Título: Comissão manterá aborto como crime
Autor: Falcão, Márcio
Fonte: Gazeta Mercantil, 08/07/2008, Politica, p. A8

Deputados da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ) devem sepultar amanhã a tentativa de entidades da sociedade civil organizada de descriminalizar o aborto. Hoje, os parlamentares começam a discutir o parecer do presidente da CCJ, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que pede o arquivamento do projeto de lei 1135, que tramita na Casa desde 1991. A justificativa de Cunha é que o aborto fere o princípio constitucional do direito à vida e à dignidade da pessoa humana. O projeto pede a supressão do artigo 124 do Código Penal que define como crime aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento e propõe que a rede hospitalar pública fique obrigada a realizar o aborto em mulheres com até 90 dias de gestação. Atualmente, o aborto pode ser realizado legalmente em duas situações: estupro e risco de vida para a mãe. Segundo levantamento informal feito por lideranças partidárias, a pedido de deputados da bancada religiosa, a maioria dos integrantes da CCJ indica que é contra a legalidade do aborto. As bancadas devem liberar o voto. Para o presidente da comissão, esta questão é de convicção pessoal dos parlamentares. "Não é uma votação entre governo e oposição", afirma Cunha. O que vai decidir como fica esta situação é a maneira como cada parlamentar encara a vida. Cunha lança mão de argumentos religiosos e constitucionais para manter o aborto criminalizado. No entendimento do relator, a proposta é inconstitucional porque fere a Carta Magna e tratados internacionais de direitos humanos, como o Pacto de São José da Costa Rica, ao tratar o aborto apenas como direito da mulher. Cunha defende que os movimentos sociais batalhem por políticas públicas que poderiam atacar as causas dos abortos, como a educação sexual e os programas de prevenção à gravidez precoce. "Esta é uma visão equivocada", argumenta Cunha. O aborto não é um direito subjetivo da mulher. O feto tem o direito de não ser morto. A relatoria da descriminalização nas mãos de Cunha causou polêmica. O motivo é que o peemedebista é autor de um projeto que torna o aborto crime hediondo (o PL 7443/06). Para alguns deputados que se posicionam contra a criminalização do aborto, houve uma manobra regimental porque Cunha como presidente é ele quem escolhe o relator. Mas regimentalmente não há impedimento. Os deputados que compraram a briga dos movimentos sociais ainda são discretos ao tratar do tema, mas recorrem às estatísticas para pedir a descriminalização. De acordo com dados do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), ocorrem a cada dia são 2.740 abortos no Brasil, em situação legal ou não. Segundo o dossiê Aborto Inseguro, elaborado pela Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos, cerca de 250 mil internações para tratamento das complicações de aborto ocorrem por ano no Brasil. O deputado Dr. Pinotti (DEM-SP) diz que é preciso discutir se a mulher que faz aborto é criminosa. "Mulheres que abortam não o fazem por prazer. Elas o fazem por falta de apoio da família. Criminosos são os que não oferecem as condições para as mulheres. Descriminalizar é combater o aborto e todas as experiências mundiais comprovam isso", diz Pinotti.