minimizou a importância do tema, frisando que a agenda Brasil-Paraguai vai além da sociedade na hidrelétrica. "Nestes cinco anos de governo, tive umas 20 reuniões com o Paraguai. São muitos os temas; não é só a questão de Itaipu. A nossa fronteira, que é muito grande e envolve vários estados, também a questão da Ciudad Del Leste, de investimentos. Temos muito para continuar conversando com o Paraguai", disse o presidente brasileiro. Indagado sobre o que representava a vitória de mais um líder de esquerda na América Latina, Lula disse que Lugo não é esquerdista. Também evitou compara-lo ao presidente boliviano, Evo Morales, que se elegeu com plataforma semelhante a de Fernando Lugo. Para Lula, a eleição de Lugo representa a vitória da democracia. "Nós temos que valorizar as pessoas que são eleitas como resultado da democracia. O Lugo pelejou muito tempo, batalhou muito tempo, venceu uma eleição muito disputada, reconhecida já por todos os outros candidatos", ponderou o presidente, ressaltando a lisura do processo eleitoral paraguaio. Durante a campanha eleitoral, Lugo também prometeu renegociar um acordo similar que o Paraguai mantém com a Argentina na central hidroelétrica binacional Yacyretá. Lugo recebeu ligação telefônica dos presidentes de Chile, Argentina, Uruguai, Venezuela, Nicarágua e Bolívia e disse que sua primeira viagem ao exterior vai passar pela região. "A mim, particularmente, interessa (visitar) a Bolívia, porque historicamente não tivemos relações muito próximas com a Bolívia. Estamos mais acostumados com Brasil e Argentina. Creio que com a Bolívia chegou o momento de ter relações mais profundas com nosso irmão e vizinho país", disse o ex-bispo. A quatro meses de assumir como presidente, Lugo assegurou que não espera oposição radical que possa terminar com a crise social, como temem alguns analistas. O ex-bispo deve tomar posse no dia 15 de agosto. "Acreditamos que o Partido Colorado vai fazer uma oposição inteligente, racional. O nosso governo não vai fazer uma caça às bruxas, não vai ser de perseguição que não seja da busca pelo consenso, pela harmonia", afirmou. Ritmo das mudanças A vitória de Lugo no Paraguai aponta para um amadurecimento da democracia na América Latina, mas o Partido Colorado, que perdeu a disputa, talvez dite o ritmo das eventuais mudanças. O ex-bispo descreve a si mesmo como um político independente e manteve-se afastado dos dirigentes esquerdistas mais radicais da América Latina, como Hugo Chávez, da Venezuela, e Evo Morales, da Bolívia. No entanto, ele é visto como um aliado em potencial dos presidentes esquerdistas mais moderados da região, os quais rejeitaram tanto as ditaduras de direita, quanto os governos extremamente corruptos e as rebeliões marxistas tão comuns no final do Século XX. "Não sabemos quanto Lugo mudará o governo, ou quando conseguirá mudar", afirmou Mark Weisbrot, do Centro para Pesquisas Econômicas e Políticas, um instituto dos EUA, acrescentou, observando que a poderosa máquina do Partido Colorado se encontra presente em todos os níveis do governo. (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 12)(Reuters e Agência Brasil)