Título: Justiça federal condena 70% dos crimes de colarinho branco
Autor: Ribeiro, Henrique
Fonte: Gazeta Mercantil, 19/06/2008, Direito Corporativo, p. A12

São Paulo, 19 de Junho de 2008 - A idéia de que a impunidade predomina na Justiça brasileira não corresponde à verdade - ao menos no que diz respeito aos crimes de colarinho branco. É isso que aponta um estudo conduzido pelas professoras Maíra Machado e Marta Rodriguez, da Faculdade de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV), segundo o qual 72,2% dos casos em que esse tipo de delito é julgado pelos Tribunais Regionais Federais (TRFs) terminam em condenação e punição. Para a pesquisa, foram escolhidos aleatoriamente 380 dos 1.298 acórdãos disponíveis pelo Superior Tribunal Federal (STF) sobre crimes de colarinho branco ocorridos entre 1989 e 2005. Dessa amostragem, no entanto, em apenas três casos foi determinada a pena de detenção. De modo geral, foram adotadas punições alternativas, como a restrição de determinados direitos e a prestação de serviços à comunidade. Para Marta, a suposta leveza desse tipo de sanção não é um problema. "A prisão não pode ser a única resposta do direito penal", defende. "A detenção é pensada pela maioria das pessoas como um remédio capaz de curar várias doenças, mas isso não se confirma", diz acreditar a professora. Ela sugere que, em muitos casos, as penas alternativas podem ser mais eficazes do que o cárcere para prevenir crimes. "No setor financeiro, por exemplo, a existência de penas de inabilitação de atuação no mercado podem causar muito mais dano do que a prisão", cita. "É preciso pensar especificamente em cada área. A criatividade do direito penal não pode se restringir à detenção", diz Marta, lembrando que as penas restritivas de direitos são possíveis de serem aplicadas em 65% das contravenções existentes, restando à Justiça utilizá-los mais vezes. Essa substituição pode ser aplicada quando a pena do crime não supera quatro anos e quando a infração não for cometida com grave violência e ameaça. "Além disso, o crime culposo (em que não há a intenção de cometer o ato), o fato de o acusado não ser reincidente em crime doloso (quando há a intenção de cometer o ato) e um histórico de bons antecedentes e conduta social exemplar permitem a troca da detenção por penas alternativas", explica Maíra. STJ Apesar do alto índice de condenações registrado nos TRFs, o mesmo não acontece no Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde apenas 13,2% das ações foram de condenação, mantendo ou reformando decisões anteriores. Entre as demais ações do STJ, 31% versou sobredeterminando o prosseguimento da ação penal ou do inquérito policial. Segundo o estudo, "o número reduzido de julgados do STJ que condenam o acusado explica-se pelo fato de que a competência majoritária desta instituição reside na resolução de conflitos de competência assim como na decisão sobre a legalidade ou não dos inquéritos policiais e das ações penais". Tipos de crimes O estudo apontou, também, quais foram os crimes mais julgados pelos tribunais. "Evasão de divisas" - incluindo aquelas direcionadas para o exterior - lideraram o ranking de julgamentos, com 20,4% do total de ocorrências, sendo que, entre os casos julgados pelo STJ, esse índice alcançou a marca de 22,1%. Em segundo lugar, aparece a "gestão fraudulenta" de instituição financeira, com uma recorrência de 17,3% (correspondente a 14,7% dos casos julgados pelo STJ e 17,8% dos julgados pelos TRFs) e, logo após, o de "exercício ilegal de instituição financeira", com 16,8% do total de casos analisados (16,1% pelo STJ e 16,9% pelos TRFs). Distribuição geográfica O estudo da FGV aponta, ainda, que São Paulo e Rio de Janeiro são os principais centros de prática de crimes da lei de colarinho branco. E que 50,9% dos recursos que chegam ao STJ e 44,4% apreciados pelos TRFs provém desses estados. Em números absolutos, São Paulo detêm 29,9% dos acórdãos analisados, e o Rio de Janeiro concentra outros 15,4%. O Paraná aparece em terceiro lugar, com 13,8% dos recursos interpostos nos tribunais. O estudo, intitulado "A Aplicação da Lei 7.492/86 nos Tribunais Regionais Federais e no Superior Tribunal de Justiça", foi desenvolvida pelo Núcleo de Estudos sobre o Crime e a Pena da Direito GV com apoio da Secretaria de Reforma do Judiciário e da Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça. (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 12)()

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