Título: Reforma tributária e o imperativo da ética
Autor: Fernandes, Benedito
Fonte: Gazeta Mercantil, 25/04/2008, Opiniao, p. A3

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25 de Abril de 2008 - Neste momento em que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da reforma tributária tramita no Congresso Nacional, é muito importante adequá-la à meta do crescimento econômico, desonerando a produção na medida do possível. Para isto, entretanto e antes de tudo, torna-se imprescindível entendê-la como oportunidade de mitigar um dos mais graves problemas brasileiros, que é a improbidade no setor público. O raciocínio é lógico e simples. Não haverá política fiscal capaz de conciliar a receita de impostos com as necessidades de custeio e investimento dos governos nos três níveis, enquanto parte dos recursos esvaírem-se nos ralos da corrupção. Exemplo lamentável dessa cultura arraigada no universo estatal brasileiro acaba de ser comprovado pela 24 edição do Programa de Fiscalização de Municípios, da Controladoria-Geral da União (CGU). O organismo identificou suspeita de fraudes em licitações de 55 municípios, dentre os 60 analisados nessa etapa do trabalho. Ou seja, a amostragem revela que mais de 90% das prefeituras pesquisadas estavam incorrendo em equívocos. Esses dados são expressivos e preocupantes, pois a perspectiva do ponto de vista percentual no universo de aproximadamente seis mil municípios no País delineia um cenário muito grave. Mais ainda, se considerado o fato de as concorrências referirem-se a elevadas despesas, como obras de escolas, centros de saúde, de abastecimento de água, serviços de esgoto, asfalto e contratação de serviços diversos. É preciso entender que a lisura nesses processos significaria demanda menor de recursos e, portanto, menos arrecadação tributária. Ilimitado apetite arrecadador, improbidade e irresponsabilidade fiscal configuram o mais perverso algoz da economia brasileira na época em que vivemos. Diante da seriedade do problema, é necessário que a mídia dê cada vez mais transparência às transgressões e a sociedade enxergue com bons olhos o controle intenso dos organismos estatais e da aplicação dos recursos público. Felizmente, já existe um processo crescente de maturidade nesse sentido, tanto por parte das instituições como da comunidade brasileira. E isso é muito positivo, principalmente para quem faz tudo dentro da lei. Referência de correção nos procedimentos, embora não seja mais do que a mera obrigação dos gestores públicos, configura-se como importante fator disseminador de uma nova cultura político-administrativa. Transparência é a palavra-chave para o sucesso dessas ações de saneamento do setor público brasileiro. União, estados e municípios têm a obrigação de gerir seus orçamentos com muita cautela, parcimônia e responsabilidade. No caso específico das concorrências, é inexorável respeitar, rigorosamente, o que está definido na Lei Federal de Licitações 8.666, de 21 de junho de 1993. Este é o caminho para a aprovação das contas públicas, pelos organismos competentes de fiscalização e auditoria e também pela sociedade, cujo referendo é essencial nas democracias. Não há mérito algum em honrar, na administração pública, os compromissos inerentes aos cargos eletivos e, sobretudo, a confiança depositada em cada voto dos cidadãos. Realizar todos os processos dentro da lei é uma conduta obrigatória de respeito à população. A partir desse básico pressuposto, configura-se com clareza a lição de casa que todas as prefeituras, câmaras municipais e órgãos federais e estaduais têm a obrigação de fazer. Aliás, os brasileiros irão novamente às urnas este ano, para eleger prefeitos e vereadores. É mais uma oportunidade de melhorarmos o perfil das municipalidades, tendo como principal parâmetro a honestidade e o compromisso daqueles que disputam a preferência do eleitorado. Reforma tributária eficaz somente poderá ser feita se for possível orçar quanto, de fato, União, estados e municípios precisam para cumprir todas as suas obrigações. No entanto, esse diagnóstico deve ser preciso e realista. Ou seja, não pode estar contaminado pelo vírus da improbidade, que exige cada vez mais imposto e consome volumes sempre maiores do dinheiro que poderia fomentar a multiplicação de empresas, empregos e distribuição de renda, antecipando o nosso desenvolvimento. kicker: A CGV levantou supeitas de fraudes em 55 municípios de um grupo de 60 (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 3) BENEDITO FERNANDES* - Prefeito de Santana do Parnaíba (SP), um dos cinco municípios brasileiros, único de São Paulo, aprovados pelo Programa de Fiscalização de Municípios da Controladoria- Geral da União (CGU))