Título: É preciso recuperar o PMDB em São Paulo
Autor: Nascimento, Sandra
Fonte: Gazeta Mercantil, 26/05/2008, Politica, p. A9

São Paulo, 26 de Maio de 2008 - Em mais de duas décadas, desde as primeiras eleições do período da redemocratização brasileira, no início da década de 1980, dois personagens são constantes nas disputas políticas em São Paulo: Orestes Quércia (PMDB) e Paulo Maluf (PP). Hoje septuagenários ou quase - Maluf tem 77 anos e Quércia completa setenta em agosto próximo -, buscam, a cada novo pleito, recuperar o poder político. Oponentes na disputa pelo governo do estado em 1986, que terminou com a vitória do peemedebista, ambos têm em comum o fato de nunca terem mudado de partido - no caso de Maluf foi a legenda que mudou várias vezes de nome, da antiga Arena ao atual PP. Quércia fez o sucessor, Antonio Fleury Filho, mas nunca mais voltou a se eleger, embora tenha participado de praticamente todos os pleitos desde que deixou o cargo, incluindo para presidente da República, em 1994. Esteve bem próximo de voltar ao Senado em 2002, mas foi deixado para trás na reta final pelo PT, com quem tinha um acordo informal. Uma promessa de apoio muito parecida com a fechada recentemente com os Democratas do prefeito Gilberto Kassab, pré-candidato à reeleição. "Nas conversações com o DEM ficou acertado que, se eu for candidato ao Senado, em 2010, eles me apoiarão", diz, na expectativa de que não haverá surpresas desta vez. Para Quércia, um senador peemedebista eleito por São Paulo é fundamental para recuperar o partido que, como ele mesmo diz, "se enfraqueceu muito nos últimos anos, sobretudo em São Paulo". Motivo: "Virou um partido do governo", reclama, num tom contrário à maioria do partido, feliz como está, embora preocupada com o futuro pós-2010. Quatro minutos e meio de tempo no horário eleitoral gratuito fizeram do PMDB paulista a ""noiva"" mais cobiçada pelos demais postulantes ao Palácio do Anhangabaú, PT e Geraldo Alckmin entre eles. Ao se aliar a Kassab e, indiretamente, ao governador José Serra (PSDB), a quem já declarou apoio para a sucessão do presidente Lula, Quércia demonstra sentir uma chance real de, finalmente, voltar a um cargo eletivo, já que política ele nunca deixou de fazer todos esses anos no comando regional do partido. Já Maluf aposta nos eleitores que fizeram dele o deputado federal mais votado em 2006 - 739,8 mil votos - e afirma que vai tentar a prefeitura paulistana mais uma vez. Seus correlegionários deram sinais de que preferem uma aliança com Kassab, o que ele diz não aceitar. "Time que não entra em campo não tem torcida." Veja a seguir entrevista de Quércia concedida com exclusividade a este jornal e, no texto abaixo nesta página, a de Maluf. Gazeta Mercantil - Como o senhor vê a disputa na capital paulista? O "acordo ideal" PSDB-DEM está difícil... Esse é apenas o ponto de vista de quem tem interesse na campanha do Gilberto Kassab, que é muito próximo ao governador José Serra. Se forem duas candidaturas (Kassab e Geraldo Alckmin), poderá ser ruim para os dois. Gazeta Mercantil - Mas o senhor levou esse cenário em consideração quando fechou com o DEM, não? Eu acho que o Kassab ganha, mesmo com o Alckmin candidato. Mas o ideal é que não fosse assim. Gazeta Mercantil - O PT não fechou alianças na capital e não sobraram muitas opções. Na sua avaliação, como isso afeta a candidatura da Marta Suplicy? É difícil conviver com o PT, eles só imaginam o interesse político deles, por isso as dificuldades de aliança. Isso evidentemente vai prejudicar a Marta. Já em relação ao Kassab, imagino que os partidos que o estão apoiando vão dar muita força a ele. Mesmo se o Alckmin sair, tem muita gente ligada ao Serra que vai apoiar o prefeito. Gazeta Mercantil - Em qual palanque o senhor acha que o Serra vai subir? Do Kassab ou do Alckmin? Eu também gostaria de saber como vai ser, o Serra está numa situação difícil... Gazeta Mercantil - Como está a relação do PMDB paulista com a direção nacional? Ela não tende a apoiar o candidato de Lula em 2010?A posição do Michel Temer (presidente nacional do partido) é ter candidato próprio, caso não haja, aí se vai para uma aliança. Gazeta Mercantil - Com quem? O senhor defende o apoio a Serra e há grande parte do partido com Lula. Aí vamos disputar. Se não houver candidato próprio, eu acho que o Serra pode ganhar o apoio do PMDB. Não acho que só porque hoje o partido apóia o governo é evidente que irá apoiá-lo em 2010. Gazeta Mercantil - O senhor não se elege desde 1986, quando assumiu o governo do estado de São Paulo, apesar de, nesse período, ter disputado - e perdido - muitas eleições até agora... É uma questão que eu vou ter de avaliar. Na última eleição que disputei para o Senado, há seis anos, ganhei nas pesquisas até o último momento e perdi porque fiquei sozinho, não tinha candidato a presidente nem a governador e é isso que puxa o senador na reta final. Gazeta Mercantil - O PMDB só tem três deputados estaduais em São Paulo e dois vereadores na capital. Considerando o tamanho do PMDB, que tem 1.308 prefeitos no País e 15 milhões de simpatizantes, segundo o próprio partido, não são números poucos expressivos? É possível melhorar isso? Esse é o grande objetivo nosso. O PMDB se enfraqueceu muito em São Paulo. Temos cerca de 116 prefeitos, queremos chegar a 200. O ideal seria se o PMDB tivesse candidato a prefeito aqui em São Paulo. Eu tenho feito o que posso para ajudar o partido. Gazeta Mercantil - Houve tentativas reais de uma conversa PMDB-PT? A Marta esteve aqui comigo, foi muito simpática, nossa decisão não é por causa dela. Eu não tenho mágoa do PT, em política não se tem mágoa. O problema é que o grande sonho do PT é tomar conta do PMDB. Das conversar que tive agora com o pessoal do PT é sempre a mesma coisa, a gente precisa estar juntos, precisamos isso, aquilo. O PMDB precisa, de alguma forma, sobreviver para voltar a crescer, e uma aliança com o PT não resolve. Gazeta Mercantil - Há uma estratégia para recuperar o PMDB em São Paulo? Seria bom se tivéssemos um senador eleito por São Paulo. Nas conversações com o DEM ficou acertado que, se eu for candidato ao Senado, eles me apoiarão. Gazeta Mercantil - O PMDB cresce mais no Norte, Nordeste, com pessoas, como o senhor mesmo já disse, sem tradição no partido... É verdade. É que o PMDB, no Nordeste sobretudo, virou um partido do governo. Aqui em São Paulo nós estamos sem governo há 20 anos, sem participar de governo nenhum. Participamos do governo mas é como não se participássemos, eles não dão nenhuma satisfação para ao PMDB. Gazeta Mercantil - No passado o senhor não apoiou o Serra e fez críticas duras ao governo de Fernando Henrique Cardoso. Como vê agora o governo Lula? Igual ao do FHC, nada mudou. Gazeta Mercantil - O governo Lula o surpreendeu? Até positivamente. Ele poderia estar fazendo coisas absurdas e não está, está seguindo o bonde da história, que está levando o Brasil e todo o mundo para frente...O Brasil está crescendo nesta onda, o mundo todo está crescendo. O que poderia ser diferente? Investimentos em infra-estrutura. Agora ele anuncia que vai fazer, mas o governo Lula, todos os anos, não conseguiu nunca, em termos de obras públicas, cumprir os orçamentos, sempre sobra dinheiro ao final do ano, dinheiro que o governo não teve competência de gastar. Gazeta Mercantil - O governo reclama que faltam projetos. Um administrador competente não deixa faltar projetos, esse é o caminho para o crescimento do País, você acompanha o bonde mundial mas tem também uma proposta nacional, e que hoje não existe. O que existe é apenas o bonde da história que vai levando o Lula, o governo... Gazeta Mercantil - O senhor apoiaria o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, hoje no PSDB, caso ele fosse para PMDB? Eu duvido que ele venha para o PMDB. Se ele vier aí muda tudo, mas ele jamais virá... Gazeta Mercantil - E como o senhor vê o terceiro mandato? O Congresso não aprovaria. Nós levamos desvantagens em relação à China e à Índia, mas uma das vantagens que temos é que eles têm um regime que não é muito democrático e nós temos um regime democrático, então o processo no Brasil é muito grande e só seria ameaçado pôr um terceiro mandato do Lula. É o caminho do autoritarismo, eu acho que a maioria silenciosa não vai admitir isso. Eu acho que Lula é sincero quando fala que não quer, mas se não for sincero, pode não ser que ele não vai ser, entendeu? Gazeta Mercantil - Mas e os 70% de aprovação do presidente? É a economia, não é (risos)?. No mundo todo é assim, se a economia vai bem, está tudo bem. Você conversa com os empresários, com os bancos, eles acham que o Lula vai bem, e além disso ele consegue melhorar a situação do mais pobre. Mas daqui a pouco esse mais pobre vai entender que isso que ele recebe é muito pouco quando comparado com um emprego de verdade, com um salário digno, mas isso vai depender muito da educação, o Brasil precisa fazer uma revolução na educação. O que o governo está fazendo em educação? Zero. Gazeta Mercantil - Há planos para uma participação do PMDB já no atual governo Serra? Agora não. Talvez no começo do ano acredito que ele possa indicar alguém do PMDB para o governo. Algo que dê estímulo ao partido, mas pode ser também uma secretaria muito importante, depende do governador (risos). (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 9)()