Título: BC modera o arrocho
Autor: Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 21/04/2011, Economia, p. 12

Apesar de a medição prévia do Índice de Preços ao Consumidor Amplo, o IPCA-15, ter indicado que a inflação anualizada já bateu no topo da meta (de 6,5%) em abril, a informação não foi suficiente para mudar a aposta do Banco Central sobre o aumento dos juros básicos da economia, a Selic. A autoridade monetária contrariou o mercado financeiro e subiu, ontem, a taxa em 0,25 ponto percentual, elevando-a para 12% ao ano. Com o ajuste, a instituição dá prosseguimento à estratégia de controlar a alta dos preços com um aperto monetário menor, mas acompanhado de medidas macroprudenciais (alternativas), a exemplo do aumento do Imposto de Operações Financeiras (IOF) para conter o consumo. Para os analistas, o BC assumiu o risco de enfrentar uma nova piora nas expectativas inflacionárias.

O Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu elevar a taxa sem indicação de alta ou baixa. Foram cinco votos a favor de um aumento de 0,25 ponto percentual e dois por um arrocho de 0,50 ponto. A instituição considerou o aperto suficiente para levar a inflação para o centro da meta, de 4,5%, em 2012.

¿Considerando o balanço de riscos para a inflação, o ritmo ainda incerto de moderação da atividade doméstica, bem como a complexidade que ora envolve o ambiente internacional, o Comitê entende que, neste momento, a implementação de ajustes das condições monetárias por um período suficientemente prolongado é a estratégia mais adequada¿, afirmou o BC, confirmando a tese de que decidiu atacar a inflação de maneira gradual. A estratégia será prolongar o ciclo por mais tempo do que o esperado, provavelmente com novas altas de 0,25 ponto.

Gustavo Loyola, ex-presidente do BC e economista-chefe da Tendências Consultoria, queixa-se de que o Copom está apostando demais em um cenário que pode não se concretizar. Para o economista, o ajuste deveria ter sido de 0,50 ponto percentual. ¿Ele (o BC) está dando sinais de que está satisfeito com a atual trajetória da economia baseado num cenário complicado¿, alertou. A seu ver, a autoridade monetária vem assumindo riscos demais e até se enganando em suas previsões.

Em jogo Com a inflação em ritmo forte e um aperto mais moderado na Selic, o objetivo de levar a carestia para a meta de 4,5%, em 2012, pode estar comprometido, alertam analistas. ¿A credibilidade do BC também será afetada. As expectativas vão continuar a piorar¿, afirmou Homero Guizzo, economista da LCA Consultores. Para Márcio Cardoso, diretor da Título Corretora de Valores, a única diferença entre 0,25 e 0,50 ponto percentual de aperto monetário está apenas na questão da credibilidade da autoridade monetária: ¿Qualquer ajuste desses já não afeta mais a demanda¿.

A decisão do BC seguiu, contudo, as previsões dos economistas que mais acertam as projeções no Boletim Focus ¿ levantamento semanal no qual a autoridade monetária ouve as expectativas de mais de 100 analistas. Octavio de Barros, economista-chefe do Bradesco, pondera que com um ajuste de 0,25 ponto percentual, o BC dá continuidade ao ciclo de aperto monetário, mas reduz o ritmo de elevação comparado ao observado nas reuniões do Copom de janeiro e de março, quando as altas foram de 0,50 ponto percentual. Ele argumentou que o aperto de ontem se justificou pelos ¿sinais de moderação em curso, pelo ritmo de expansão da atividade econômica e pela contribuição da apreciação cambial superior ao esperado¿.

Para Eduardo Velho, economista-chefe da Prosper Corretora, o BC está cumprindo fielmente o que sinalizou em seus documentos. A seu ver, o Copom levou em conta que as medidas macroprudenciais, somadas aos ajustes já promovidos na Selic, são suficientes para conter a inflação, a ponto de levá-la para o centro da meta em 2012. Os impactos dessas medidas, porém, serão sentidos mais fortemente no segundo semestre deste ano. ¿Os efeitos dos choques de preços das commodities, do componente inercial da inflação e também do crescimento da demanda de 2010 serão dissipados gradualmente com o ciclo de alta da Selic e pelas medidas prudenciais¿, argumentou Velho.

¿O BC quer também recuperar a credibilidade dos comunicados, perdida parcialmente em 2010¿, justificou Velho, ao referir-se ao período em que Henrique Meirelles estava à frente da instituição. Para o economista, já em março de 2010, diante dos preços em ascensão, o BC deveria ter subido os juros. Mas, na sua avaliação, como Meirelles desejava alçar voos políticos, o ex-presidente teria hesitado em elevar a Selic naquela época, deixando a herança ¿ uma carestia em escalada e a difícil missão de equilibrar juros e câmbio ¿ para Alexandre Tombini, o atual comandante da autoridade monetária.

Dificuldade Na avaliação de economistas, a estratégia de Tombini é perigosa, mas consistente. ¿Tem chances de dar certo¿, ponderou Guizzo. Ainda assim, analistas calculam que, em agosto, a inflação em 12 meses deverá chegar ao nível de 7,5%, o que aumentaria a dificuldade para conter a carestia e reduzi-la a 4,5% em 2012. Com a Selic ajustada para 12% ao ano, o Brasil continua entre as posições mais altas dos juros no mundo. Segundo o economista Jason Vieira, da corretora Cruzeiro do Sul, o país perde apenas para a Venezuela, que tem uma taxa de 18,24% ao ano.

Apesar de um arrocho menor, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) considerou a decisão do Copom ¿inadequada¿ por concentrar apenas na política monetária o esforço de combate à inflação. Para os empresários, a prioridade deveria ser o ajuste fiscal ¿ corte de gastos públicos.

Dólar recua a R$ 1,571 No início dos negócios, ontem, os investidores acreditavam que o Banco Central elevaria a taxa básica de juros (Selic) em 0,50 ponto percentual. Isso tenderia a aumentar o ingresso líquido de recursos estrangeiros no país, que já alcançou US$ 36,2 bilhões neste ano, resultado 48,6% superior a todo o volume registrado no ano passado. Diante dessa expectativa, o dólar abriu o dia cotado a R$ 1,563, com queda de 0,82%. À medida que as apostas migraram para uma alta de 0,25 ponto, nível escolhido pelo BC à noite, a moeda norte-americana se valorizou um pouco. Mas, ainda assim, encerrou em R$ 1,571, recuando 0,32%. Foi o menor valor desde 4 de agosto de 2008, apenas R$ 0,10 acima da mínima em 10 anos. No mercado acionário, a Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa) subiu 1,36%, atingindo 67.058 pontos.