Título: Líbia lamenta morte dos jornalistas
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Fonte: Correio Braziliense, 22/04/2011, Mundo, p. 12

O regime do ditador líbio Muamar Kadafi negou envolvimento com a morte de dois jornalistas estrangeiros, vítimas de um ataque com morteiros na cidade de Misrata, controlada por rebeldes, e afirmou estar ¿muito triste¿ com o ocorrido. O fotógrafo e documentarista britânico Tim Hetherington, 40 anos, colaborador da revista Vanity Fair e indicado ao Oscar de 2011, e o norte-americano Chris Hondros, 41, fotojornalista da agência Getty Images, foram atingidos durante bombardeio das forças oficiais. Seus corpos foram levados ontem de Misrata para o reduto rebelde de Benghazi, em um navio a serviço da Organização Internacional de Imigração. A embarcação também retirou cerca de mil refugiados da cidade, sitiada pelas tropas de Kadafi.

¿Estamos realmente tristes com a morte dessas duas pessoas¿, afirmou o porta-voz Musa Ibrahim. ¿Não é responsabilidade de nosso exército. Pedimos a todos os jornalistas que não confiem nesses rebeldes. Se quiserem reportagens, podem pedir um visto para entrar legalmente no país.¿

Em um comunicado divulgado em seu site, a organização Repórteres Sem Fronteiras disse estar ¿em choque e entristecida¿ com a morte dos dois fotógrafos. Outros dois repórteres fotográficos, Michael Brown, da Agência Corbis, e o freelancer Guy Martin, ficaram feridos no mesmo ataque. Os quatro estavam na Rua Trípoli, principal via de Misrata, que se tornou cenário de violento ataque das tropas leais a Kadafi. ¿Essa tragédia expõe novamente o perigo ao qual esses profissionais se submetem ao cobrirem uma guerra, e elevam para quatro o número de jornalistas mortos na Líbia desde o início dos conflitos¿, diz o texto.

Hetherington, morto instantaneamente na explosão de um morteiro, era mais conhecido por seus documentários. Nascido em 1970, ele viveu e trabalhou por oito anos na África Ocidental e foi o único fotógrafo a permanecer atrás das linhas rebeldes durante a guerra civil na Libéria, em 2003. Ele concorreu ao Oscar deste ano com o documentário Restrepo. Com esse trabalho, foi vencedor do Grande Prêmio do Júri no Festival de Cinema de Sundance, em 2010. Hetherington também venceu vários prêmios de fotojornalismo, incluindo o World Press de 2007, com a foto de um soldado norte-americano no Afeganistão.

Hondros morreu algumas horas depois da explosão dos morteiros, em consequência dos ferimentos que sofreu na cabeça. Desde 1990, o fotojornalista trabalhou na cobertura dos principais conflitos mundiais, entre eles os de Kosovo, Angola, Serra Leoa, Líbano, Caxemira, Afeganistão, Palestina, Iraque e Libéria. Assim como Hetherington, ganhou diversos prêmios internacionais.

O primeiro jornalista morto durante os embates na Líbia foi Ali Hassan Al-Jaber, natural do Catar, cinegrafista da rede de televisão Al-Jazira. Ele foi atingido por um tiro durante uma emboscada perto de Benghazi, em 12 de março. O segundo foi Mohamed ¿Mo¿ Al-Nabous, líbio, blogueiro e um dos fundadores da emissora de TV Al-Hurra. Ele foi assassinado por um franco-atirador, em Benghazi, em 19 de março.

Combates O porta-voz do governo líbio anunciou também que o regime está armando civis para combater um possível ataque terrestre da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan, aliança militar liderada pelos EUA). ¿Se a Otan vier a Misrata ou a qualquer cidade líbia, soltaremos o inferno sobre ela. Seremos uma bola de fogo. Será 10 vezes pior que o Iraque¿, ameaçou Ibrahim. As declarações foram feitas um dia depois de a França prometer aos rebeldes líbios que vai intensificar os ataques aéreos sobre as forças de Kadafi e enviar assessores militares a Benghazi ¿ medida adotada também pelo Reino Unido e pela Itália.

Mais cedo, os rebeldes anunciaram estar ganhando terreno no oeste do país, com a conquista de um estratégico posto na fronteira com a Tunísia. Há vários dias, a região é palco de combates ferozes. Segundo a agência oficial Jana, sete civis morreram e 18 ficaram feridos em bombardeios da Otan, que alega não ter ¿nenhuma prova¿ das baixas civis. Para ajudar a evitar esse tipo de ocorrência, os EUA enviarão aviões não tripulados para apoiar as missões de ataque na Líbia.

Brasileiro passou oito dias detido No início de março, o jornalista brasileiro Andrei Netto, correspondente do jornal O Estado de S. Paulo na Europa, foi mantido preso por autoridades líbias durante oito dias, sem contato com a Embaixada do Brasil em Trípoli nem com a direção do jornal. Ele relatou ter ficado em uma prisão nos arredores da capital, na companhia do iraquiano Ghaith Abdul-Ahad, enviado do jornal britânico The Guardian. Os dois foram detidos na cidade de Sabrata, enquanto tentavam chegar a Trípoli. Como condição para ser libertado, o repórter brasileiro teve de se resignar à deportação, realizada em 10 de março. O iraquiano foi solto alguns dias depois.