Título: Trajetória do IPCA indica estouro da meta em 2008
Autor: Lorenzi,Sabrina; Cavalcanti, Simone
Fonte: Gazeta Mercantil, 11/07/2008, Nacional, p. A5

A inflação oficial tende a superar o teto da meta (6,5%) estabelecida pelo governo neste mês, conforme estima o próprio Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Sem sinal de trégua dos alimentos, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) vai refletir ainda a pressão dos preços administrados - entre tarifas de energia elétrica, água, esgoto, passagens de ônibus - e o reajuste do álcool, limitado por enquanto às distribuidoras. Para o IBGE, o IPCA de julho virá acima dos 6,5% na taxa acumulada em 12 meses. O indicador, que baliza a política monetária, já acumula em um ano 6,06%, segundo a última taxa divulgada ontem, de junho. "Além da pressão dos administrados, é bom lembrar que vai sair da série uma taxa pequena, de 0,24% de julho de 2007, e entrar uma provavelmente bem maior", disse Irene Maria Machado, gerente da pesquisa do IBGE. No mês passado, a inflação subiu 0,74%, pouco menos que os 0,79% registrados em maio. Analistas ouvidos por este jornal esperavam uma alta de 0,75% a 0,82%. Apesar do recuo, a gerente da pesquisa do IBGE, Irene Maria Machado, chama atenção para a persistência dos preços dos alimentos, que já pressionam o IPCA por quatro meses consecutivos com força crescente. Para comprar a mesma quantidade de comida, o brasileiro está pagando 8,64% a mais neste semestre. A pressão vem dos produtos essenciais na mesa dos brasileiros, como carne, arroz, feijão, pão, batata. Os alimentos ficaram em média 2,11% mais caros em junho, depois de uma alta de 1,95% em maio. Em abril, a alta foi de 1,29%, após registrar 0,89% em março e 0,60% em fevereiro. "O arroz com feijão ficou bem mais caro de maio para junho. Pagando 9,90% a mais pelo quilo do arroz, que já subiu 38,21% no ano de 2008, o consumidor teve que deixar mais 7,54% no quilo do feijão preto, enquanto o tipo carioca teve seu preço acrescido de 15,55%", assinala a pesquisa do IPCA. O IBGE revela ainda que a alta de alimentos continua generalizada, por toda a cadeia, e também atinge todas as regiões investigadas pelos pesquisadores. Em junho, também pressionaram a inflação o gás encanado (8,76%), gás veicular (8,31%), passagens aéreas (3,70%), artigos de higiene pessoal (1,29%), artigos de limpeza (1,33%) e salário de empregado doméstico (1,04%). Para Irene, a desaceleração dos produtos industriais, verificada pela Fundação Getulio Vargas (FGV) no indicador que acompanha preços no atacado, não deve amenizar o IPCA no curto prazo. Pelo contrário, reajustes marcados para julho devem piorar o cenário. Irene lembrou do aumento de 7% do álcool nas usinas de cana no primeiro dia de julho, que deve pressionar o preço da gasolina e do combustível na bomba. Também citou o aumento previsto para o gás encanado no Rio e a nova tarifa de energia em São Paulo e Curitiba; a taxa de água e esgoto em quatro capitais (Porto Alegre, Belém, Fortaleza, Salvador). Estouro anual Economistas já vêem risco iminente de a inflação de 2008 estourar a meta, de 6,5%. "Há realmente grande risco de descumprimento da meta. Esse é o momento para que o Banco Central mostre sua força e ancore as expectativas", diz o vice-presidente da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financeiras e Investimentos (Acrefi), José Arthur Assunção. Para Pedro Raffy Vartanian, do Núcleo de Negócios Internacionais da Trevisan Consultoria, apesar da discreta desaceleração do IPCA em junho, não se pode afirmar que a inflação está em trajetória de queda, pois em julho, o indicador costuma mostrar aceleração. "Assim, considerando a inflação do primeiro semestre, projeta-se um IPCA de 6,8% para 2008", afirma. Para os economistas da Rosenberg &Associados, o cenário continua muito preocupante, pois o resultado do IPCA é o mais alto para o mês de junho desde 1996. Os analistas se baseiam na expectativa da continuidade da pressão dos alimentos aliada a dos preços administrados, como o reajuste de energia elétrica autorizado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), em vigor no início de julho. A equipe da Austin Rating, que projeta o índice oficial em 7,2% com 60% de probabilidade de ocorrência, leva em conta aumentos de 1% para telefonia e 2,5% para energia elétrica (acumulado no ano) e de 4,5% para os alimentos no restante do ano. Na mesma linha, os economistas da LCA Consultores projetam alta 6,8% para o índice em dezembro. A projeção embute para setembro um aumento próximo a 10%, nas refinarias, nos preços da gasolina e do diesel praticados pela Petrobras. Esse reajuste serviria para diminuir a defasagem entre os preços domésticos e internacionais devido a seguidas altas apuradas no primeiro semestre.. Bomba para o BC Com essas perspectivas negativas, sustentam os economistas, restará ao Banco Central ser mais incisivo na decisão sobre a taxa Selic na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), dias 22 e 23 de julho. Para Assunção, o comitê deveria ser agressivo o suficiente para elevar entre 1 e 1,5 ponto percentual a taxa. "Com isso, o BC poderia arrefecer as expectativas e, automaticamente, a inflação". Para a Austin, não há alternativa para a autoridade monetária, senão o aumento do ritmo de elevação da taxa básica dos atuais 0,50 p.p. para 0,75 p.p.. "O aumento servirá para ancorar as expectativas de inflação para 2009 em 4,5%, pois hoje já estão em 4,91%, segundo a última pesquisa Focus-Bacen". Leia mais na página B1 (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 5)(e Vanessa Stecanella)