Título: Brasil vai propor revisão de acordo com o Chile para vinhos
Autor: Arruda, Guilherme
Fonte: Gazeta Mercantil, 25/07/2008, Empresas, p. C1

O governo brasileiro vai iniciar, dentro de dois meses, discussões com o Chile sugerindo revisão para cima no preço dos vinhos finos chilenos no âmbito do acordo comercial bilateral firmado em 2002. Outra medida a ser colocada na pauta é o estabelecimento de cotas anuais para importação do produto chileno, disse ontem em Caxias do Sul (RS) o diretor de Logística e Gestão Empresarial da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Silvio Porto. "Há um bom espaço para revisar algumas cláusulas", afirmou o executivo, após participar de um encontro com representantes da cadeia da uva e do vinho. A negociação será coordenada por outra pasta, o Ministério de Desenvolvimento Indústria e Comércio. Com a Argentina, segundo maior fornecedor de vinho ao Brasil, o diretor da Conab avisou que existe disposição para rever o acordo firmado em 2005 que fixou um piso de US$ 8 por caixa, mas não forneceu detalhes da agenda. Os vinhos finos elaborados com castas especiais e de alto valor agregado, por causa do emprego de tecnologia avançada, representam 15% da produção nacional. A safra deste ano foi de 45 milhões de litros, enquanto que a produção de vinhos de mesa, feitos com uvas comuns, foi de 288 milhões de litros. E aqui há outro problema: o excesso de estoques que as mais de 1,2 mil vinícolas carregam. Cálculos do Movimento em Defesa do Vinho no Brasil (formado por mais de 20 entidades) revelam um estoque de 336 milhões de litros de vinhos de mesa e 93 milhões de finos - o suficiente para abastecer o mercado interno durante três anos. Ontem o diretor da Conab anunciou para o final de agosto a publicação de um edital destinado a compra de 40 milhões de litros (finos e de mesa) que pode representar ingresso de quase R$ 50 milhões no setor. O produto será mantido em estoque e servirá para corrigir a próxima safra com destilado de vinho ao invés de usar açúcar - quando existe uma acidez muito alta da uva utiliza-se açúcar para equilibrar o sabor. A Conab anunciou também a retirada de mais 12 milhões de litros via Prêmio de Escoamento da Produção (PEP). Este volume também fica no estoque do governo e é destinado para as regiões Norte e Centro-Oeste e, o que não for absorvido, será vendido no mercado externo. "As medidas ajudam", disse o presidente do Sindicato dos Trabalhadores, Olir Schiavenin. O setor tem razões para estar assustado: o avanço dos vinhos finos importados está próximo do descontrole. Entre janeiro e junho deste ano, a participação desses produtos no mercado interno atingiu a marca histórica de 74,7%, conforme dados da União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra). A presença brasileira se resume a 25,3% - metade do que foi em 2002. Apenas o Chile responde por 37,2% do total de 19,9 milhões de litros importados. A Argentina contribui com 26,5%. Ou seja, juntos, totalizam 63,7 de tudo o que vem de fora. Ao contrário de países como França e Itália que colocam obstáculos olímpicos para permitir a entrada de vinhos, o Brasil é uma porta aberta. O controle de qualidade é exercido somente após passar pela alfândega. O diretor da Conab tenta acalmar os ânimos: pretende criar uma legislação que obrigue a colocação de um selo em cada garrafa (importado ou não) definindo qualidade. Resta saber se há fiscais para que a determinação seja cumprida. Três anos atrás o presidente da Câmara Setorial da Uva e do Vinho, Hermes Zanetti cobrou fiscalização do governo na venda de coquetéis e sangrias elaboradas com apenas 10% de vinho; a lei obriga ter 60%. Nada foi feito. Estima-se que anualmente 15 milhões de litros deixem de ser utilizados para estes fins. O ex-presidente do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin) Arnaldo Passarin, faz outra conta: "Nos últimos dez anos a comercialização de vinho de mesa cresceu entre 5% e 6% ao ano. Parou de crescer três anos atrás e no ano passado tivemos queda de 28%", disse. "Temos de barrar estes produtos", afirmou referindo-se aos coquetéis e sangrias. Ele recebeu do diretor da Conab a informação de que o assunto será tratado na próxima semana com técnicos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Com relação à carga tributária, o setor pede redução de IPI pela metade. Hoje é de 10%. O setor quer 5%. "Vai sobrar uva nos parreirais é a conclusão", prevê o diretor executivo da Associação Gaúcha dos Viticultores (Agavi), Darci Dani. No entender de Dani, o vinho continua sendo moeda de troca do governo nos acordos com Mercosul. "Pelo que o secretário do MDIC disse, o serviço deles é defender a indústria brasileira e para isso devem prospectar mercado. Se tiver que sacrificar o vinho nacional para vender produtos industrializados fora do Brasil o nosso governo vai fazer."(Gazeta Mercantil/Caderno C - Pág. 1)(