Título: Política industrial não se limita à renúncia fiscal
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Fonte: Gazeta Mercantil, 12/05/2008, Editorial, p. A2

12 de Maio de 2008 - cape 1,O governo federal decidiu adotar um pacote de desoneração tributária para o setor industrial. É um movimento novo da administração Lula em relação à indústria, o que necessariamente não significa a arquitetura de uma efetiva política industrial. A rigor, o conjunto de medidas que o presidente Lula deve anunciar hoje no Rio de Janeiro, chamado de Plano de Desenvolvimento Industrial (PDI) começa por uma desoneração da folha de pagamento de setor determinado, o das empresas que exportam software. Como reconheceu o secretário de Política de Informática do Ministério de Ciência e Tecnologia, essas empresas já se beneficiam dos incentivos fiscais da Lei de Inovação (as da Medida Provisória chamada MP do Bem) que poderiam estar sobrepostos à Lei da Informática - que concedia redução de 80% no IPI para as empresas que investissem 5% do faturamento em pesquisa e desenvolvimento. Vale lembrar que a Lei de Inovação beneficiava esse mesmo setor com redução de Imposto de Renda para a contratação de pessoal qualificado também, para desenvolvimento de tecnologia. Agora, esse mesmo setor será o primeiro a receber o benefício da desoneração na folha de pagamento. As razões da prioridade desse setor no PDI são desconhecidas. Há uma justificativa de que desonerar a folha é antiga reivindicação dessa indústria porque o custo da mão-de-obra representa mais de 90% do custo da produção. Outros setores enfrentam a mesma situação e não foram considerados prioritários. Aliás, técnicos do Ministério da Previdência Social temiam que a desoneração da folha de pagamento na área de informática abra o precedente para que outros setores façam uma compreensível reivindicação de isonomia. Porém, o governo escolheu o prédio do BNDES no Rio de Janeiro para garantir que o PDI poderá alcançar um custo fiscal de cerca de R$ 25 bilhões, até 2011, tanto pelas renúncias tributárias como pela redução das taxas de juros dos empréstimos do BNDES. Como as desonerações prometidas devem alcançar também outros setores, coube ao Ministério da Fazenda acomodar todas as demandas dos outros setores industriais despertadas pela possibilidade de imediata desoneração de até R$ 8 bilhões. Não é difícil imaginar as açodadas pressões que os técnicos da Fazenda começaram a receber, em especial quando se aventou a hipótese de "surpresas" quanto ao valor da renúncia fiscal que o Estado estaria disposto a conceder. Ao anunciar o PDI, o governo fez questão de mencionar que o projeto busca o incentivo para os investimentos, a inovação tecnológica e, principalmente, o estímulo às exportações, visando impulsionar as vendas, preocupado com o crescimento do déficit nas contas correntes, construído basicamente pelo saldo negativo na balança comercial. Como sempre ocorre nesses lançamentos de grande envergadura, o governo separou algumas macrometas para destacar. No caso do PDI, são quatro objetivos principais para a prometida nova política industrial. O primeiro deles é expandir a taxa de investimento dos atuais 17,6%, de 2007, para 21% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2010. É com esse impulso projetado que o governo espera alcançar a segunda meta: a de ampliar as exportações brasileiras no comércio mundial do atual 1,17% registrado no ano passado para ambicioso 1,5% no final da década. Já o terceiro objetivo visa alterar o perfil da pauta exportadora, incluindo um aumento de 10% na quantidade de pequenas empresas que atuam como exportadoras. A última meta do PDI é a pressão oficial por maior inovação no setor industrial, novamente incentivando investimentos privados em pesquisa e desenvolvimento, que hoje representam modesto 0,51% do PIB, para no mínimo 0,65% em 2010. Vale notar que a caixa de felicidade que envolve o PDI inclui também medidas de desburocratização do que hoje gera entraves às exportações, além de prever maiores facilidades de certificação e metrologia, para ajudar as empresas na dura competição do comércio exterior. Como também é de praxe, o discurso de lançamento do PDI incluirá a lembrança de que o Estado deve ser "indutor" do desenvolvimento. No entanto, a forma como o plano será anunciado, com o convite aos 27 governadores da Federação, gera a questão de quais serão os critérios para selecionar os felizardos setores que serão os primeiros a serem induzidos. O Brasil já viu esse filme, conhece bem o final e sabe que não é o mais conveniente para a real expansão da indústria brasileira. Nos bastidores, como a esperança quanto ao crescimento da arrecadação é grande, agrava-se a disputa sobre quem será o setor mais beneficiado, antecipando a hipótese de que os "derrotados" e mais o restante da população devem acabar pagando a conta, arcando com maior recolhimento de tributos. Política industrial eficiente parte de outros princípios e, como está, o pacote anunciado guarda semelhanças com um pacote que dá "presente" para alguns e risco para todos. (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 2)