Título: Menor inadimplência agrícola da história do BB
Autor: Lucia Kassai
Fonte: Gazeta Mercantil, 16/09/2004, Agribusiness, p. B-12

Expectativa de baixa dos preços das commodities faz instituições financeiras aumentarem garantias nos empréstimos. Em meados de agosto, o secretário de Política Agrícola, Ivan Wedekin, se reuniu em São Paulo com representantes do setor rural e consultores para avaliar qual será o risco de inadimplência para a safra 2004/05, que começa a ser plantada neste mês e para a qual o governo deve liberar R$ 39 bilhões.

A expectativa de redução dos preços agrícolas - notadamente a soja -, e a ameaça de aumento da inadimplência estão preocupando o governo. Nos últimos anos, o Banco do Brasil (BB), principal agente financeiro do crédito rural, conseguiu reduzir a inadimplência da carteira a níveis invejáveis. Em 2002/03, a carteira rural teve a menor inadimplência de sua história, de 0,5%, desempenho que deve se repetir em 2003/04, prevê Clênio Teribele, gerente-executivo de agronegócios do BB. "Para a próxima safra, estamos sendo mais criteriosos na concessão de financiamentos". A soja, que foi negociada a US$ 16 a saca em 2003/04, deve voltar aos patamares históricos de US$ 10.

"A situação de pagamento deve ser difícil, mas não insustentável porque afinal de contas os preços agrícolas ainda devem ser remuneradores", diz Guilherme Leite Dias, professor da Universidade de São Paulo e ex-secretário de Política Agrícola do governo. Ele diz que os maiores riscos são produtores que se endividaram nos últimos anos na aquisição de máquinas, silos e melhorias nas fazendas. "Agricultores que utilizaram o lucro dos últimos anos na própria atividade estão bem. Mas aqueles que gastaram comprando carros ou casas poderão enfrentar problemas", acredita. Produtores que imobilizaram o lucro na compra de terras também são considerados um risco. "Se eles precisarem de dinheiro rápido, não será fácil vender as terras em momentos de preços baixos", diz.

O grau de endividamento e a dificuldade para obter empréstimos no banco deve ter reflexo no uso de tecnologia no campo. "Os mais endividados terão que gastar mais com adubos e fertilizantes para garantir a produtividade e, dessa forma, a renda", diz Dias. "Já aqueles que estão em situação financeira mais estável poderão usar menos tecnologia e minimizar o impacto dos elevados custos de produção desta safra".

Dias ressalta que o grupo de risco é uma minoria, mas também lembra que em 1996, quando a dívida rural foi securitizada, 2,2% dos agricultores tinham 54% da dívida e 75% da inadimplência. "A minoria tem poder porque o crédito rural é muito concentrado", afirma.

Setembro é o mês de maior demanda por crédito rural em razão dos preparativos para o plantio da safra de verão. Para este mês, o BB disponibilizou R$ 5 bilhões para a agricultura, dos quais R$ 4,1 bilhões para o custeio, R$ 396 milhões para investimento e R$ 480 milhões para comercialização da safra. Entre julho e setembro, o banco espera liberar R$ 7,6 bilhões, o que representa um aumento de 14% em relação à safra anterior.

Setor privado

O Bradesco, maior financiador privado da agricultura, está otimista em relação à safra 2004/05. "Nossas projeções mostram que os preços agrícolas não vão cair muito além dos patamares atuais. Ou seja, os preços devem ser remuneradores, o que não deve constituir uma ameaça para a carteira agrícola", diz Décio Tenerello, vice-presidente executivo do banco.

A inadimplência da carteira rural do Bradesco é de 0,35% para operações vencidas há mais de 60 dias. "É o melhor índice de inadimplência entre todas as carteiras de crédito do banco", diz Tenerello.

O banco é dono de uma carteira rural de R$ 5,6 bilhões. Para a safra 2004/05, a meta é aumentar o estoque em 24,7%, para R$ 7 bilhões. Esse aumento é possível graças ao crescimento dos depósitos à vista do banco. As instituições financeiras devem obrigatoriamente destinar 25% de todos seus depósitos à vista para a agricultura, de acordo com o Banco Central (BC).

Alternativas ao crédito

Tenerello elogiou a iniciativa do governo de estimular um mercado de títulos privados que financiem a agricultura. "É uma iniciativa importantíssima. O governo tem todas as condições de criar um mercado forte de forma rápida", afirma o executivo.

O governo pretende lançar Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) e Warrants Agropecuários (WA). Os dois são papéis lastreados em produtos agrícolas como soja ou algodão. Os títulos poderão ser comprados por investidores. "A maior pré-condição para o sucesso desses papéis é a garantia jurídica para proteger os investidores", diz o executivo do Bradesco.