Título: Meta para 2010 não escapa de 4,5%
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Fonte: Gazeta Mercantil, 16/06/2008, Nacional, p. A4

16 de Junho de 2008 - Na próxima semana, o Conselho Monetário Nacional (CMN) terá nas mãos uma decisão de peso em um momento delicado da economia brasileira: Vai resolver se mantém em 4,5% a meta de inflação para 2009 e estabelecer um novo objetivo para 2010. Todos os economistas ouvidos pela Gazeta Mercantil esperam que o alvo seja mantido no mesmo patamar para daqui a dois anos. Justificam a perspectiva baseados em duas hipóteses. Optar por um alvo mais baixo vai requerer um esforço adicional de juros. Esse cenário é considerado pouco provável, pois arrefeceria demais a atividade econômica. Por outro lado, ao definir um percentual mais alto, como 5%, elevaria ainda mais e novamente as expectativas de inflação. "Nós, como agência de rating, entenderíamos uma meta mais alta como sinal de que o governo não tem condições de controlar a inflação no patamar atual ou trazê-la para a meta", enfatiza Rafael Guedes, diretor-executivo da Fitch Ratings, que concedeu a classificação de grau de investimento ao Brasil em maio. Guedes argumenta que 4,5% parece ser hoje razoável em um cenário mundial de preços em alta, mas é elevado se comparado ao histórico de países que seguem o sistema (3%). Para ele, o normal seria ter metas de 2% a 3% com margem de 1%, mas na atual conjuntura isso significaria aperto monetário. "Não há ajuda do lado fiscal e cada real que o governo repassa ao mercado vira consumo e, conseqüentemente, inflação". Maria Andrea Parente, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), diz que, diferentemente do ano passado quando a inflação estava abaixo do objetivo central, agora não seria o momento de mexer na meta. Para ela, os integrantes do governo devem ficar com os 4,5% e ainda manter os dois pontos percentuais da margem de tolerância. "Com um cenário incerto, essa margem de ajuda na acomodação", diz. Dois economistas acusam claramente o CMN de ter errado no ano passado ao estabelecer uma meta inflacionária de 4,5% para 2009. Como a inflação corrente à época circundava 3,5%, o estabelecimento de um objetivo mais alto do que o esperado (4%) fez com que as expectativas se ajustassem para cima (ver gráfico ao lado). A meta tem grande peso sobre as projeções futuras e essas sobre a inflação. Exemplo disso são os pedidos de reajuste salarial e as intenções de consumo. "Em vez de perseguir a meta, faço a meta me perseguir", critica Caio Megale, economista-chefe da Mauá Consultoria. Roberto Padovani, estrategista-chefe do banco WestLB, lembra que ancorar as expectativas é parte fundamental do sistema. Por isso, disse acreditar que o governo deve manter os 4,5% como objetivo para 2010. "Dessa forma, ainda será possível fazer com que a inflação convirja para baixo". O economista, Gian Barbosa, da Tendências Consultoria Integrada, concorda e diz que, na época em que a meta de 2009 foi estabelecida, o debate sobre a redução fazia sentido, mas o atual cenário de inflação e a "cabeça do governo" não deixam espaço para a discussão. Isso, diz, exigiria um esforço maior de desaceleração. A Tendências projeta manutenção em 4,5%, com tolerância de dois pontos. Mas, para o longo prazo, na sua avaliação, o ideal seria mirar um objetivo menor, ajudaria na redução das expectativas do mercado. "Países que passaram por um processo de hiperinflação, tem maior aversão à alta de preços. O Brasil é um caso diferente: tem histórico e, mesmo assim, tem meta elevada". Dadas as incertezas em relação aos preços das commodities, o economista da LCA Consultores Raphael Castro diz que a tendência é que a meta seja mantida bem como as bandas para este e o próximo ano. Para 2010, no entanto, diz, há chances de uma redução, passado o processo intenso de choque de custo e confirmada a desaceleração da economia. "O BC vai observar o cenário em meados do ano que vem. Seria prudente manter e não penalizar uma economia já em desaceleração. Uma redução para 4,25% seria mais uma boa sinalização para o mercado", comenta. Para o coordenador da pesquisa do Índice de Preços ao Consumidor (IPC), da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), Márcio Nakane, não há muito o que discutir: o governo manterá - e deve - o centro em 4,5% e a banda de dois pontos tanto para 2009 como 2010. "Mesmo acreditando em uma reversão da alta de preços mundial a partir de 2009 deve seguir uma certa inércia. 4,5% é uma meta boa e factível", diz. Na sua avaliação, por vias tortas, o CMN acabou acertando em junho de 2007 em manter os 4,5% para 2009. Ele lembra que o argumento do Ministério da Fazenda de que a manutenção da meta nesse patamar permitiria uma política monetária um pouco "mais frouxa" e não prejudicaria investimentos e o crescimento da economia. "Na ocasião, as expectativas do mercado estavam em 4% e CMN ratificaria o que já era esperado. Hoje, o cenário é diferente". O economista da Fipe argumenta que em outros países o sistema de metas não se compromete com o ano calendário, como acontece no Brasil. "Se o País tivesse meta de longo prazo, faria sentido buscar alvos menores. O mundo mudou nestes últimos 12 meses e a meta tem de refletir essa mudança", diz. Para Nakane, a meta é um referencial importante para a definição das expectativas do mercado, mas tão importante quanto ela é o jogo entre pressões reais de inflação e a reação do BC. "As expectativas refletem esse jogo", afirma. Para o sócio-diretor da RC Consultores Fábio Silveira, diminuir a meta de 2010 não é uma boa política assim como não é necessário elevar para 2009, se o governo entender que pode praticar 6,5% sem entrar em pânico. Ele avalia que, portanto, seria interessante manter o intervalo de dois pontos. (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 4)(Simone Cavalcanti e Ana Carolina Saito)