Título: Pecuária de corte é a atividade menos produtiva do campo
Autor: Baldi, Neila
Fonte: Gazeta Mercantil, 05/05/2008, Empresas e Negócios, p. C1
São Paulo, 5 de Maio de 2008 - Todo o rebanho bovino do mundo caberia nos 176,4 milhões de hectares de pastagem do Brasil se o País aumentasse a produtividade da pecuária de corte. A atividade é hoje a que tem o maior déficit de tecnologia no campo, segundo estudo da Scot Consultoria. O levantamento mostra que a diferença de produtividade entre a melhor fazenda de gado de corte do País e a "pior" é de 70%. Na atividade leiteira, o índice cai para 40%. E na agricultura é bem pequeno: 20% para a cana-de-açúcar e 10% para a soja. "No caso da pecuária de corte o intervalo é muito grande. Isso significa que o potencial de produção da pecuária brasileira está apenas no começo", afirma o diretor da Scot Consultoria, Alcides Torres. Segundo ele, a falta de recursos para investimento é que provocam esta defasagem. Dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento mostram que, em média, a pecuária fica com apenas 20% dos recursos destinado ao custeio das atividades do campo - os valores referentes aos investimentos não foram fornecidos. "Não há, não houve, não existe nenhuma política de fomento de estímulo à produção pecuária", diz Torres. Segundo o levantamento da Scot Consultoria, a taxa de lotação média da pecuária brasileira hoje é de 0,8 unidade animal por hectare - cada unidade tem 450 quilos de peso vivo. Torres acredita que, em um horizonte próximo, diante dos resultados positivos da atividade no último ano, o País já possa incorporar tecnologia. Se chegasse a um índice, por exemplo, de 1,2 unidades animais por hectare, o Brasil teria um rebanho de 301,5 milhões de animais ou 30% do mundo (segundo dos dados de Departamento de Agricultura dos Estados Unidos). Pelo levantamento da consultoria, com quatro unidades animais por hectare, todo o rebanho mundial caberia na superfície de pastagem do Brasil, sem necessidade de incorporação de novas ou de desmatamento. O diretor acrescenta, no entanto, que este universo não será sentido em curto prazo - dois a três anos - por causa do ciclo da pecuária. O setor passou por alguns anos com os preços do boi gordo em baixa e, em virtude disso, houve descarte de matrizes. Hoje, a disponibilidade de bezerro e de fêmeas é baixa. Assim, segundo ele, nos próximos anos, até que haja uma "harmonia" nesta oferta, a produtividade estará em baixa. Mas, na avaliação do diretor da AgraFNP, José Vicente Ferraz, apesar de os investimentos demorarem um ciclo completo para serem sentidos - entre dois anos e meio e três anos - a previsão é que, já no ano que vem, haja um boom de dispêndio de dinheiro dos pecuaristas visando a melhoria da produtividade - tanto na compra de genética quanto em ações "simples", como a melhoria da pastagem. "Tudo pode ser feito sem necessidade de aumentar a área, é crescimento vertical", afirma. De acordo com o diretor da consultoria, a incorporação de tecnologia não necessariamente passa pela necessidade de o País mudar seu sistema produtivo e passar a usar, por exemplo, o confinamento. Existem muitas outras ferramentas que podem elevar a produtividade, como a divisão do pasto, a suplementação mineral , a correção do solo, e o manejo rotacionado de capim. Ferraz, lembra que as realidades de produção são muito distintas em todo o País. "A pecuária gaúcha não tem nada a ver com a do Centro-Oeste, que não também não se assemelha à do Nordeste", afirma. Neste sentido, segundo ele, a incorporação da tecnologia depende da região. Segundo ele, por exemplo, em Mato Grosso e no Pará a simples divisão do pasto já traria muitos benefícios. Os analistas não sabem estimar os custos do emprego de novas tecnologias, nem quanto o País precisaria investir para chegar a uma produtividade mais elevada. "Mas, com certeza, o benefício é maior que o custo", afirma Torres. Se para ele parte da "defasagem tecnológica" da pecuária brasileira tem a ver com o financiamento da atividade, para Ferraz, está correlacionada com a rentabilidade do setor. "O nível tecnológico de qualquer atividade é determinado pela relação custo-benefício. O produtor precisa ver lucro para querer aumentar a produtividade", acredita. Mas ele acrescenta que se houvesse maior disponibilidade de recursos, o produtor de gado de corte teria maiores condições que o agricultor por ter menos endividamento. Torres lembra também que é preciso uma mudança de cultura não só dos bancos, para ofertar mais recursos, mas também do produtor, de pensar os custos de sua atividade em hectare e não em arrobas. "É agricultura de capim", conclui Torres. O diretor da Scot Consultoria lembra também que, se hoje o Brasil fosse tão eficiente, não haveria onde colocar toda a oferta de carne e os preços cairiam. Mas acrescenta que o consumo mundial de proteína animal tem crescido e, investindo em tecnologia, o País pode acompanhar a demanda.(Gazeta Mercantil/Caderno C - Pág. 1)(Neila Baldi)