Título: Expansão do consumo interno pode apertar estoques de álcool
Autor:
Fonte: Gazeta Mercantil, 11/06/2008, Agronegocio, p. C10

São Paulo, 11 de Junho de 2008 - A preocupação das usinas com a produção recorde de álcool nesta safra - e o temor de preços muito baixos - está tendo no consumo interno um alento: há dois meses seguidos (março e abril), o motorista brasileiro abastece mais com álcool do que com gasolina. A alta na venda de carros-flex, que nos primeiro cinco meses deste ano cresceu 30% com mais 1,15 milhão de veículos nas ruas, e o preço mais atrativo do álcool justificam o bom desempenho do combustível verde. O resultado é que o crescimento do consumo interno está em ritmo mais acelerado que a própria expansão das usinas. E, a estimativa é que essa voracidade do consumidor interno deixe os estoques de passagem mais apertados do que já foram nesta virada de safra. Segundo dados da Agência Nacional de Petróleo (ANP), o consumo de álcool nos postos (anidro e hidratado) nos primeiros quatro meses cresceu 32,5% (de 4,5 bilhões de litros para 5,9 bilhões de litros), enquanto a estimativa de produção para esta safra é que as usinas (do Centro-Sul) fabriquem 19,7% mais álcool que no ciclo anterior, segundo a União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica). Considerando a safra de todo o Brasil, a previsão é que sejam produzidos neste ano 26,3 bilhões de litros de álcool, contra os 22,4 bilhões de litros da safra anterior, um alta de 17,4%. Para Júlio Maria Borges, da JOB Consultoria, a expansão do consumo interno vai deixar a oferta de álcool em abril do ano que vem ainda mais escassa do que foi no mesmo mês deste ano. Isso porque, segundo Borges, a somatória do consumo interno (álcool combustível e para uso químico) com a exportação deve ser de 26,8 bilhões de litros, 500 milhões de litros maior que a produção esperada. "Teremos um consumo nos postos de 21 bilhões de litros, a indústria química deve usar mais 1,3 bilhão e, as vendas externas, vão atingir 4,5 bilhões", detalha. Assim, estatisticamente, em abril de 2009 (início da próxima safra) haverá um déficit de 500 milhões de litros de álcool e, o abastecimento, teoricamente, será suprido pela produção do mês - que contará com a entrada de mais usinas na moagem. "Não trata-se de um risco de abastecimento. Há um risco maior de preços. De os preços se elevarem mais para equilibrar o excesso de demanda", pondera.A situação, complementa o especialista, não é novidade e aconteceu, em menor intensidade, em abril deste ano, mês em que os estoques estavam próximos de 100 milhões de litros. "Tivemos uma produção de 22,4 bilhões, um consumo de álcool combustível de 17,7 bilhões, de uso na indústria química de 1,2 bilhão e 3,6 bilhões de vendas externas. O resultado foi um consumo total de 22,5 bilhões de litros", recorda. O comportamento dos preços - ainda baixos em abril - abril, segundo Borges, o equilíbrio com a oferta da moagem da nova safra. "A situação estava bem apertada, tanto que choveu e os preços subiram em plena safra. Por que isso não aconteceu com o açúcar? Porque há muito estoque", compara. A estimativa da Unica é de que o consumo de álcool no Brasil será de 25,5 bilhões de litros, o que significará entrar abril de 2009 com 800 milhões de litros de estoque de passagem. "A situação ficará confortável com a produção de abril que, neste ano, por exemplo, foi de 880 milhões de litros", afirma Antônio de Pádua Rodrigues, diretor-técnico da Unica. Em abril deste ano, o consumo de álcool (anidro e hidratado) nos postos foi de 1,56 bilhão de litros, 50% maior que os 1,04 bilhão de abril de 2007. Essa demanda foi maior que a da gasolina, cujas vendas somaram 1,53 bilhão. Em março, essa inversão se repetiu, quando as vendas de álcool somaram 1,522 bilhão , ante as 1,519 bilhão da gasolina. Um outro fator que deve ajudar o consumo de álcool é o reajuste nos preços do Gás Natural Veicular (GNV). O preço do metro cúbico, que estava nas bombas de São Paulo entre R$ 1,09 e R$ 1,19, será elevado para patamares próximos de R$ 1,40 e R$ 1,50, segundo estimativas da Unica. Isso significa, segundo Rodrigues, maior preferência pelo álcool que, na bomba em São Paulo, está valendo, em média, R$ 1,19. "O álcool tem rendimento 70% menor que o GNV. Isso quer dizer que compensa mais abastecer com álcool", defende Rodrigues. Para Mário Silveira, analista de gerenciamento de risco da FCStone, a safra de álcool será maior do que a estimada pela Unica, e será preciso um grande esforço do setor para exportar o volume de álcool esperado. A projeção da consultoria para o Centro-Sul é de uma moagem de 511 milhões de toneladas (ante as 498,1 milhões de toneladas da Unica) e uma produção de álcool de 25 bilhões de litros (ante os 24,3 bilhões da Unica). O consumo interno, segundo Silveira, deve ser expandido para 18 bilhões de litros e, as exportações, entre 4 bilhões a 5 bilhões. Isso significa um estoque de passagem próximo de 2,5 bilhões e 3 bilhões de litros. "Mas tudo isso vai depender da qualidade da cana e do clima daqui para frente", afirma o especialista. Ele acrescenta que o levantamento da FCStone foi feito com usinas que representam 40% da moagem do Centro-Sul e já considerou o atraso da moagem no início da safra por conta das chuvas. "A expectativa é de uma produção grande. Muitas usinas novas estão iniciando a moagem e, em o tempo firmando, a produção vai vir", avalia Silveira. (Gazeta Mercantil/Caderno C - Pág. 10)(Fabiana Batista)