Título: Brasil será maior produtor de leite do mundo até 2013
Autor: D¿Angelo, Marcello
Fonte: Gazeta Mercantil, 20/06/2008, Empresas, p. C1

São Paulo, 20 de Junho de 2008 - Todo grande empreendedor dá o primeiro passo com uma visão diferenciada de determinado negócio ou mercado. Com o economista Marcus Elias não foi diferente. Ex-professor de Teoria Econômica na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, trabalhou em bancos de investimentos e acumulou extensa experiência em Private Equity. Foi pioneiro na captação de recursos internacionais para investimento no Brasil. Simultaneamente ao frenesi da atuação no mercado financeiro, Marcus estudou o processo de produção de leite e seus derivados a fundo. Pesquisou os índices de produtividade da indústria de lácteos e os comparou com outros segmentos baseados em derivados de proteína animal. Nessa época vislumbrou o potencial desse negócio no País, que apresentava os primeiros sinais de que o mercado interno de consumo, enfim, poderia decolar. Hoje o atual comandante da Parmalat se entusiasma com o futuro. "Em cinco anos o Brasil vai se tornar o maior produtor de leite do mundo" avalia Marcus Elias, presidente da LAEP Investments, acionista controladora da Parmalat. O empresário tem ampla experiência em reestruturação de companhias. Seu currículo registra a virada da Gomes da Costa, TendTudo, Camil , Unidas e Eurocash (Polônia). Nessa fronteira acumulou também a experiência para enfrentar tempos de turbulência. No ano passado, há três dias da concretização do IPO da Parmalat, eclodiu a denúncia de que o leite no País era fraudado. "O inquérito da polícia federal não deixou dúvidas de que a Parmalat foi a vítima principal", argumenta o empresário, que, ao mesmo tempo, anuncia uma parceria importante para consolidar o compromisso de qualidade da Parmalat. Em um projeto para durar dois anos, a Epamig vai analisar a composição e propriedades do leite com o cruzamento de dados de regiões, raças e técnicas de produção. Jamais o Brasil teve um estudo tão completo e profundo sobre a bebida e ingrediente fundamental no cardápio alimentar dos seres humanos. Elias também não teme a concorrência e saúda a entrada de indústrias de outros setores, como frigoríficos, no segmento lácteo. "Preferimos competir com grande conglomerados, que assim como nós, atuam dentro de regras claras do que com aquelas que atuam na informalidade e até fraudes praticam" afirma o presidente do Conselho de Administração da Parmalat. Outra aposta importante da empresa foi a organização da Integralat. Essa unidade é responsável por garantir a qualidade e continuidade de todo o processo produtivo desde a ordenha até as linhas de produção. A Parmalat, hoje integrada por 15 fábricas e que detém 13% de market share rende pela etapa até a mesa do consumidor. "A fidelização dos produtores é sim a saída para ampliar a qualidade do leite produzido e a produtividade dos animais" afirma para explicar o papel fundamental da Integralat em todo o processo. A empresa também não esqueceu a importância da responsabilidade socio-ambiental. Ao lado de programas de doação de leite especialmente para creches e outras entidades benemerentes, a Parmalat aposta na maximização da produtividade para com muito menos recursos retirados da natureza oferecer mais produtos e com mais qualidade. O controle da Parmalat foi adquirido em maio de 2006. Marcus Elias conversou com exclusividade com a Gazeta Mercantil para contar dos ambiciosos planos para crescer junto com o Brasil chegando a liderança do segmento e alcançando presença internacional. Gazeta Mercantil - Onde a Parmalat pretende chegar daqui a cinco anos? Pretendemos estar entre as maiores empresas de lácteos do Brasil e liderar o movimento que transformará o Brasil no maior exportador de lácteos do mundo. Gazeta Mercantil - Como o Brasil está em relação aos maiores produtores do mundo? Nossas vacas produzem cerca de 3 litros de leite por dia, bem abaixo da média das vacas dos Estados Unidos ou Europa, que produzem entre 25 a 30 litros de leite por dia. Somos o sétimo produtor de leite do mundo. Em 2007, produzimos 26,4 bilhões de litros, enquanto a Nova Zelândia, que é a maior exportadora, produziu 14 bilhões de litros. Gazeta Mercantil - Qual é a participação de mercado da Parmalat hoje? Já foi possível recuperar o terreno perdido com a crise de anos atrás? Ainda não. Hoje temos cerca de 13% de market share e estamos trabalhando muito duro para ultrapassar a marca anterior. Gazeta Mercantil - Com o anúncio da compra da marca Poços de Caldas e o licenciamento da Paulista, em abril, a empresa praticamente encerrou o plano de expansão previsto no IPO. Isso significa que pode fazer novas captações para investimentos futuros? Sim. Não descartamos novas capitalizações para financiar o crescimento da companhia. Gazeta Mercantil - As aquisições de abril fizeram a empresa entrar em um novo segmento: de requeijão. Existe ainda algum, dentro dos lácteos, a ser explorado? Hoje estamos presentes em todo o segmento de produtos lácteos. Em nossas 15 fábricas, produzimos leite, queijo, manteiga, iogurte, requeijão, leite condensado, creme de leite e bebidas lácteas. Estes produtos chegam à mesa dos brasileiros com marcas fortes como Parmalat, Glória, Poços de Caldas, Alimba e Paulista, dentre outras. Gazeta Mercantil - A Parmalat passou de 5 para 15 fábricas. Quais os cuidados com a qualidade e a produtividade? A qualidade é a base do nosso trabalho e o que nos garantiu, nestes anos todos, a preferência do consumidor. Da captação do leite até a chegada dos produtos no varejo, temos procedimentos de padrão internacional para garantir a excelência de nossos produtos. No processo industrial, por exemplo, realizamos 54 testes de qualidade para checar a qualidade da matéria prima e do produto, enquanto a legislação exige a realização de 38 testes. Isto acontece, porque somos muito rígidos e durante o processo, checamos, além da sanidade do leite, índices de gordura, de proteína e o sabor do produto. Buscamos constantemente melhorar a qualidade dos nossos processos. Recentemente, firmamos uma parceria técnica com a Epamig para aprofundar o conhecimento sobre o leite produzido no Brasil e a causa das variações na composição do leite e em suas propriedades, decorrentes da influência das diferentes raças, manejos, regiões, climas e períodos do ano. Este estudo vai durar dois anos e o primeiro a ser conduzido por uma indústria de leite. Gazeta Mercantil - Como a empresa explica, neste contexto, o envolvimento na crise da fraude no leite no ano passado? O inquérito da Polícia Federal sobre a fraude do leite não deixou dúvidas: a Parmalat foi vitima. A única menção sobre a empresa no inquérito dá conta que jamais passou pelos controles da companhia nenhum leite de má qualidade. Não é possível deixar de notar algumas "coincidências": a investigação começou em abril de 2007 e o escândalo eclodiu em outubro de 2007, a três dias do closing do nosso IPO, sendo que a Parmalat comprava da cooperativa investigada há apenas três meses da data do escândalo. Ou seja, desde agosto de 2007, portanto bem depois da data em que a investigação começou. Foram então testadas três marcas: Parmalat, Calu e Centenário. E o leite da Parmalat testado foi produzido no Rio Grande do Sul, portanto bem longe de Minas Gerais, onde se investigava as cooperativas. E o teste aplicado - alcalinidade das cinzas - não se aplica ao leite UHT nem aqui no Brasil nem em outros países do mundo, porque o leite UHT tem em sua composição citrato de sódio para durar 4 meses, que invariavelmente provoca cinzas alcalinas. Este teste de alcalinidade sequer faz parte dos testes obrigatórios na produção do leite, no Brasil ou no exterior. Estas e outras "coincidências" indicam que realmente a conclusão do inquérito da Polícia Federal está certa: fomos vítimas. Os acionistas pré- IPO perderam U$300 milhões com este equívoco. Gazeta Mercantil - Existe alguma fronteira da pecuária leiteira que a empresa ainda não atua e deseja explorar? Por meio da Integralat e da InVitro, empresas coligadas da Parmalat, nosso grupo pode ser considerado hoje "state of art" em termos de pecuária leiteira. Acho que poucas empresas no mundo podem se comparar a nós em termos das inovações que estamos implementando aqui no Brasil. Gazeta Mercantil - O projeto Integralat deve ser estendido a todas as bacias leiteiras fornecedoras da Parmalat? A fidelização do produtor é a saída? Quais são os desafios para fidelizar produtores? Sim, o projeto Integralat será estendido a todas as bacias leiteiras próximas às fábricas da Parmalat. A fidelização dos produtores é sim a saída para ampliar a qualidade do leite produzido e a produtividade dos animais. E neste processo de fidelização, o principal desafio é financeiro, visto que o volume de capital necessário é alto. Gazeta Mercantil - Entre os planos da empresa para 2008 estava o investimento em uma fábrica de leite em pó, no RS ou MG. O estudo desse projeto foi finalizado? O estado do RS tem recebido muitos investimentos nos últimos anos, é o mais provável? Pretendemos construir uma fábrica de leite em pó no Rio Grande do Sul e outra, em Minas Gerais. São bacias leiteiras importantes e próximas de grandes mercados consumidores. Gazeta Mercantil - Como vocês pretendem encaminhar a questão da venda da Montelac que acabou sendo negociada com a Nilza?Tínhamos um contrato que não foi respeitado e o assunto está na Justiça. Não podemos comentar. Gazeta Mercantil - Muitos especialistas vêem o País como uma grande plataforma exportadora de lácteos nos próximo s anos. A Parmalat está de olho nesse mercado? Quais são os desafios? Pretendemos ser catalisadores da transformação do Brasil no maior exportador de lácteos do mundo. O maior desafio é o país conseguir, com a ajuda dos órgãos governamentais competentes, montar um sistema de certificação. E não é só um desafio, mas um grande risco para o país, caso essa certificação não seja implementada. Se não organizarmos nossos próprios critérios de certificação, corremos o risco de sermos obrigados a, compulsoriamente, implantar uma padronização regulada por critérios externos, ou seja por outros países. Por não termos nosso produto certificado, os preços pelos quais exportamos para o mercado internacional no mercado chegam a ser 30% inferiores aos praticados pelos países com produtos certificados. Sem certificação, somente obteremos preços pária, o que é inaceitável. Especialmente porque não existe nenhuma dificuldade objetiva para construir o sistema de certificação. Tome a exportação de carne bovina como exemplo da importância da certificação. Gazeta Mercantil - O setor lácteo vive um momento de aquisições e consolidações. Nesse cenário, a Parmalat encontra-se em que patamar e onde quer chegar? A Parmalat é a única empresa do setor com presença industrial, de captação e de distribuição em todo o país. Pretendemos manter este handcap. Como operamos - no momento - abaixo de nossa capacidade instalada, pretendemos otimizar esta estrutura recém adquirida e em seguida, aumentar a produção e market share. Gazeta Mercantil - Como você vê a entrada de indústrias de outros ramos, como frigoríficos, no ramo? A disputa tende a ficar mais acirrada? A disputa é sempre saudável. Como somos respeitadores das regras, preferimos competir com empresas que respeitam as regras sanitárias e fiscais do que com aquelas que cometem fraudes nos produtos ou nos impostos para se manter no mercado. Gazeta Mercantil - E quanto ao mercado consumidor? Existe alguma área não atendida pela empresa? Não. A Parmalat é a única empresa do setor com fábricas, captação, distribuição e marcas fortes em todo o país. Gazeta Mercantil - Quais as perspectivas para o segmento de biscoitos, bolachas e afins? Como manter a competitividade nesse segmento? De fato, estes segmentos ficaram um pouco de lado nos esforços que empreendemos recentemente. Entretanto, devemos dar mais atenção à eles no segundo semestre, quando definiremos mais claramente nossa estratégia. Gazeta Mercantil - Qual a visão da Parmalat de seu papel na questão da responsabilidade socio-ambiental? Quais programas a empresa matem no terceiro setor? Mantemos um abrangente programa sócio-ambiental, que vai desde a assistência a creches e outros entidades com fornecimento de leite gratuito até o ambicioso projeto da Integralat, que por meio de parcerias com pequenos produtores de todo o Brasil trará significativos benefícios sociais e ambientais. Do lado social, esta iniciativa prevê o incremento em 3 ou 4 vezes da renda média atual do produtor de leite, contribuindo para sua fixação no campo, e do lado ambiental, entre economias e reduções, promoverá a retirada da atmosfera da poluição equivalente a uma cidade de 22 milhões de habitantes em um prazo de 5 anos. Gazeta Mercantil - Pode detalhar mais essa ação de redução da poluição e preservação ambiental? A conta é simples: estamos substituindo 5 vacas de baixa produtividade (3 litros por dia) por uma vaca de alta produtividade (15 litros por dia). Uma vaca come 1/5 do capim que 5 vacas comem, consome 1/5 de água e emite 1/5 do metano de cinco vacas. Menor consumo de pasto é igual a menor desmatamento. Sabemos também que uma emissão de gás metano equivale a 23 emissões de gás carbono em termos ambientais. Em 5 anos, 300 mil vacas substituirão 1,5 milhão de vacas menos produtivas. Esta redução na quantidade de vacas e conseqüente redução de consumo de água, massa verde e emissões, equivale à retirada da poluição causada por 22 milhões de pessoas, segundo critérios da ONU. (Gazeta Mercantil/Caderno C - Pág. 1)