Título: Brasil leva à Índia experiência de preservação de florestas
Autor: Ramos, Etiene
Fonte: Gazeta Mercantil, 26/06/2008, Nacional, p. A4

Nova Delhi, 26 de Junho de 2008 - A Índia e o Brasil não pretendem manter apenas relações comerciais e diplomáticas. Com climas tropicais, os dois países que junto com a Rússia e a China formam o BRIC, o grupo de futuras potências econômicas mundiais entre 2035 e 2050, procuram a sustentabilidade de suas florestas e um desenvolvimento que não afete o meio ambiente, garantiu o embaixador do Brasil na Índia, Marco Antonio Brandão, ao abrir ontem, em Nova Delhi, o seminário "Florestas do Brasil", promovido pela Fundação Gilberto Freyre e a MRSA Consultoria, ambas com sede em Pernambuco. "Estamos num ponto em que tudo o que se fizer para conhecer e comparar a Índia e o Brasil é muito importante. A Índia tem uma séria política ambiental e precisa conservar ainda mais suas florestas porque já atingiu seu limite de desmatamento", disse Brandão. O diplomata vem preparando o terreno para uma nova visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, prevista para outubro deste ano. Segundo o embaixador, como grande produtor mundial de açúcar a Índia ¿ que já realiza experiências de biocombustíveis a partir do pinhão manso, como o Brasil ¿, poderá também partir para a produção de etanol, o que poderá ser mais uma alternativa energética para o país que já detém a bomba atômica, compra aviões da Embraer e está para receber uma segunda fábrica da brasileira Marcopolo, fornecedora de ônibus para o seu trânsito caótico onde o pequeno Tatanano, da indiana Tata, ainda não circula. Depois da unidade em Lucknow, distante 250 quilômetros de Delhi, a Marcopolo deverá investir na cidade de Karnataka, no sul da Índia (leia mais na página C-3). A apresentação de algumas das experiências públicas do Brasil na área ambiental realizadas na Amazônia, no Cerrado e na Mata Atlântica, durante o seminário, mostrou avanços que poderão ser adotados na Índia que, nos anos 1950, foi apontado pelo sociólogo pernambucano Gilberto Freyre, patrono da fundação que leva o seu nome, como um país de diversas semelhanças culturais e históricas com o Brasil. Elas passam pela cultura da indiana cana-de-açúcar, a heranças dos portugueses que colonizaram Doha. Parcerias Coordenador geral do seminário, o economista Josué Mussalém diz que o projeto, iniciado em 2004 e já apresentado à Comunidade Européia, chega à Índia para fortalecer as possibilidades de parcerias entre os dois países. "A Índia é uma parceira estratégica para o Brasil que já tem experiências e tecnologias ambientais passíveis de aquisição pelos indianos e detém a soberania de um dos seus patrimônios naturais mais cobiçados e promissores ¿ a Amazônia", afirma. Embora o Brasil e a Índia tenham responsabilidades diferentes frente ao Protocolo de Kioto, os dois países, segundo o embaixador, afinam suas relações visando a defesa dos seus recursos ambientais a partir de problemas semelhantes como os incêndios que, no caso indiano, têm fundamentos religiosos no uso do fogo até para cremar os mortos de castas mais altas. O programa de combate às queimadas e conseqüentes incêndios florestais do governo de Minas Gerais apresentado no seminário pelo diretor geral do Instituto Estadual de Florestas (IEF), Humberto Candeias, pode ser uma alternativa. Segundo Candeias, o estado montou uma força-tarefa de combate a incêndios que conta com helicópteros e mais de dois mil profissionais capacitados, além de uma população estimulada a fazer denúncias sobre queimadas e incêndios. "Eles provocam desertificação, aquecimento global e são os maiores emissores de gases de efeito estufa no Brasil", disse o diretor. O trabalho vem contribuindo para a diminuição do desmatamento em Minas que, entre 2003 e 2005, chegou a ter 152 mil hectares desmatados. Em 2007, o desmatamento foi reduzido a 109 mil hectares. Menos desmatamento Representante do governo do Amazonas, Felipe Wardolff afirmou que o estado está respondendo às críticas internacionais de que não cuida da Amazônia, o bioma brasileiro com maior visibilidade internacional com a missão de ser referência nacional e internacional na formulação de políticas ambientais e de desenvolvimento sustentável. "O Amazonas é o primeiro no mundo a ter uma lei relacionada às mudanças climáticas e um fundo iniciado com um aporte de R$ 20 milhões em recursos estaduais e outros R$ 20 milhões do Brasdesco. Gerente de Florestas da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Sustentável, ele garantiu que 98% da floresta amazônica estão conservados. São 38 unidades de conservação federais e 34 estaduais que abrangem 38,3 milhões de hectares. Apesar de conviver com problemas como a grilagem de terras e a chamada "erosão cultural" que corrói os conhecimentos tradicionais dos povos da Amazônia, o estado vem implantando ações que também reduziram seu desmatamento que atinge uma media de 15 mil quilômetros quadrados por ano. Entre eles está o apoio a cadeias produtivas da floresta como a histórica borracha, ou a da carne de jacaré e do piracuru. Para incentivar a extração da borracha e com isso a manutenção da floresta em pé, o governo estadual paga aos seringueiros cadastrados em associações uma subvenção de R$ 0,80 por quilo de borracha extraída, a fim de minimizar o desinteresse pela atividade devido ao baixo preço atual da borracha, em torno de R$ 2,50 o quilo, e ao intenso trabalho de extração. Todos os produtos extrativistas não-madeireiros recebem isenção do ICMS no Amazonas e os moradores de unidades de conservação recebem um auxílio estadual chamado de Bolsa Floresta ¿ R$ 50,00 por mês para as famílias associadas. Para o presidente do Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, Clayton Lino, o combate à pobreza é também uma forma de preservação ambiental. "Miséria não combina com conservação. Precisamos pensar em programas e projetos que consideram as questões ambientais e socioeconômicas. Para o equilíbrio, tem que haver as duas visões", afirmou Lino. Ele citou o Mercado Mata Atlântica, que agrega valor ambiental aos produtos dos moradores das áreas protegidas. (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 4)(- A jornalista viajou a convite da Fundação Gilberto Freyre)