Título: Vulnerabilidade externa gera polêmica
Autor:
Fonte: Gazeta Mercantil, 22/07/2008, Finanças, p. B1

Ao mesmo tempo em que ainda comemora a histórica passagem à condição de credor externo líquido, o Brasil vê disparar outra medida de vulnerabilidade externa, o Passivo Externo Líquido (PEL). Considerada uma medida mais abrangente dos compromissos líquidos do País com o exterior, o PEL cresceu 49,3% no ano passado, chegando em dezembro a US$ 574 bilhões. Como proporção do PIB, o PEL que era de 36% em 2006, saltou para 44% no final do ano passado. Carta divulgada pelo Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), intitulado "A nova vulnerabilidade" alerta para a necessidade de se olhar o PEL e as possíveis implicações de seu crescimento. "O Brasil comemorou, e com razão, a passagem a credor externo líquido, do ponto de vista apenas da dívida externa, mas é preciso olhar também o passivo externo líquido que é uma medida de vulnerabilidade importante", explica Julio Gomes de Almeida, presidente do Iedi. Desde janeiro, as reservas externas brasileiras, hoje superiores a US$ 200 bilhões, superam a dívida externa pública e privada. Já o PEL utiliza, em seu cálculo, todos os compromissos em dólares do País: dívida externa, mais o estoque acumulado de investimentos diretos estrangeiros, deduzidas as reservas cambiais e os depósitos brasileiros no exterior. O passivo externo líquido apurado em 2007, de US$ 574 bilhões, veio de um passivo externo de US$ 937 bilhões - crescimento no ano de 50% - e de um ativo externo de US$ 364 bilhões - avanço de 52% sobre 2006. Os principais itens do PEL foram os valores maiores dos estoques líquidos de investimento de portfólio (71%) e de investimento direto (62,5%). Estudo do Iedi mostra que houve uma mudança na composição do estoque de investimento estrangeiro em portfólio ocorrida nos últimos anos. Em dezembro de 2005, o principal compo-nente eram os títulos de renda fixa de emissão de governo e de empresas brasileiras no exterior. No final de 2007, os investimentos em ações no exterior e no País superavam a dívida em títulos e, somados (US$ 364 bilhões), representavam 71,4% do estoque. "A maior presença de investimentos estrangeiros de portfólio, mais a estabilidade da dívida externa, reduz o problema do descasamento de moeda brasileira, provocado pela existência de passivos denominados em moeda estrangeira", diz Gomes. No entanto, o presidente do Iedi faz um alerta. "A contrapartida é que o aumento do estoque de ações e títulos de renda fixa por parte dos investidores estrangeiros amplia a vulnerabilidade do mercado financeiro doméstico e do mercado de câmbio a uma saída súbita de capitais", diz. Para o presidente do Iedi, em um momento de estresse, o mercado brasileiro pode ser mais volátil. "Estamos acumulando outro tipo de vulnerabilidade, que não é de custo como no passado, mas que leva o Brasil a ser mais volátil em momentos de estresse global." O tema é polêmico. O presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet), Luis Afonso Lima, não vê problema no nível atual de passivo externo líquido. "O crescimento forte é por conta de investimento direto, de médio e longo prazo, que não saem facilmente do País", diz. "Há várias óticas para se olhar o assunto, mas considero pessimista ver apenas do ponto de vista externo, já que 70% dos recursos que entram são em novas plantas." Já economista e ex-presidente da Sobeet, Antonio Corrêa de Lacerda, teme comprometimento no longo prazo. "Não existe consenso, mas eu não gostaria de ver um passivo externo líquido superior a 50% do PIB", diz Lacerda. "O aumento dos juros sobre os compromissos externos e a maior demanda por remessas de lucros e dividendos, por conta da crescente parcela de ativos estrangeiros, pode causar problemas no futuro." Há o risco, segundo Lacerda, de um agravamento das necessidades externas e é preciso gerar formas de compensar isto. "O Brasil precisa exportar mais, garantindo o ingresso de recursos que vão reduzir o déficit em conta-corrente e fazer o País crescer de forma sustentável."(Gazeta Mercantil/Finanças & Mercados - Pág. 1)(Jiane Carvalho)