Título: Consumidores pagam a conta da crise energética
Autor: Scrivano, Roberta; Cardoso, Denis
Fonte: Gazeta Mercantil, 05/06/2008, Infra-estrutura, p. C8

5 de Junho de 2008 - Já a partir deste ano os consumidores brasileiros de energia elétrica começarão a pagar a conta da crise de abastecimento energético registrada no início de 2008, quando o País viveu o temor de um novo apagão, similar ao ocorrido em 2001. Na prática, acabou a festa da queda de tarifas, movimento ainda visto este ano e em 2007 nas taxas de algumas distribuidoras que passaram por processo de revisão, como Bandeirante (SP), Celesc (SC), Cemig (MG), Coelba (BA), Copel (PR), CPFL Paulista (SP), Eletropaulo (SP) e Light (RJ). O principal fator responsável pelo acréscimo nos valores das tarifas é a utilização, em excesso, de usinas termelétricas, que têm alto custos de geração, bem superiores aos custos das hidrelétricas e de outras fontes disponíveis no mercado. Normalmente, as usinas térmicas são utilizadas apenas em períodos de seca, para cobrir o buraco deixado pelas hidrelétricas, que necessitam da água para gerar a energia. No entanto, com os temores de um novo racionamento - motivado pela falta de gás natural, pelo baixo regime de chuvas no início do ano e pela escassez de projetos de geração de grande porte no País -, o governo resolveu este ano ligar essas térmicas a todo vapor, com o objetivo de poupar as águas dos reservatórios e, assim, garantir a segurança energética brasileira. O custo de uma usina térmica movida a óleo diesel - a mais cara do sistema de geração - gira em torno de R$ 350 por megawatt-hora (MWh), segundo cálculos de Mário Veiga, da PSR Consultoria. Uma hidrelétrica gera eletricidade a um custo em torno de R$ 70 por MWh. Só o acionamento das térmicas entre janeiro e maio custará aos consumidores R$ 1bilhão, segundo dados computados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Na conta do consultor da PSR Consultoria, o montante nos cinco primeiros meses do ano já está em R$ 1,2 bilhão. Todo o custo de geração adicional das térmicas, explica Luiz Carlos Silveira Guimarães, presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), será rateado entre todos os concessionários, via cobertura tarifária pelo encargo setorial denominado Encargo de Serviços do Sistema (ESS), que tem como atribuição garantir a segurança energética. "Os gastos serão repassados para as distribuidoras, que, por sua vez, irão cobrar esse custo adicional do consumidor durante o processo de reajuste tarifário", explica o executivo. Segundo Guimarães, além das térmicas, outro fator que ajudará a elevar o preço da energia no mercado cativo (regulado) é a evolução do IGP-M (Índice Geral de Preços -Mercado) , que corrige os contratos das concessionárias. "Nos próximos reajustes não haverá redução de tarifa e tendência é de elevação de preço", enfatiza o presidente da Abradee, entidade que reúne 51 das 64 distribuidoras existentes no País. A Aneel diz que já começou a autorizar o repasse da geração térmica nos índices tarifários divulgados em abril para distribuidoras gaúchas e outras que atuam no Nordeste. Esse aumento, de acordo com o órgão regulador, ficará em torno 1%. Uma fonte do setor, porém, acredita que esse reajuste ficará em 7%. Ricardo Lima, presidente da Associação Brasileira dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), critica o repasse do custo das térmicas exclusivamente ao consumidor. "Não é justo que só o consumidor pague por esse despacho. As térmicas só são acionadas para garantir a segurança do abastecimento, portanto o custo deveria ser distribuído de outra forma e não somente ser jogado nas costas do consumidor". Lima reforça que concorda com a segurança do sistema, mas não admite que, em função de um problema gerado pela Petrobras, que foi a não disponibilidade do gás natural, o consumidor pague pelo despacho das térmicas a óleo diesel. No ano passado, por exemplo, só foram despachadas térmicas a gás natural, que geram energia a um custo muito menor que as movidas a diesel. Lúcio Reis, diretor executivo da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace), concorda com Lima e acrescenta: "O custo das térmicas, que é muito alto, deveria ser rateado não só entre os consumidores de energia, mas entre todos os contribuintes". Mais agilidade no repasse Guimarães, da Abradee, diz ainda que o custo adicional gerado a partir do despacho das térmicas deveria ser passado com mais agilidade ao consumidor. Segundo ele, o repasse imediato do custo das térmicas seria uma forma de despertar a consciência do consumidor de que a energia encareceu. "Assim o consumidor entende o aumento no preço, o que estimula a economia da energia e, por sua vez, um menor gasto por parte dele", afirma Guimarães. Lima, da Abrace, diz que o custo cai para o consumidor dois meses depois do consumo. "Sou contra onerar único e exclusivamente o consumidor", reforça. As termelétricas a óleo e gás foram acionadas no final de 2007 e início de 2008 para suprir a escassez de energia proveniente das hidrelétricas devido ao baixo regime de chuvas. De acordo com a Aneel, "esse valor total de mais de R$ 1 bilhão é resultante da ultrapassagem da Curva de Aversão a Risco (CAR) e do despacho das usinas termelétricas determinada pelo Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) no final de 2007 e no início de 2008". No período de despacho das térmicas, a Aneel estabeleceu o custo variável unitário de 12 termelétricas acionadas emergencialmente. As usinas receberam R$ 616,33 por megawatt-hora (MWh), segundo relatório publicado no dia 8 de fevereiro no Diário Oficial da União. Além do reajuste que as distribuidoras farão para incluir os custos adicionais proveniente do acionamento das térmicas, ainda neste ano 35 distribuidoras passarão pelo segundo ciclo de revisão tarifária. Em 2009, serão mais 17 concessionárias. Outras duas empresas serão submetidas à revisão em 2010. Pesquisa de satisfação Há dez anos consecutivos a Abradee divulga o resultado da pesquisa anual de satisfação do consumidor realizada pelo instituto Vox Populi. De acordo com o estudo, 77,4% dos consumidores classificam como "bom" ou "muito bom" o serviço das distribuidoras. (Gazeta Mercantil/Caderno C - Pág. 8)()