Título: Consórcio da Suez leva Jirau por R$ 71,40 MWh
Autor: Scrivano, Roberta; Severo, Rivadavia
Fonte: Gazeta Mercantil, 20/05/2008, Nacional, p. A9

20 de Maio de 2008 - O consórcio liderado pela multinacional Suez e pela construtora Camargo Corrêa, venceu o leilão de Jirau, a segunda do rio Madeira, e surpreendeu o mercado com um lance de R$ 71,40 o megawatt-hora (MWh), deságio de 21,5% sobre o preço-teto de R$ 91. O consórcio adversário, encabeçado por Odebrecht e pela estatal Furnas, ofereceu R$ 83,02/MWh pela energia de Jirau. "Esse leilão surpreendeu ainda mais que o de Santo Antônio, principalmente se levarmos em conta a potência assegurada de cada usina e o valor que a eletricidade será vendida", argumenta Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE), referindo-se ao fato de que a hidrelétrica de Jirau irá oferecer menos energia ao mercado em relação à primeira usina. "Não há uma explicação razoável para Jirau, com energia assegurada (eletricidade que efetivamente será gerada) de 1.925 MW, ter sido arrematada a R$ 71,40 o MWh, enquanto a de Santo Antônio (com o potencial de energia assegurada bem maior, 2230 MW), será vendida por R$ 78,87/MWh", compara. Com o arremate de Jirau, a Tractebel, controlada pela Suez no Brasil, se tornará a quarta maior geradora de energia do País com 8.215 MW de potência, superando as estatais Cemig (6.922 MW), de Minas Gerais, e a Cesp (7.455 MW ), de São Paulo. Victor Paranhos, presidente do consórcio Energia Sustentável do Brasil, vencedor da licitação, esclarece que a antecipação da geração de energia e melhorias no projeto permitiram um custo menor para o grupo, o que possibilitou o lance de R$ 71,40 MWh. "Estudamos um outro arranjo, com significativa redução dos custos. Somente as mudanças no projeto original possibilitarão a redução de R$ 1 bilhão no custo da obra civil", diz Paranhos. A obra de Jirau está orçada em R$ 8,7 bilhões pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Porém, segundo o consórcio da Odebrecht/Furnas, comparando as duas obras, a de Jirau é mais cara e complexa que Santo Antônio, além de ter maior linha de transmissão e uma menor energia assegurada. "Mas o principal fator que viabilizou esse desconto foi a intenção de antecipar a entrada de operação das turbinas, que começarão a gerar a partir de março de 2012, sendo que a previsão era acioná-las em janeiro de 2013", comenta Paranhos. Segundo ele, nesse período serão gerados 1,9 milhão de megawatts médios. "Venderemos esse montante ao mercado livre", completa. Paulo Mayon, da Associação Nacional dos Consumidores de Energia, porém, diz que se trata de um "subsídio cruzado". "O consumidor livre não pode pagar por esse deságio", argumenta. Para Mayon, a diferença de preço negociada entre os mercados não pode ser muito grande. Marcelo Parodi, presidente da comercializadora Comerc, afirma que o consumidor livre pagará mais caro pela energia, entre R$120 e R$130/MWh, contra R$ 71,40 para os consumidores cativos. Daniela Santos, advogada do escritório L.O. Baptista Advogados, especializado em energia, também afirma que o deságio de 21,5% será compensado na venda de energia aos consumidores livres. "O preço teto estabelecido pela Aneel para este leilão (R$ 91 o MWh) já era surpreendentemente baixo e essa redução terá impacto no mercado livre que poderá comprar 30% da energia gerada por Jirau". A especialista acredita que o valor da eletricidade para o mercado livre já foi calculado na sexta-feira antes do certame quando o consórcio vencedor realizou um pré-leilão para venda deste percentual. Porém, Paranhos, presidente do consórcio, afirma que o pré-leilão "foi importante, mas não fundamental para o cálculo do deságio". Pires, do CBIE, critica a estratégia de compensar o deságio dado ao mercado cativo com o preço muito mais alto aos consumidores livres. "Dá a entender que o mercado livre não tem futuro e isso é muito ruim", afirma. Porém, Mayon, da Anace, explica que a energia total do rio Madeira, somando Santo Antônio e Jirau, não chegam a 5% do total de energia gerada no Brasil e somente 30% do total da geração das usinas, excluindo o que for gerado antes da data oficial de entrada em operação, será passada aos consumidores livres. "A porcentagem que será impactada é muito pequena. Não acredito que será formada uma tendência de preço", comenta. Parodi, da Comec, concorda: "Esse montante ainda é muito pequeno para provocar tendência de preço tanto de queda no mercado cativo, quanto de alta no livre. Além disso, existem outros fatores de encarecimento da tarifa cativa a curto, médio e longo prazo, como o impacto da exposição das distribuidoras ao preço de curto prazo, a contratação de energia térmica já realizada e a energia nuclear de Angra 3 e outras usinas que serão construídas". No leilão da usina de Santo Antônio, a primeira do Complexo Madeira, a Suez disputou com seu atual parceiro, a Camargo Corrêa, além do vencedor, a Odebrecht e Furnas. "A principal lógica que posso chegar é a que a Suez, que já havia perdido da a Odebrecht no leilão de Santo Antônio, em dezembro, não poderia perder novamente ou não teria, tão rápido, uma oportunidade como essa", afirma Mayon, da Anace. Agora, as obras de Jirau serão executadas pela construtora Camargo Corrêa que desde o ano passado já adquiriu 40 caminhões para projetos na região amazônica. A derrotada foi a Odebrecht que liderava o outro consórcio e era tida como favorita pelo próprio governo. Na visão do Planalto, o favoritismo do grupo liderado pela Odebrecht decorria do fato de já ter vencido a disputa para a construção de Santo Antônio, o que traria vantagens de escala, já que os canteiros de obras das duas usinas serão próximos e por ter feito os estudos de viabilidade econômica das hidrelétricas, o que lhe confere maior conhecimento sobre os custos do projeto. O diretor de Investimentos em Infra-estrutura da Odebrecht, Irineu Meirelles, diz que se surpreendeu com o preço oferecido por Suez. "Tivemos uma postura agressiva. Maior até do que em Santo Antônio. Fomos até o nosso limite", afirma. No leilão de Santo Antônio o preço teto era de R$ 122,00 por MWh e o lance vencedor da Odebrecht foi de R$ 78,89, um deságio de 35%. Segundo o diretor de engenharia da Furnas, Márcio Rogar, representante da empresa no leilão, a proposta apresentada pela seu consórcio obedeceu rigorosamente as taxas de retorno mínimo determinadas pela Eletrobras. "Fomos mais agressivos do que em Santo Antônio". O governo já esperava um deságio alto também em Jirau. Na Esplanada dos Ministérios se falava em um preço na casa dos R$ 70. Mesmo assim, o presidente da Empresa de Pesquisa Energética, Mauricio Tolmasquim, comemorou o resultado. "O preço foi ótimo. Essa alternância é importante, porque mostra que existe competição. Sem dúvida vai atrair investidores estrangeiros para o país", comenta Tolmasquim. Daniela Santos, se diz surpresa pelo consórcio vencedor. "Foi uma surpresa. Todos que acompanharam o desenrolar do projeto acreditavam que o consórcio liderado por Odebrecht e Furnas levaria o leilão, mas não foi o que aconteceu", argumenta. Ela reafirma a teoria de que a Odebrecht estava alguns passos a frente por ter sido a responsável pelos estudos de viabilidade e, além disso, reduziria os custos logísticos já que havia ganhado o leilão da primeira usina e as obras serão simultâneas. "O modelo do leilão é um sucesso, o valor do arremate é muito bom e os grandes vencedores são o governo e os consumidores cativos", comenta Santos. O Consórcio Energia Sustentável é formado pela franco-belga Suez com 50,1% de participação, a construtora Camargo Corrêa com 9,9%, e as estatais Eletrosul com 20% e Chesf com os outros 20% de participação. A hidrelétrica que será construída no rio Madeira, em Rondônia, têm potência instalada de 3.300 MW, sendo 1.975 MW de energia firme, ou seja, de eletricidade que será efetivamente gerada, e forma com Santo Antonio as duas obras que já foram licitadas mais emblemáticas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Troca de ministros Um fato novo que ainda não foi avaliado em toda a sua plenitude é a influência da saída da ministra Marina Silva da pasta do meio ambiente. Especula-se dentro do governo que a mudança pode ser positiva, porque garantiria que o negócio não vai emperrar na falta de licença ambiental, depois da concessão. Jirau ainda necessitará da licença de instalação para que as obras comecem a andar e a posterior licença de operação. Marina foi resistente a liberação da licença ambiental prévia para a construção do complexo de usinas no rio Madeira. A aprovação levou dois anos para sair. O novo ministro, Carlos Minc, é tido como mais flexível na avaliação das licenças, apesar das entrevistas que deu antes de assumir o ministério. No mercado do setor elétrico, a mudança também foi bem recebida. (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 8)()