Título: Governo fará economia adicional de R$ 13 bi
Autor: Saito, Ana Carolina
Fonte: Gazeta Mercantil, 02/06/2008, Nacional, p. A5
2 de Junho de 2008 - O combate à inflação se tornou prioridade e o governo decidiu colocar os recursos obtidos com a arrecadação a serviço da política monetária. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou na sexta-feira um valor equivalente a 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB), cerca de R$ 13 bilhões, será poupado e transferido posteriormente, por meio de decreto-lei, para o Fundo Soberano. Para especialistas, a economia adicional do governo, que eleva a meta de superávit primário para este ano de 3,8% para 4,3% do PIB, terá pouco impacto nos rumos da inflação. "O superávit primário vai ficar próximo do que ele já tem hoje, e nem por isso a inflação está esmorecendo", afirma o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini. Além disso, os economistas questionam se esse acréscimo virá da redução de gastos públicos, o que contribuiria para conter a inflação, ou aumento da arrecadação tributária. Para o professor de macroeconomia e pesquisador do Ibmec São Paulo Marcelo Moura, o sinal do governo para o mercado é confuso, pois o anúncio não deixa claro se haverá redução de gastos ou se o governo está usando mais um argumento para conseguir a aprovação do fundo. Na sua avaliação, também é incoerente usar o superávit primário como mecanismo para reforçar as reservas ou como instrumento de política industrial. "O Brasil está em um sistema de metas e uma das prioridades é ancorar as expectativas de inflação, que têm efeitos no reajuste de preços. Nesse momento de alta de preços no mundo, é importante dar um sinal claro para o mercado", afirma. Um esforço fiscal a mais de 0,5% somente neste ano do PIB terá pouco efeito sobre a inflação em 2008, diz Márcio Nakane, professor e coordenador do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). "Se for algo permanente, pode ter impacto nos próximos anos", comenta. A economia extra do governo poderia contribuir no combate à inflação se viesse do corte de gastos públicos, acrescenta Nakane. "O que importa é o descompasso entre oferta e demanda, que é afetada pelos gastos do governo e não por impostos", diz. Para o professor do Ibmec São Paulo, a redução de gastos públicos seria mais eficaz e poderia ajudar até evitar uma alta maior da taxa de juros. "A diminuição de gastos não afetaria tanto o setor produtivo como a alta de juros",comenta Moura. Agostini, da Austin, também afirma que o impacto na inflação é muito pequeno. Ele ressalta que a origem da alta de preços é externa, da elevação das commodities no mercado internacional. "Hoje, o superávit não é gerado por redução de despesas, mas contenção de investimentos e aumento de arrecadação. A qualidade é que tem de mudar", comenta. Segundo Mantega, os atuais níveis de arrecadação permitem a economia extra. "Estamos economizando desde o começo do ano", assinala. O governo não irá gastar estes recursos e transformará em poupança o que poderia se converter em uma despesa pública. "Embora o Brasil tenha inflação menor que a dos países emergentes, temos de tomar cuidado com ela", afirmou o ministro. "O governo federal deixará de gastar para ajudar na política antiinflacionária", declarou. A economia do governo ocorre em um momento em que a economia vai bem, com arrecadação crescente. De acordo com Mantega, será uma "poupança anticíclica" para ser utilizada no momento em que a economia retroceder nos próximos anos e houver dificuldade para formação do superávit primário até o final do governo. "Este será o momento para usar essa poupança fiscal e evitar uma retração econômica", diz Mantega. Para o ministro, nesta fase "de vacas gordas se guarda uma poupança que será usada em tempo de vacas magras". Na avaliação de Mantega, o governo tem tido um bom desempenho no controle inflacionário. O Conselho de Política Monetária (Copom) aumentou a taxa de juro, foram reduzidas tarifas de importação do trigo, do aço e da Contribuição de Intervenção de Direito Econômico (Cide) para conter a pressão de alta. Mantega evitou comentar a tendência do Copom que se reúne no início de junho. Reconhece, no entanto, que "se os gastos privado e público estiverem elevados a política monetária será mais dramática". O ministro reforçou que a decisão de poupar os recursos arrecadados "significa que a política fiscal e a política monetária estão de mãos dadas" O Fundo Soberano ainda não foi criado e enquanto isso, os recursos deverão permanecer no Tesouro Nacional. O Projeto de Lei que cria o fundo deverá ser enviado ao Congresso Nacional nesta semana e, se tramitar em regime de urgência, poderá ser aprovado em 45 dias. O fundo poderá ser composto por reais, dólares e títulos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) que rendem 6,5% ao ano. A compra de dólares poderá ser feita para reduzir a pressão sobre o real. Mantega afirma que poderá ocorrer também uma troca de ativos, com a utilização da moeda norte-americana para aquisição de títulos que o BNDES lançou recentemente no exterior. (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 5 e Jaime Soares de Assis)