Título: Clima exige mudanças no sistema elétrico brasileiro
Autor: Lorenzi, Sabrina
Fonte: Gazeta Mercantil, 02/06/2008, Nacional, p. A4

Rio, 2 de Junho de 2008 - As mudanças climáticas vão exigir novos planos para o sistema energético do Brasil. Menos água nas hidrelétricas, escassez de ventos para plantas eólicas, política social de biocombustíveis no Nordeste ameaçada e concorrência com produção de alimentos. Por outro lado, ficam imunes ao aquecimento global que afetará a segunda metade deste século a produção de etanol e as térmicas. O estudo "Mudança Climática e Segurança Energética no Brasil", do Programa de Planejamento Estratégico da Coppe, escola de pós-graduação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), será apresentado hoje no Rio ao diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Jerson Kelman, e ao presidente da Empresa de Planejamento Energético (EPE), Maurício Tolmasquim. "Procuramos mostrar até que ponto as alterações do clima podem afetar a segurança energética do Brasil", antecipa Roberto Schaeffer, pesquisador que coordenou o estudo, ao lado de Alexandre Szklo, também da Coppe. "Se a sociedade brasileira terá que investir - ainda mais intensamente do que já o faz - em energias renováveis, deverá também investir em estudos para utilizá-las com propriedade", conclui o estudo, que foi encomendado pelo governo britânico. Não bastasse o impacto negativo sobre as principais fontes de energia que o País escolheu, o clima mais quente vai provocar aumento de 8% no consumo energético. Os pesquisadores da Coppe concluíram que as novas condições do planeta vão resultar num aumento de 9% do consumo de energia elétrica no setor residencial e de 19% no setor de serviços. A maior vulnerabilidade para o Brasil no período 2071-2100 possivelmente estará na geração de energia hidrelétrica, que atualmente representa quase 85% da produção brasileira de eletricidade. As usinas mais afetadas seriam as da bacia do São Francisco, que registrariam uma queda de 23,4% na vazão, de acordo com o cenário mais otimista, e de 26,4%, segundo as projeções mais pessimistas. Com isso, o impacto sobre a produção de energia dessas usinas poderá ser da ordem de 8%. Já na Grande Bacia do Paraná - formada pelo rio Paraná e as bacias do Paranaíba, Paranapanema e Grande - haveria, apesar da queda na vazão anual média, mais altas no começo da estação chuvosa. O impacto na produção de energia pelas hidrelétricas poderá ser da ordem de 1,5% em média. Além da redução do potencial de geração hidráulica, o Nordeste deve amargar perdas expressivas na produção de biocombustíveis. Algumas culturas, como a mamona e a soja, poderão se tornar inviáveis com as elevações de temperatura e de seca previstas para a região. No Centro-Oeste, segundo o estudo, o cultivo de soja também poderá ser afetado. "Uma parte desses efeitos negativos sobre a produção de matérias-primas para o biodiesel poderá ser compensada pela abertura de novas áreas de cultivo propiciadas pelas novas condições climáticas no Sul", assinala o estudo. O problema de transferir para o Sul a produção de biocombustíveis, alertam os pesquisadores, está na questão da segurança alimentar. "A concentração da produção (de biocombustíveis) no Sul também pode, em princípio, reduzir os efeitos sociais positivos visados pelo Programa Nacional de Biodiesel, já que as regiões Norte e Nordeste concentram a maior parte dos agricultores familiares pequenos e pobres. Além disso, a concentração da produção no Sul pode causar conflitos de usos da terra entre plantios para fins energéticos e não-energéticos, já que essa região também tem as melhores condições climáticas para muitos destes últimos." O estudo prevê que a redução de ventos no interior do País vai diminuir em até 60% o potencial de energia eólica. "A redução se daria em conseqüência de menores velocidades de vento na Região Norte e, principalmente, no interior do Nordeste." O pesquisador Schaeffer, porém, avalia que no litoral o potencial de gerar energia a partir dos ventos vai aumentar. "Os ventos e as plantas eólicas vão se concentrar, será mais atraente porque haverá mais concentração de ventos em determinados lugares." O trabalho diz que essa concentração de ventos no litoral, porém, não vai compensar a diminuição da geração eólica no interior. (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 4)()