Título: O risco de fazer oposição com telhado de vidro
Autor: Mendonça, Antonio Penteado
Fonte: Gazeta Mercantil, 07/05/2008, Opinião, p. A3

7 de Maio de 2008 - Ao longo dos últimos anos o DEM aprendeu ser oposição, mudou de nome e ganhou consistência política, ainda que bastante distante das posições do PT e PSDB no comando de um número expressivo de administrações fortes. O PT é governo. Controla a máquina federal, apoiado no presidente da República, líder incontestável do partido e único nome de expressão que eles têm para oferecer no cenário político nacional. O PSDB deveria ser oposição, mas não é. Ou pelo menos invariavelmente não sabe ser, tolhido por dúvidas filosóficas e conceituais terríveis que o aproximam bastante do ideário petista e o impede de se posicionar efetivamente contra as ações do governo. Pior do que isso, sistematicamente questões internas ou jogadas para as próximas eleições imobilizam o partido, fazendo com que se perca em discussões intermináveis, sem qualquer utilidade prática, exceto dar ao PT as ferramentas que necessita para desautorizar a postura do PSDB perante a população. Na contramão deste cenário, o DEM evoluiu de PFL para Democratas, amadureceu, fez a lição de casa, iniciou um importante projeto de modernização ideológica e de renovação de seus quadros. O resultado pode ser medido pelas palavras do próprio presidente Lula, criticando a atuação do partido na oposição ao seu governo, muito mais incomodado com os democratas do que com os tucanos. É que o partido não tem se eximido de ocupar posições claras, de fazer críticas duras e de apontar desmandos, criticando ferozmente todos os escândalos que quase diariamente pipocam país afora, comprometendo gente do governo, do PT ou próxima do presidente da República com uma constância assustadora. E o DEM tem feito isso de forma eficiente. Na maioria das vezes sem apelar para golpes baixos ou chantagens, trabalhando às claras, com seus filiados falando abertamente, apontando os erros a serem corrigidos, os desmandos a serem punidos e marcando suas posições para uma população que começa a se habituar com eles e a identificá-los como o verdadeiro partido de oposição. Nem poderia ser diferente, na medida em que as duas grandes estrelas do PSDB, os governadores de São Paulo e de Minas Gerais, ambos envolvidos num intrincado jogo de xadrez visando às eleições de 2010, raramente criticam de forma mais dura as ações do governo federal. Neste jogo de cena, o DEM leva os louros da vitória e ganha uma credibilidade até poucos anos atrás inimaginável para um partido com fama de adesista, fosse quem fosse o governo. Entre as poucas grandes administrações que sobram nas mãos dos democratas, a mais importante é sem dúvida a prefeitura da cidade de São Paulo. Maior cidade do País, ela é também um dos maiores orçamentos e importante vitrine para a população como um todo. A prefeitura de São Paulo foi herdada pelo DEM quando o então prefeito José Serra se elegeu governador do estado. O vice-prefeito, por força de um acordo político, era do DEM e, com a saída do governador eleito, assumiu a prefeitura. De lá para cá, com maior ou menor aceitação, não há como se dizer que Gilberto Kassab não esteja fazendo uma boa administração. Ele está, e os resultados podem ser vistos no visual da cidade, limpa de outdoors e cartazes por força de uma lei baixada por ele. Se ao tomar posse, o prefeito era quase que um completo desconhecido, por suas ações como administrador ele vai crescendo entre os eleitores, ao ponto de se ver qualificado para disputar a próxima eleição com chances concretas de vencer e se reeleger prefeito. Para o DEM, esta eleição é crucial. Manter a prefeitura da cidade de São Paulo, além de dar ao partido uma das principais vitrines da administração pública nacional, significa também o reconhecimento pela população da sua capacidade administrativa e do acerto de suas teses. Mas não será uma eleição tranqüila para o partido. Extremamente ligado ao governador do estado, Gilberto Kassab tem em sua equipe nomes de prestígio dentro do PSDB. É aí que começa o primeiro de seus problemas. Parte do PSDB acha que o partido deve ter candidatura própria e não concorda em apoiar o antigo aliado em sua pretensão eleitoral. Vale dizer, seja lá qual for a solução oficial para as pendências internas do PSDB, seus integrantes não estão unidos e isso pode abrir as portas para o segundo problema dos democratas se transformar numa ameaça real aos planos de reeleição de Gilberto Kassab. Com a briga entre os democratas e os tucanos na corrida pela prefeitura paulistana, quem sai ganhando é o PT, cuja candidata, à margem do bate-boca, vai consolidando sua posição, correndo solta dentro de seu eleitorado. Finalmente, o DEM tem um telhado de vidro que será usado contra ele durante a campanha pela cidade de São Paulo: o trânsito. Não importa se na raiz do problema a culpa não seja do prefeito. O fato de ter mais carros do que ruas não será o centro das discussões. A incompetência da CET será jogada na mesa com o peso necessário para transformar o mau humor diário de milhões de pessoas em ferramenta destinada a tirar votos do prefeito. Ou será que alguém se ilude quanto à percepção da população a respeito da ineficiência dos marronzinhos, das mudanças de mão que só servem para parar o que anda pouco, das placas de proibido estacionar que só proíbem quando a rua não tem movimento, ou da falta de sincronização dos semáforos? O prefeito Gilberto Kassab tem um calcanhar-de-aquiles e ele está mais exposto do que seria desejável para começar uma guerra com as conotações que a próxima eleição promete. Ou se faz algo de impacto a respeito ou uma administração reconhecidamente competente corre o riso de ser torpedeada, comprometendo seu desempenho na eleição. kicker: Os democratas incomodam muito mais o governo do PT que os tucanos (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 3) ANTONIO PENTEADO MENDONÇA* - Sócio de Penteado, Mendonça e membro da Academia Paulista de Letras. Próximo artigo do autor em 28 de maio)