Título: A luta contra a inflação é de todos
Autor: Cypriano, Márcio Artur Laurelli
Fonte: Gazeta Mercantil, 20/06/2008, Opinião, p. A3

20 de Junho de 2008 - A responsabilidade pelo progresso econômico e pela estabilidade da moeda deve ser compartilhada por toda a sociedade. Nenhum país pode prosperar se suas empresas são ineficientes. Da mesma forma, não se progride se os fundamentos econômicos estão desalinhados. Embora esta seja uma constatação mais do que óbvia, freqüentemente nos esquecemos dela. Mas agora, com o sinal vermelho da inflação aceso no painel, é bom rememorar o preceito. E sem demora, pois esse transtorno econômico se propaga rapidamente e, uma vez que se instala, curá-lo requer um enorme sacrifício. Todo brasileiro na faixa etária dos 40 anos já experimentou o problema na própria pele. Sabíamos que as pressões sobre os preços vinham se acumulando há algum tempo, geradas sobretudo pela alta dos alimentos, do petróleo e de algumas outras commodities no mercado mundial. O que não esperávamos é que o impacto sobre os índices brasileiros viesse tão forte. Apenas para relembrar: o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de maio registrou alta de 0,79%, ante 0,28% em maio de 2007. Em 12 meses, esse índice, usado pelo governo como referência para a meta da inflação, já soma alta de 5,58%. A perdurar essa tendência, segundo os analistas, a inflação em 2008 será bem maior do que o previsto para o centro da meta, de 4,5%. Outros índices, referentes a junho, também subiram. A prévia para o Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M) - um indicador calculado pela Fundação Getulio Vargas (FGV) que indexa vários contratos - apontou alta de 1,97%, a maior em seis anos. Em maio, o índice já havia sido alto, de 1,36%. E não são apenas os preços de um ou dois produtos que estão subindo. Os aumentos se disseminaram por cerca de 70% dos produtos e serviços. Que há urgência em combater esses aumentos não se discute. A resposta clássica é o aperto da política monetária. E, nesse ponto, o Banco Central (BC) foi eficaz, agindo no tempo certo. Mas a força com que a inflação se manifestou exige uma postura coordenada e um esforço coletivo de todos os integrantes do governo, com o apoio da sociedade. O descompasso entre demanda e oferta de produtos vem sendo corrigido com a arma dos juros. É provável uma redução do consumo, com esfriamento dos preços. Não se trata de uma desaceleração forçada da economia, mas de uma acomodação de ritmo e de intensidade, uma suave correção de rumos. O setor privado vem trabalhando duro para ampliar a oferta de produtos e serviços à população. Investe na sua capacidade de produção e busca o aumento da produtividade. Foi isto o que permitiu um crescimento econômico forte, e com baixa inflação, em 2006 e 2007. O que tem espaço para ser corrigido é o volume de despesas correntes do governo, que têm crescido acima do Produto Interno Bruto (PIB), tornando-se fonte de inflação. É certo que o setor público tem cumprido sua obrigação de gerar superávits primários. E vimos uma louvável intenção de sinalizar mais aperto com a decisão de elevar essa economia de 3,8% do PIB para 4,3%, este ano. Mas, para uma carga tributária que se aproxima dos 40% da riqueza produzida, a economia poderia ser ainda maior, com efeitos importantes na luta contra a ameaça de volta da inflação. O Brasil, em matéria econômica, fez grandes avanços nos últimos anos. Possui um BC técnico e prudente, estatísticas confiáveis, uma lei de responsabilidade fiscal que tem sido respeitada e um regime cambial que funciona sem artificialismos. É um País bem diferente daquele que experimentou a devastação inflacionária das duas últimas décadas. Foram adotadas medidas para criar a possibilidade de um ciclo de crescimento sustentado. Foram essas mudanças que protegeram o País da última crise internacional e que possibilitam, agora, que o problema da inflação seja contornado com relativa facilidade. Para isto, falta um último esforço de ajuste, que passa por novas reformas e uma rigorosa vigilância nas contas públicas. kicker: Com uma carga tributária tão alta, a poupança do governo deveria ser maior (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 3) MÁRCIO ARTUR LAURELLI CYPRIANO* - Presidente do Bradesco. Próximo artigo do autor em 11 de julho)

-------------------------------------------------------------------------------- adicionada no sistema em: 20/06/2008 01:29