Título: Auditor eleito por pares pode ser ministro do TCU
Autor: Couto, Bruna Mara
Fonte: Correio Braziliense, 22/04/2011, Opinião, p. 11

Presidente da União dos Auditores Federais de Controle Externo (Auditar) O Tribunal de Contas da União (TCU) vive momento inédito em seus 118 anos de existência. A partir do processo Indique Seu Candidato a Ministro, os auditores federais de controle externo, servidores do TCU que realizam as auditorias e as fiscalizações, escolheram para indicação à Câmara dos Deputados o nome do auditor e ex-secretário-geral de Controle Externo do TCU Rosendo Severo como sugestão para ocupar o lugar do ministro Ubiratan Aguiar, que se aposentará em meados deste ano. O candidato da categoria tem18 anos de experiência e foi eleito pelos pares com 43,6% dos votos.

Tradicionalmente, seis dos nove ministros do TCU são escolhidos entre os parlamentares sem a participação do corpo técnico da casa. No entanto, a iniciativa dos auditores encontra respaldo na Constituição, que estabelece a competência exclusiva do Congresso Nacional para escolher 2/3 dos ministros do TCU, sem a exigência de que os indicados sejam deputados ou senadores. Pode-se perguntar qual a legitimidade de servidores opinarem sobre essa indicação. Mas por que não? São os auditores, todos concursados, que levam a cabo a fiscalização da aplicação dos recursos públicos federais, com a responsabilidade de propor que determinadas contas sejam publicamente julgadas como regulares ou irregulares, ou eventualmente, que um gestor seja responsabilizado e condenado. O parecer técnico e a proposta de encaminhamento emitidos pelo auditor subsidiam o julgamento dos ministros.

A proposta dos auditores tem como referência o modelo dos ministérios públicos da União e dos estados, cuja previsão constitucional e regulamentação permitem eleição e formação de lista tríplice para o cargo de procurador-geral, e lista sêxtupla para determinadas vagas da magistratura. Até pouco tempo atrás, apenas o procurador-geral não era escolhido dessa forma, mas o presidente Lula, em seu primeiro mandato, passou a nomear o candidato mais votado nas eleições promovidas pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). A prática vem se repetindo e é digna de aplausos.

Outras iniciativas têm surgido mesmo sem previsão legal. O Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil (Sindifisco Nacional) realizou, por duas vezes, eleição com formação de lista tríplice para escolha do secretário da Receita Federal, mas não chegou ao êxito. A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) empreendeu processo eleitoral com sugestão de magistrados à vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), proposta que tampouco obteve sucesso. Na Advocacia-Geral da União (AGU), ação semelhante partiu do então dirigente máximo do órgão, Dias Toffoli, para escolha dos chefes das procuradorias federais. Entretanto, seu sucessor, Luis Inácio Adams, retomou as livres escolhas.

A Constituição garante ao menos dois integrantes de origem técnica entre os nove ministros do TCU. Um desses membros vem do Ministério Público de Contas e o outro é escolhido entre os ministros substitutos, cargos providos mediante concurso público. Dos outros sete ministros, seis são de livre escolha do Congresso Nacional e um de livre escolha do presidente da República. Diante desse critério, percebe-se que a grande maioria dos cargos de livre escolha tem sido preenchida por egressos da classe política, fator que provoca desequilíbrio e demasiada homogeneização na composição dos colegiados.

A heterogeneidade na composição de colegiados de julgadores é importante para que os julgamentos não resultem de apenas uma visão de mundo. Nota-se esse cuidado nos tribunais do Poder Judiciário, inclusive no STF, cuja corte é formada por magistrados, membros do Ministério Público e advogados. Nos tribunais de contas, a diversidade é tímida. Se a pouca heterogeneidade já é indesejada em um tribunal judiciário, que cuida da aplicação do direito ao caso concreto, o que dizer de um tribunal de contas, que julga processos sob a ótica da legalidade, da legitimidade e da economicidade em decorrência de auditorias de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial?

Note-se que a composição dos tribunais judiciários conta sempre com a participação dos agentes que atuam nos processos submetidos a julgamento, como membros dos ministérios públicos, advogados e magistrados de instâncias inferiores. Isso não ocorre nos tribunais de contas, pois nenhum assento de seus colegiados é reservado ou já foi preenchido por um auditor de carreira indicado por seus pares.