Título: Salário mínimo perde poder de compra
Autor: Saito, Ana Carolina
Fonte: Gazeta Mercantil, 26/05/2008, Nacional, p. A4

São Paulo, 26 de Maio de 2008 - Após recuperação de meados de 2005 até o final de 2006, o poder de compra do salário mínimo, em termos de cestas básica, recuou significativamente nos últimos meses. A queda é resultado da combinação da disparada dos preços do alimentos e de reajustes mais modestos do mínimo em 2007 e neste ano. Com o orçamento mais apertado, sobra menos dinheiro para a população de baixa renda consumir outros bens, avalia o economista da LCA Consultores, Éverton Santos. Levantamento elaborado pela consultoria mostra que o número de cestas básicas compradas com o salário mínimo caiu 6,6% no acumulado de doze meses até abril. Só no mês passado, a queda do poder de compra foi de 10,5% em relação ao mesmo período do ano passado. De abril de 2007 para o mês passado, o custo da cesta subiu 21,9%, para R$ 261,19, enquanto o aumento nominal do mínimo, hoje em R$ 450, foi de cerca de 9% na mesma comparação. Mais de 45 milhões de pessoas têm seu rendimento referenciado no salário mínimo, cujo poder de compra em termos de cestas básicas vem registrando quedas a cada mês em relação ao mesmo período do ano anterior desde meados de 2007. "Em junho aconteceu a virada para negativo do poder de compra. E essa diferença entre ganhos do salário mínimo e inflação da cesta foi se alargando", afirma o economista. A cesta básica, que vinha em deflação desde meados de 2005 até o fim de 2006, começou registrar elevações de preço mais expressivas a partir de junho passado, quando seu custo subiu 12,9%, até encerrar o ano com alta de 20,1%. Enquanto isso, argumenta Santos, a variação nominal do mínimo caiu pela metade, 16,7% para 8,6% entre 2006 e março de 2007. Como conseqüência da redução do percentual dos reajustes do salário mínimo, o ganho real de renda das classes mais baixas desacelerou em 2007 e deve diminuir mais neste ano, segundo as projeções da LCA. Em 2006, a massa real de rendimento (salário mais previdência) das classes D e E avançou, descontada a inflação, 10,53%, superior aos ganhos de 6,42% para a C e de 4,86% da A/B. No ano passado, a diferença diminuiu: as classes mais baixas tiveram aumento de 7,50%, enquanto as mais altas apuraram altas de 5,80% e 5,02%, respectivamente. Para 2008, a consultoria projeta um ganho menor de renda nas camadas D/E, de 6,1%, ante 4,8% para a C e 4,3% para A/B. Impactos no consumo A redução de crescimento do consumo das famílias é um dos principais fatores da expansão menor da economia brasileira prevista para este ano, além da elevação dos juros e maior contribuição negativa do setor externo. A LCA espera que o PIB cresça 4,6% em 2008, ante 5,4% no ano passado. O consumo das famílias deve desacelerar de 6,5% para 5,7%. Com gastos mais elevados com alimentação, a população de menor poder aquisitivo, em especial, tem menos renda disponível para o consumo, principalmente, de outros bens não-duráveis, como artigos de limpeza e higiene pessoal. "No caso dos duráveis, eles conseguem o crédito com prazos enormes e olham o valor da prestação", afirma Santos. "O gasto com alimentação é inversamente proporcional à renda", comenta o economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese), José Maurício Soares. Segundo ele, a classe de maior renda gasta 22% de seu orçamento com alimentos, percentual que representa quase o consumo total das camadas mais pobres. E, neste último caso, a fatia destinada para alimentação é maior, mais de 35% da renda. "Além disso, há gastos compulsórios, como impostos, transportes e saúde", acrescenta o economista. Segundo estimativas do Dieese, o salário mínimo necessário para manter uma família de quatro pessoas era de R$ 1.918,12 em abril. Os cálculos levam em conta uma família composta por dois adultos e duas crianças, que consomem o equivalente a um adulto, e o valor da cesta mais cara entre 16 capitais pesquisadas. Na avaliação do economista da LCA, os impactos da alta dos preços dos alimentos já são observados no desempenho do setor no Norte e Nordeste. De acordo com dados da pesquisa de comércio realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2005 e 2006, as vendas nas duas regiões avançaram acima da média nacional. No ano passado, o crescimento se estabilizou em 10% no Nordeste em relação a 2006 e caiu de 12% para 7% no Norte. "Isso é um indício de que essas regiões vinham sendo beneficiadas pela queda dos preços dos alimentos mas foram prejudicadas quando esse movimento se reverteu. O que faz sentido, pois lá a proporção de pessoas de classes mais baixas é maior", afirma Santos. (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 4)(to)