Título: Pesquisa brasileira atrai interesse de multinacionais
Autor: França, Anna Lúcia
Fonte: Gazeta Mercantil, 02/06/2008, Industria, p. C5

São Paulo, 2 de Junho de 2008 - A inovação que as indústrias farmacêuticas tanto precisam pode não estar dentro dos próprios laboratórios. Uma legião de pesquisadores espalhados pelo mundo pode deter hoje ferramentas importantes para o desenvolvimento de novos medicamentos. O único problema é conseguir unir todas as pontas desse novelo para costurar algo realmente útil. No Brasil, um País que detém um quinto da biodiversidade mundial e conta com um grande número de pesquisadores dentro das universidades, o problema vai mais longe e esbarra na falta de regras claras e na burocracia. "Sabemos que a inovação hoje não está mais concentrada dentro das empresas, por isso temos de buscar oportunidades em diversos lugares, e o Brasil é um deles", explicou João Sanches, diretor de relações institucionais da Merck Sharp & Dohme. Segundo ele, 60% da economia norte-americana atualmente está baseada em setores que vivem da inovação, sendo que 70% disto vem de fora dos EUA. "A inovação está por toda a parte e é preciso ir buscá-la". Por isso, a Merck fechou 58 acordos no último ano, mas a única região que ficou de fora foi a América Latina. De acordo com Sanches, quando se descobre um nova droga, só para fazer estudos clínicos o tempo no Brasil é de oito a nove meses enquanto na Argentina, por exemplo, este prazo é de três ou quatro meses. Mesmo com a riqueza da biodiversidade e com o recente apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a falta de regras claras é outro empecilho brutal para o avanço das pesquisas. Um exemplo claro disso são os diversos estudos desenvolvidos hoje pelas universidades e que vão até o limite do que pode ser feito dentro de uma faculdade. Dali para frente, o que diz respeito a produzir o medicamento, testar e colocar no mercado efetivamente, que deveria ser função de uma empresa, não é possível ser feito. "Não existem no Brasil leis claras para acordos entre as empresas e as universidades, o que faz com que estas pesquisas, muitas vezes, acabem se perdendo no caminho", explicou o diretor geral da multinacional inglesa especializada em biotecnologia Shire pls, Roberto Marques. Por esse motivo, recentemente, a empresa se viu impossibilitada de investir em uma pesquisa que a Universidade de São Paulo (USP) realiza para encontrar uma substância que auxilia no combate ao câncer de mama. "As pesquisas, no final, são sempre interrompidas precocemente por falta de recursos, sendo que nós teríamos muito interesse em ir até o final". Outro empecilho para o avanço da pesquisa é a lei de patentes, considerada obsoleta e insegura para quem investe. "Em outros países a lei é mais ampla e se permite, por exemplo, a patente de um conceito", acrescentou Marques. Segundo ele, as regras são fundamentais em um setor no qual os investimentos são muito altos. A Shire investe em pesquisa e desenvolvimento 47% da receita de US$ 3 bilhões anuais. A diretora de assuntos corporativos da norte-americana Genzyme, Eliana Tameirão, confirmou que a elaboração de um medicamento baseado em biotecnologia é muito caro. Segundo ela, basta comparar o que é gasto por outros setores como o de eletroeletrônicos e automóveis, que investem de 4% a 6% do faturamento, enquanto o setor farmacêutico gasta 18%. "No nosso caso, investimos 20% da receita".É justamente essa falta de regras que pode deixar o País para traz na corrida da biotecnolgia, considerada uma das grandes alternativas para a indústria farmacêutica, que vem sofrendo com a quebra de patentes nos últimos anos. "Não vejo outro caminho para essa indústria que não passe pela biotecnologia", disse Eliana Tameirão. Mesmo tendo avançado na área de biocombustíveis e alimentos transgênicos, só agora o País conseguirá reunir recursos para ir ao maior evento de biotecnologia internacional, a Convenção Mundial de Biotecnologia, que será realizada em San Diego, na Califórnia (EUA) entre 17 e 20 de junho. "O Brasil nunca participou até por falta de organização, apesar de sua riqueza natural e tecnologias", afirmou Eduardo Emrich Soares, diretor presidente da Fundação Biominas. O instituto, que trabalha no incentivo a bionegócios e à pesquisa científica no Brasil desde 1990, assumiu a organização para que o País não ficasse mais de fora. Assim, conseguiu obter o patrocínio de 50% do BNDES e do Ministério da Saúde e 50% ficou a cargo de empresas como a Merck e a Genzyme, entre outras. "Sempre estranhamos a falta de participação do Brasil quando andávamos nestas feiras, por isso resolvemos incentivar", explicou o diretor da Merck. Segundo Eliana, a feira é extremamente importante uma vez que consegue reunir acadêmicos, empresas e representantes de governos tudo em um mesmo ambiente para que se fechem negócios efetivamente. Já estão marcados mais de 12 mil encontros de fomento, informou Eliane. Com certeza uma boa oportunidade para as brasileiras. (Gazeta Mercantil/Caderno C - Pág. 5)()